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Desconfiança marca 65 anos de separação entre Índia e Paquistão

14:07 | 14/08/2012
Aproximação entre ex-colônias britânicas é receosa, marcada, de um lado, pela ameaça do terrorismo islâmico, do outro, por sinais de dominação. Negócios bilaterais são chance de entreabrir a porta do entendimento. Em 1947, arruinado financeiramente pela Segunda Guerra Mundial, o Reino Unido viu-se forçado a se retirar do subcontinente índico. O fim da Índia Britânica significou, ao mesmo tempo, a divisão do antigo reino colonial em dois novos Estados independentes, a Índia e a Paquistão (na época, Paquistão Ocidental e Oriental, hoje Bangladesh). Milhões de hindus, muçulmanos e sikhs foram desalojados nesse processo. O número de vítimas fatais da violência de ordem religiosa é estimado em 1 milhão. A fronteira índio-paquistanesa ao noroeste não foi claramente definida, causando conflitos que perduram até hoje em Caxemira, região reivindicada por ambos os países. Essas tensões levaram a guerras em 1947, 1965, 1971 e 1999. Intervenção militar Muitos políticos indianos esperavam poder evitar o desmembramento do Paquistão em 1947, e o desejo do restabelecimento da unidade do subcontinente mantém-se ainda vivo. Os paquistaneses, por sua vez, sentem-se ameaçados pelo ambicioso vizinho, alegando que este se considera a superpotência da região, pretendendo cerceá-los ou mesmo dominá-los. Atualmente, a desconfiança é uma constante nas relações bilaterais: em ambos os países, a maioria da população vê o vizinho como inimigo. Contudo, a história poderia ter sido bem diferente. O fundador e primeiro presidente do Estado paquistanês, Muhammad Ali Jinnah, desejava instituir uma democracia parlamentar. Mas faleceu antes de atingir essa meta, e seus sucessores defendiam um ponto de vista diferente. Logo, os militares exigiram para si o direito de determinar a política externa e de segurança. E após diversos golpes militares, seu regime autoritário já domina o Paquistão há mais tempo do que os governos civis eleitos. Hostilidade na mídia e educação Na década de 1980, as trincheiras se tornaram mais profundas do que nunca. Como consequência da invasão soviética no Afeganistão, o Paquistão transformou-se em zona de mobilização militar para os insurgentes radicais islâmicos financiados pela CIA, entre os quais, Osama bin Laden. Zia ul Haq, ditador militar paquistanês na época, aproveitou a chance para promover a abrangente islamização do país, a qual influencia de forma decisiva a política nacional até hoje. O onipotente serviço secreto militar ISI serviu-se da ocasião para apoiar grupos extremistas muçulmanos, sobretudo o Lashkar e-Taiba, responsável por numerosas ações terroristas em Caxemira e na Índia, entre as quais, o sangrento atentado de 2008 em Mumbai. A mídia de ambas as nações pouco ou nada faz para reduzir a desconfiança mútua. O noticiário a respeito do país oponente é, até hoje, unilateral e marcado por estereótipos hostis. Jornalistas de ambos os lados queixam-se de que a reportagem objetiva é dificultada em nível institucional. Na educação, o quadro é semelhante. Marva Bari, jornalista de Islamabad, relata que os jovens paquistaneses são sistematicamente instruídos a encarar a Índia como o inimigo. "O sistema de ensino paquistanês fomenta o ódio contra a Índia. Os muçulmanos são apresentados como vítimas, enquanto todos os outros são maus. As crianças crescem acreditando que a Índia é o principal inimigo do Paquistão, e que há mais coisas que separa os dois países do que os une." Otimismo através dos negócios Após o atentado em Mumbai, as iniciativas para incentivar um maior contato interpessoal foram adiadas até segunda ordem. No entanto, o indiano Kuldip Nayar, conhecido jornalista e ativista pela paz, permanece otimista. "Vai demorar. Mas os governos não têm alternativa, senão a paz. Não haverá guerra. Hoje, amanhã ou depois, ambos os lados retomarão as negociações. Não haverá nenhum passo dramático, como a queda do Muro de Berlim, mas uma hora teremos melhores relações." Recentemente, a disposição da Índia de permitir investimentos do Paquistão parece ter entreaberto a porta para o entendimento. Moonis Ahmar, professor de Relações Internacionais da Universidade de Karachi, comenta: "O comércio bilateral certamente aprimoraria as relações entre o Paquistão e a Índia, pois os negócios intensificariam os contatos interpessoais". Ao mesmo tempo, ele adverte: "Certos grupos na Índia e no Paquistão são seguramente contra contatos desse tipo. Porém, se as sociedades civis dos dois países apoiarem os negócios e os investimentos que sejam de interesse mútuo, será possível derrotar os que fomentam a guerra". Exigência de reciprocidade Também na Índia essa iniciativa é avaliada de forma positiva. Segundo Savita Pande, professor da Universidade Jawaharlal Nehru, em Nova Déli: "Em si, as coisas parecem estar indo bem, e fazemos avanços no comércio. Pela primeira vez, a Índia permitiu ao Paquistão investir no país. E este prometeu à Índia o status de nação mais favorecida, até o fim do ano". Contudo, o pacifista indiano Nayar alerta contra expectativas exageradas. Seu país quer ter reciprocidade, antes de seguir adiante. "Acho que a Índia deseja que o Paquistão tome medidas contra os terroristas que perpetraram os ataques em Mumbai. Mas Islamabad nada faz, fica só ganhando tempo. E isso não deixa de ter seu efeito [negativo] na Índia." Autoria: Grahame Lucas (av) Revisão: Francis França

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