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"O sentimento de impunidade tem levado a população a punir pessoas", diz pesquisador

Em entrevista ao O POVO Online, o sociólogo Geovani Jacó afirma que linchamento é uma medida tomada pela população, "de forma enviesada", para resolver problema da violência urbana
16:25 | Jun. 22, 2016
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Conforme O POVO Online noticiou nesta terça-feira, 21, foram registrados dois linchamentos, um espancamento e uma execução contra suspeitos de praticarem crimes em Fortaleza, apenas nesta segunda-feira, 20.

Os casos de 'justiçamento' ocorreram nos bairros Sapiranga, José Walter e Jacarecanga. Neste último, uma mulher, conhecida por praticar assaltos na região, foi morta por apedrejamento.

A recorrência de linchamentos suscitam a discussão sobre como a população vem enfrentando a violência na Cidade.

Conforme o diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), delegado Jairo Pequeno, o linchamento, quando realizado por meios cruéis, se trata de crime de homicídio qualificado. Logo, é comum  que autores dos linchamentos, não assumam autoria.

"Todos [os linchamentos] são apurados e, a partir do momento que se identifica o autor, dependendo do local, de filmagens, é instaurado inquérito", explica o delegado, que defende que violência não combate a violência. "Se linchamento desse jeito, não precisava de Polícia, Justiça ou Ministério Público, nada. Voltaria o tempo da barbárie", complementa.

Descrença nas instituições

Segundo o pesquisador e coordenador do Laboratório de Estudos da Conflitualidade e da Violência (Covio) da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Geovani Jacó, o uso da violência é uma medida tomada pela população como forma de tentar solucionar urgentemente o problema da violência urbana, encarada como uma "ameaça".
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Para o coordenador do Covio, os linchamentos estão associados principalmente à descrença das pessoas nas instituições. "O sentimento de impunidade, a percepção do descontrole do Estado, do policiamento e da Justiça têm levado a população a buscar punir as pessoas que julgam imediatamente responsáveis, movidas pelo grande apelo moral social", afirma o pesquisador, que diz ser "preocupante" a violência, principalmente por ser "seletiva".

"Em geral, [a violência] atinge diretamente homens, pardos ou de cor, e pobres, que trazem consigo todas as características externas da sujeição criminal, que é quando se atribui ao outro o estigma de criminoso, antecipadamente", ressalta.

Violência ambígua

De acordo com Geovani Jacó, seja como linguagem ou como prática, a violência, que culmina no linchamento moral, físico e em público, é ambígua.
 
"Toda ação dessa ira pacificadora, vingadora é preocupante e carrega uma ambiguidade muito forte. Quando a violência ameaça a integridade física das pessoas 'de bem', bem situadas dentro dos esquemas simbolicamente aceitáveis da sociedade, é extremamente negativa. Ao mesmo tempo, identificadas as pessoas que botam em risco essa moralidade, é permitido que se utilize da violência como punição, como assepsia da sociedade", frisa Geovani, que vê no linchamento uma forma de legitimação da violência.

"O apelo das pessoas na busca de resolução da criminalidade urbana é uma busca enviesada porque não aciona os dispositivos da lei, cria outros códigos. E tem legitimado certas práticas, como a eliminação, a criação de milícias paralelas, que às vezes surgem dentro da própria Polícia, o exterminio de grupos entre gangues", garante o pesquisador que observa para o silêncio das pessoas diantes de casos, como a chacina na Grande Messejana, onde 11 pessoas foram mortas; e as rebeliões ocorridas em presídios da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), com 18 detentos mortos.

 

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