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Como compreender o contexto atual e encontrar caminhos para a economia

Em artigo enviado ao O POVO, o economista e presidente da Apimec Nordeste, Célio Fernando, reflete sobre possíveis caminhos para a recuperação da economia em tempos de crise
13:36 | Abr. 17, 2020
Autor O Povo
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Tipo Opinião

A compreensão depende, em primeiro lugar, da definição dos propósitos e, por isto, no título deste pequeno ensaio a reflexão vem antes da ação, o que serve também como severa crítica aos que alegam não haver “tempo” para aprofundar a análise.

O Pragmatismo Oriental ensinou-me a planejar e formular primeiro, tendo o longo prazo como horizonte relevante. Nunca aderi ao pragmatismo Ocidental para o qual a ação é a protagonista e “o hoje, mais tardar amanhã”, enfim, onde a perspectiva é míope.

Assim, entendo que muitos conceitos precisam ser revisitados, se nosso objetivo é definir um curso para a recuperação da economia. As ideias encontrarão coerência e direções para a retomada se forem compreendidas em suas múltiplas dimensões e no horizonte temporal apropriado.

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O Estado mínimo, por exemplo, é definido como uma forma de governança na qual o setor público procura intervir o menos possível na economia e sociedade do país. Todavia, é preciso entender que Estado Forte não é Estado Grande, tampouco é antônimo de mínimo, mas sim um aparato estatal que cumpre o seu papel efetivamente, seja ele na saúde, na educação ou na segurança pública, sendo orientado integralmente pelas necessidades da população.

Em economia, costuma-se definir intervencionismo estatal como a interferência, muitas vezes danosa, do Estado na atividade econômica do país. O Estado mínimo preconiza que a intervenção estatal seja a menor possível, basicamente a de estabelecer regras claras para o jogo econômico e arbitrar disputas. Nesta visão, o mercado deve ser mais livre, deve poder atuar desamarrado das burocracias, excessos regulatórios e de fiscalização para promover mais investimentos, empregos e renda.

Quebra do ciclo da economia

Entretanto, a economia de mercado funciona sob a premissa de estabilidade de demanda, a partir da qual a gerência de estoques é governada pela ótica de minimização de custos. Em momentos de estresse e choques, as demandas tornam-se instáveis, o que quebra o ciclo normal da economia.

Nestes momentos, cabe ao Estado, de forma complementar ao mercado, reequilibrar a dinâmica econômica. Porém, a conta não pode ser paga somente pelo Estado, pois este pertence à população e, logo, a população pagaria pela conta em impostos ou redução dos serviços públicos essenciais. O mercado também deve arcar com a sua parcela de ajuste, a partir dos custos de adaptação incorridos nas crises.

No Timor Leste, por exemplo, o Estado interventor é o Estado mínimo. Uma vez que lá não há racionalidade econômica para investimentos privados, os riscos não são remunerados por retornos apropriados. Neste sentido, o tamanho do Estado depende da maturidade e estágio de desenvolvimento de cada sociedade.

Maior precariedade social implica que o papel básico do Estado tem que ser maior, o que culmina na necessidade de um maior esforço fiscal. Em momentos de crise sanitária, o sistema de saúde necessita de uma governança centralizada que possa implementar, monitorar e avaliar resultados de forma unificada e aqui se tem, novamente, mais um papel para o Estado.

Adaptação do mercado

No que concerne ao mercado, este terá que adaptar-se, reorganizar-se, renovar-se, encontrar mecanismos e instrumentos de ajustes que propiciem em médio e longo prazo sua recuperação. Em momentos assim, será que é possível as pessoas físicas contribuírem com mais impostos?

Acredito que não. Porém, uma maior taxação é uma possibilidade provável. Já se encontra na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado projeto de lei nesse sentido. Governos estaduais deverão também elevar as taxas do ITCD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos).

A queda do PIB (Produto Interno Bruto) entre 4% e 6% conduz o estoque de riquezas para um patamar mais baixo, uma vez que o valor das riquezas depende do fluxo. Nesse arquétipo, doações e programas de renda mínima devem atender diretamente às populações vulneráveis, e a força motriz de uma economia deve ser encontrada na reconstrução das expectativas e confiança dos agentes.

Na economia política, a redefinição de prioridades nas políticas públicas deve ser a principal questão a ser enfrentada. Na política, a capacidade de articulação e liderança definirá o resultado das ações. A crise presente e o futuro precisam ser discutidos ao mesmo tempo. Talvez vingue, após a crise, a definição de Estado necessário, com pilares fortes na saúde, educação e segurança pública, com uma regulação clara, defesa da livre concorrência e fiscalização desburocratizada, muito mais orientativa antes de ser simplesmente punitiva.

Cooperação por meio de parcerias

Estado e mercado devem cooperar mais e parcerias transparentes em investimentos de alto retorno econômico e social podem ser o caminho. O Estado sempre deve servir à população. A população precisa de emprego. As empresas devem encontrar formas de adaptação com um Estado que não crie restrições para esta retomada. Então, o setor privado poderá assim retomar a agenda de investimentos, recuperar a capacidade reduzida com a crise, com maior produtividade e consequentemente mais elevada competitividade.

As oportunidades serão naturalmente encontradas a partir de um melhor ambiente de negócios, fruto inclusive de ajustes estruturais da economia via reformas. Os caminhos são esses na correção das imperfeições do Estado e do mercado e a adaptação com celeridade a uma estrutura econômica mais ágil, mais digital, mais humana e muito mais produtiva.

Célio Fernando

Economista e presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec) no Nordeste

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