Segunda maior potência em startups, Israel agora tenta criar 'gigantes'
Liat não é exceção. Após passar quatro anos com sua famÃlia nos Estados Unidos, ela voltou à terra natal para criar a própria startup. "Eu havia me tornado mãe e, como sempre trabalhei em startups, me sentia sobrecarregada", conta. Em 2013, ela e o marido criaram um aplicativo de calendário chamado de 24Me, um assistente pessoal inteligente. Hoje, com uma equipe de seis pessoas, o app já superou a marca de 1 milhão de usuários no mundo.
A startup já recebeu um valor significativo de investidores - a empresa não revela o valor exato. A segunda rodada de investimentos deve acontecer em breve, quando Liat lançar uma nova versão do aplicativo. Agora, além de "arranjar" tempo para os usuários fazerem o que gostam, o calendário permitirá a contratação de pessoas para cuidar de tarefas, como levar as roupas à lavanderia. "Vamos conectar as pessoas a prestadores de serviço locais", afirma Liat.
Entrar no espaço dos assistentes pessoais é uma briga e tanto para uma pequena startup como a 24Me. Esse terreno vem sendo ocupado por sistemas desenvolvidos pelas principais gigantes do setor de tecnologia: Apple, Facebook, Google e Microsoft têm aplicativos do gênero que se valem da inteligência artificial - e da integração com serviços de terceiros - para funcionar. Liat não se intimida.
"Cada uma dessas empresas desenvolveu assistentes baseados em determinados serviços, como a busca ou aplicativo de mensagens", diz a israelense. "Nós acreditamos que o assistente deve estar no calendário." O caminho da 24Me é longo, mas a ambição é grande, assim como a de muitas outras startups fundadas no paÃs.
Conhecida pelo apelido de "nação das startups", Israel reúne atualmente cerca de 6 mil empresas de tecnologia em estágio inicial, de acordo com estimativas de fontes consultadas pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Sozinho, o número pode ser considerado pequeno, já que é pouco superior ao total de startups em operação no Brasil - são 4,1 mil, de acordo com dados divulgados em janeiro pela Associação Brasileira de Startups (ABStartups). Porém, ele se torna impressionante quando comparado à população israelense, de cerca de 8 milhões de habitantes, número inferior ao da cidade de São Paulo.
"Perdemos apenas para o Vale do SilÃcio", diz o israelense Uri Levine, cofundador do aplicativo de navegação em mapas Waze (ler entrevista abaixo). O serviço, que hoje reúne mais de 50 milhões de usuários no mundo, foi vendido em 2013 para o Google por quase US$ 1 bilhão.
Máquinas
A principal razão para o sucesso do ecossistema de startups de Israel tem a ver com a jornada que os jovens enfrentam muito antes de pensar em empreender. O serviço militar é compulsório - a nação está rodeada por adversários desde que declarou sua independência, em 1948. O Exército pinça as mentes mais brilhantes todos os anos para as unidades estratégicas. A principal delas é chamada de 8200 e cuida da inteligência e cibersegurança. Lá, os escolhidos recebem treinamento altamente especializado e têm acesso a informações estratégicas.
Após o perÃodo obrigatório, nem todos seguem carreira no Exército. "Entre 3 mil e 5 mil técnicos são despejados no mercado todo o ano", explica Fiona Darmon, sócia do fundo de venture capital JVP, baseado na capital Jerusalém. "Essas pessoas saem do Exército com experiência e conhecimento em alta tecnologia. Elas são Â?máquinasÂ?."
Bastam alguns minutos de conversa com empreendedores das mais variadas startups para descobrir que muitos deles começaram a vida militar na 8200. A estimativa é de que mais de mil empresas tenham sido criadas só por ex-integrantes dessa unidade. A lista inclui Levine, do Waze, que passou pela unidade como desenvolvedor.
"Me ajudou a ter habilidades de pesquisa e desenvolvimento muito cedo", conta. Gil Shwed, presidente executivo da Check Point, empresa israelense que inventou o firewall - software de segurança que atua como uma barreira de proteção entre computadores e a internet -, os fundadores da Mirabilis, empresa que deu inÃcio à era dos mensageiros instantâneos como o ICQ, também começaram na 8200.
Na mira de gigantes
A avalanche de recursos humanos qualificados que chega ao mercado não passa despercebida para as grandes empresas de tecnologia. Gigantes como HP, IBM e Microsoft têm centros de pesquisa e desenvolvimento no paÃs. Elas são responsáveis por grande parte dos investimentos em P&D feitos em Israel, que chegam a 4,5% do PIB, segunda maior taxa do mundo segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). "Dois terços do valor investido em P&D em Israel vem de fora", explica Isaac Ben-Israel, diretor do principal centro de pesquisa em cibersegurança do paÃs.
Construir um negócio que atrai a atenção de gigantes globais já é uma grande conquista, mas está deixando de ser a meta principal no paÃs. Mais capitalizadas, por meio de aportes estrangeiros, essas startups têm mais chance de seguir o próprio caminho. Ã? o caso do Moovit, app de rotas de transporte público (ler mais ao lado). A empresa já foi assediada várias vezes por multinacionais de tecnologia. "Desejo que possamos continuar independentes", diz Nir Erez, presidente executivo da Moovit. "Será recompensador se o Moovit mudar o mundo, sem precisar ser parte de uma grande companhia."
Educação
O futuro parece guardar ainda mais êxitos para as startups de Israel, mas há uma preocupação unânime entre empreendedores: a educação. "Graças à extensiva atividade em Israel nas últimas duas décadas, tivemos conquistas extraordinárias", afirmou o presidente do conselho da autoridade de inovação de Israel, Avi Hassom, em um relatório divulgado na semana passada. "Mas parece que estamos alcançando nosso teto de vidro."
Ele se refere à previsão do Ministério da Economia e Indústria israelense de que vai faltar mais de 10 mil engenheiros e programadores em Israel na próxima década. O "apagão" será resultado da queda no número de pessoas que fazem graduação na área de exatas: em 2004, eles representavam 14% do total de formandos, mas o número caiu para 8,4% em 2014. Esse pode ser o principal obstáculo para manter o ritmo de crescimento no setor de alta tecnologia. E pode pôr em risco pela primeira vez o tÃtulo de "nação das startups" se nada relevante for feito. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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