Maracatu, um grito de resistência
André Filipe Dummar escreve sobre a força do maracatu e lamenta a falta de visibilidade da manifestação cultural no Ceará
Eram meados de 2004, e eu era um jovem estudante na pré-adolescência que acabara de receber uma informação de sua professora - “meninos, em nossa Feira de Artes vamos dançar Maracatu”. A reação inicial da sala foi de espanto e, em poucos minutos, começaram bravejos de insatisfação e críticas àquela escolha tão distante da realidade de nossa classe.
Na semana seguinte, recebemos um mestre dessa arte que trouxe algumas pessoas com aqueles grandes tambores de som penetrante. A reação de todos ainda era de desconfiança e até um pouco de desdém. Com o tempo, os meninos começaram a se encantar com o som e a firmeza da zabumba; as meninas, com aquela dança leve e envolvente e fomos entendendo um pouco mais daquela expressão folclórica oriunda da miscigenação das culturas portuguesa, indígena e africana.
No mês seguinte, chegou o tão aguardado momento. Todos vestidos com aquelas grandes e pesadas roupas brilhantes pela primeira vez (e única para muitos). O nervosismo apareceu, afinal, nossa apresentação seria no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, mas estávamos confiantes com aquelas várias semanas de árduo ensaio. Vale um pequeno detalhe: como sempre fui alto decidiram que eu, juntamente a uma amiga de mesma característica, seríamos Rei e Rainha do Maracatu. Meu frio na barriga era dobrado.
A apresentação começou e eu senti algo inexplicável, uma sensação de pertencimento, de representação da minha terra, uma sensação de que eu estava guardando um pouquinho do Ceará dentro de mim. O medo não mais existia, a desconfiança se esvaiu, a força do grito de uma expressão se consolidou.
Ao término, já estava saudoso com aquilo que acabara de acontecer. Acho que todos de alguma maneira estavam. Aquele grupo antes tão incerto estava orgulhoso, com sentimento de dever cumprido, coeso em sua essência. Todos queriam estar próximos, desfrutando daquele espírito de comunidade por mais alguns instantes. O resultado foi um fim de semana divertido, inusitado e, acima de tudo, compartilhador em minha casa. E pensar como tudo isso aconteceu... Como aquele momento marcou.
Anos se passaram, a admiração continua. O que entristece é ler sobre o esquecimento, a falta de apoio, o pouco zelo pelo Maracatu na atualidade. Mas o grito é forte, provocador, inabalável. O movimento resiste pela força de sua gente, por uma representação, por sua nação.
Este grito tem que ecoar para que os olhos de todos possam ver, para que essa expressão cultural seja resgatada e para que possamos dar um viva ala Maculelê.
André Filipe Dummar é analista de planejamento do Grupo de Comunicação O POVO
Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente
Na semana seguinte, recebemos um mestre dessa arte que trouxe algumas pessoas com aqueles grandes tambores de som penetrante. A reação de todos ainda era de desconfiança e até um pouco de desdém. Com o tempo, os meninos começaram a se encantar com o som e a firmeza da zabumba; as meninas, com aquela dança leve e envolvente e fomos entendendo um pouco mais daquela expressão folclórica oriunda da miscigenação das culturas portuguesa, indígena e africana.
No mês seguinte, chegou o tão aguardado momento. Todos vestidos com aquelas grandes e pesadas roupas brilhantes pela primeira vez (e única para muitos). O nervosismo apareceu, afinal, nossa apresentação seria no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, mas estávamos confiantes com aquelas várias semanas de árduo ensaio. Vale um pequeno detalhe: como sempre fui alto decidiram que eu, juntamente a uma amiga de mesma característica, seríamos Rei e Rainha do Maracatu. Meu frio na barriga era dobrado.
A apresentação começou e eu senti algo inexplicável, uma sensação de pertencimento, de representação da minha terra, uma sensação de que eu estava guardando um pouquinho do Ceará dentro de mim. O medo não mais existia, a desconfiança se esvaiu, a força do grito de uma expressão se consolidou.
Ao término, já estava saudoso com aquilo que acabara de acontecer. Acho que todos de alguma maneira estavam. Aquele grupo antes tão incerto estava orgulhoso, com sentimento de dever cumprido, coeso em sua essência. Todos queriam estar próximos, desfrutando daquele espírito de comunidade por mais alguns instantes. O resultado foi um fim de semana divertido, inusitado e, acima de tudo, compartilhador em minha casa. E pensar como tudo isso aconteceu... Como aquele momento marcou.
Anos se passaram, a admiração continua. O que entristece é ler sobre o esquecimento, a falta de apoio, o pouco zelo pelo Maracatu na atualidade. Mas o grito é forte, provocador, inabalável. O movimento resiste pela força de sua gente, por uma representação, por sua nação.
Este grito tem que ecoar para que os olhos de todos possam ver, para que essa expressão cultural seja resgatada e para que possamos dar um viva ala Maculelê.
André Filipe Dummar é analista de planejamento do Grupo de Comunicação O POVO
Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente