Sem recursos, ambulatório para pessoas com fissura labiopalatina em Fortaleza está suspenso

A Associação Beija Flor tem mais de 1.200 pacientes cadastrados e realizava cerca de 400 consultas por mês. Serviço busca apoio do poder público e doações para continuar funcionando

Há duas semanas, o atendimento de pacientes com fissuras labiopalatinas e outras malformações congênitas craniofaciais está suspenso na Associação Beija Flor, no bairro Dias Macedo. A suspensão acontece por falta de recursos para manter a estrutura assistencial. Enquanto cirurgias continuam sendo realizadas na rede estadual, o apoio social e o acompanhamento pré e pós-operatório fornecido pelo ambulatório da instituição está parado por tempo indeterminado.

"Quando criamos a associação e abrimos a clínica Funface, a ideia era atender principalmente pacientes adultos, que não têm atendimento na rede pública. Só que, com as portas abertas, começaram a vir muitas crianças, mulheres grávidas que já tinham um diagnóstico do filho. Recebemos todos", explica José Cunha Filho, um dos fundadores da instituição. "Hoje temos um gasto em torno de R$ 60 mil por mês e todos os recursos são vindos de doações."

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Durante a pandemia de Covid-19, as contribuições diminuíram, e a procura aumentou. "O que fazemos era para ser dado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Agora, estamos pedindo que o poder público assuma sua responsabilidade", afirma Cunha se referindo a processos de credenciamento que foram abertos com o Município e com o Estado. Ele reforça que o apoio é fundamental, especialmente porque um hospital está sendo construído com investimento da organização internacional Smile Train e "a demanda deve se tornar ainda maior até o fim do ano".  

De acordo com a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), uma equipe realizou visita técnica à sede da associação Beija-Flor no último dia 29 de março. A visita avaliou a capacidade do atendimento ambulatorial e "um parecer está sendo elaborado para, a partir disso e seguindo todos os trâmites legais, definir o que será pactuado com a entidade". A Secretaria ressalta que "todas as cirurgias em pacientes com fissura labiopalatina atendidas na Associação são realizadas na Rede Estadual".

Conforme a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) de Fortaleza, um procedimento está aberto para conceder apoio à Associação Beija Flor. O processo está tramitando na pasta, mas prazos não foram informados.

Melhora na qualidade de vida  

Alber Costa, vice-presidente da associação, explica que são realizados atendimentos de assistência social e de assistência médica. "Na assistência social tem a parte do coral com as crianças, jovem estagiário, artesanato, distribuição de cestas básicas. Na assistência à saúde temos psicóloga, dentista, ortodontista, otorrinolaringologista, pediatra, fonoaudióloga, fisioterapeuta, entre outros", enumera. Segundo ele, antes da suspensão das atividades, aconteciam mais de 400 consultas mensais. "Agora, infelizmente são 617 adultos e 621 crianças e adolescentes sem acompanhamento."

Antes de ser um dos responsáveis pela Associação Beija Flor, Alber esteve entre os mais de quatro mil pacientes atendidos no local desde 2012. "Conheci a Associação após bater em muitas portas do SUS buscando tratamento", conta o jovem que hoje, aos 27 anos, é estudante de Design Gráfico. Ele nasceu com uma fissura que atingia os dois lados do lábio superior, a região pré-maxilar e palato (céu da boca).

"Como era do Interior, minha mãe nunca teve acesso ao ultrassom. Nasci na minha própria residência, pois na época não tinha energia nem transporte para ir à Cidade", relata. Aos 5 anos, o menino natural de Boa Viagem fez a correção labial por meio da organização médica voluntária Operação Sorriso. "Ainda faltava fazer outras correções faciais e o palato, meus pais me abandonaram, e tudo ficou mais difícil sem ajuda de uma família e sem apoio do SUS. Fiquei morando na casa da minha avó adotiva que era analfabeta e não entendia sobre o meu caso", continua.

O estudante conta ainda que sofreu bullying e discriminação, principalmente no colégio, por conta da face diferente e da voz anasalada. "Somente com 15 anos comecei sozinho a procurar uma saída para melhorar minha qualidade de vida e diminuir as sequelas da falta de tratamento. Ao todo fiz nove cirurgias, seis delas através do apoio da Associação Beija Flor", narra. "É mais do que um centro de reabilitação, é uma grande família de pessoas empáticas e com muita experiência nesse tratamento. Muito importante na minha vida pessoal e profissional", ressalta. "É um lugar onde entramos feios e saímos bonitos."

Outro paciente atendido na instituição é Ruan Martins, de 9 anos, que todas as semanas percorria os cerca de 140 km entre Itapipoca, onde mora, e Fortaleza.  "Há seis anos ele é atendido pela Associação. Lá é nossa segunda casa", afirma a mãe do menino, Sonilda Martins. "A paralisação nos deixou sem chão. Era o único lugar onde nossos filhos tinham todo atendimento necessário."

"É uma caminhada muito, muito difícil. Das dificuldades para atendimento até o bullying que ele sofre e as dificuldades financeiras. A Associação ajuda a gente a acreditar que dias melhores virão", completa.

Como ajudar?

As doações podem ser entregues na avenida Alberto Craveiro, 2222, dentro do Condomínio Espiritual Uirapuru. O local abre de segunda a sexta-feira, das 9 às 16 horas. Apesar das consultas suspensas, a instituição segua aberta para prestar informações às famílias. 

É possível contribuir com dinheiro por transferência via pix, usando como chave o CNPJ 04.875.653/0001-75 ou por meio de contas bancárias:

Banco do Brasil conta: 6274-x | Agência: 2917-3

Bradesco Conta: 12346-3 | Agência: 0621-1

Outras informações: (85) 98685 1317, que também é WhatsApp. 

Atendimento na rede pública

O Hospital Infantil Albert Sabin (Hias), por meio do Núcleo de Atendimento Integrado ao Fissurado (Naif), é a unidade de referência para atendimento multidisciplinar de crianças e adolescentes, de zero a 18 anos, com fissura labiopalatina no Ceará. Para o direcionamento a este ponto da rede de atenção, o paciente é agendado através da Central de Regulação Estadual.

As solicitações acontecem por meio de fila quando o paciente tem sua necessidade cirúrgica indicada após avaliação pelos profissionais de saúde dos municípios.

Ao chegar ao Hias, os pacientes são acolhidos pelo Serviço Social e iniciam o acompanhamento que conta com pediatra, neurologista, geneticista, otorrinolaringologista, enfermeira, nutricionista, psicóloga, fonoaudióloga, cirurgiões-dentistas e cirurgião plástico. O atendimento ocorre de segunda a sexta-feira, das 7 às 11 horas e das 13 às 16 horas. O número do setor é (85) 3101 4214.

 

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