Sem ajuste fiscal, Selic vai a dois dígitos, diz Delfim
Para Delfim, a presidente Dilma Rousseff deveria buscar o déficit nominal zero (ou seja, uma economia suficiente para pagar todas as despesas do governo, incluindo os juros da dÃvida), pois um controle rigoroso das contas públicas é fundamental para restaurar a credibilidade da polÃtica econômica. Essa estratégia, avalia, contribuiria para reduzir os juros futuros e estimularia os investimentos.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Por que o sr. defende uma polÃtica fiscal austera e déficit nominal zero?
Porque só a polÃtica monetária (taxa de juros) é incapaz de controlar essa inflação. Os juros sozinhos impõem um custo social gigantesco, muito maior que o necessário. Mas o governo está mudando. Ele deixou o dólar flutuar um pouco mais, acabou aceitando a ideia de que precisa de uma polÃtica monetária um pouco mais ativa. Falta um complemento fundamental que é uma mudança radical no entendimento da economia brasileira.
Há muitas crÃticas de economistas que acreditam que o governo vai gerar um superávit primário (economia para pagamento dos juros da dÃvida pública) menor que 2% do PIB neste ano.
Tem de esquecer o superávit primário. Temos de ir para o déficit nominal zero. O que interessa é o déficit fiscal.
O que ocorreria se a presidente Dilma Rousseff anunciasse agora que vai buscar o déficit nominal zero?
Se ela disser "eu vou buscar o déficit nominal zero nos próximos três anos", o efeito ocorre hoje, pois ela tem credibilidade. E estamos nas vésperas de recuperar a credibilidade. Está na mão dela fazer isso. O governo precisa fazer com que todos os gastos avancem menos que o PIB, sobretudo despesas correntes. Graças aos enormes truques contábeis, ninguém mais acredita em nada. A tal quadrangulação fiscal realizada no fim do ano foi a gota que derrubou a água do copo.
E isso melhoraria o sentimento dos empresários para investir e rebaixaria os juros futuros?
E criaria também um ambiente favorável para as novas concessões públicas, como estradas, aeroportos, ferrovias. A presidente é uma mulher inteligente, preparada e pragmática. Tudo o que ela fez está correto. A forma de fazer você pode discutir. Ela agiu bem na mudança das regras da poupança, na desoneração de impostos federais da folha de pagamento, no acordo do aumento salarial do serviço público. Só que na execução tem muito atrito. Daqui a dois anos tudo isso estará no lugar certo e vai ajudar o crescimento.
A adoção do déficit nominal zero pode ocorrer no curto prazo?
Sim. O mercado tem a percepção de que a situação fiscal no Brasil é uma esculhambação. Há uma crença no mercado, que não é a minha opinião, de que o governo já não sabe mais qual é o déficit público que está criando. Para o mercado, o governo faz tanto truque, mexe com tanta coisa, que não tem mais credibilidade. � preciso encontrar um caminho claro e transparente que não tenha mais truque.
Essa percepção ruim sobre a polÃtica fiscal colaborou para que a Standard & PoorÂ?s mudasse a perspectiva do Brasil de estável para negativa.
A decisão da Standard & Poor�s reflete esse pensamento do mercado, que é exagerado. O governo mexeu tanto que as pessoas adquiriram uma percepção de que o sistema está caminhando mal. Não adianta insistir que a situação não é essa, pois as pessoas respondem à situação na qual elas acreditam.
Por que o BC aumentou o ritmo da alta de juros pela primeira vez no governo Dilma?
O BC adotou essa postura para cortar a demanda mesmo. Mas vai cortar a demanda privada, quando o que tem de ocorrer é a redução da demanda pública. E, na medida em que isso não acontece, sobe o custo da dÃvida, que eleva o déficit público. A solução para o problema é fiscal. O Tombini vai aumentar os juros para onde eles terão de ir. Só que, se tiver que subir os juros sem o ajuste fiscal, a Selic vai aumentar para dois dÃgitos, seguramente. Se deixar tudo na mão do BC, e se ele for cumprir o seu papel, isso vai gerar uma recessão muito mais profunda do que em qualquer outra condição.
Nesse contexto, o crescimento do PaÃs de 2,5% neste ano estará de bom tamanho?
Eu acho que deve ser por aà mesmo. Mas o ano não está acabado.
O BC disse na ata da última reunião do Copom que o caminho do dólar é de fortalecimento. O sr. Concorda?
Ã? de fortalecimento mesmo, o que tem consequências, como a queda do preço das matérias-primas. E sobem os juros nos EUA. Ou seja, a direção do investimento estrangeiro vai mudar. Os EUA são um elefante na sala. Ele mexe o rabo e quebra quatro ou cinco peças de louça, e nós somos uma louça que está lá na sala. Hoje é o momento próprio para fazer essa inversão: dar para o setor externo aquela convicção que existia há três anos de que o Brasil é um paÃs no qual as oportunidades de investimentos são as mais seguras. ) As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.