Caso Evaldo: militares são condenados por assassinatos de músico e catador

Crime aconteceu em abril de 2019 no Rio de Janeiro, quando guarnição do Exército disparou mais de 250 tiros contra carro de família; penas variam entre 28 e 31 anos e condenados recorrerão em liberdade

Oito militares do Exército foram condenados, na madrugada desta quinta-feira, 14, pelas mortes do músico Evaldo do Santos Rosa e do catador de recicláveis Luciano Macedo, em abril de 2019, no Rio de Janeiro. O julgamento, na Justiça Militar, durou mais de 15 horas, e terminou com decisão por três votos a dois pela condenação.

O caso foi analisado por um grupo formado por quatro juízes militares e presidido por uma juíza federal, civil. O tenente responsável pela operação foi condenado a 31 anos, enquanto os demais militares receberam 28 anos de pena. O julgamento havia sido marcado inicialmente para agosto de 2019, mas foi adiado quatro vezes.

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O posicionamento da defesa foi marcado por argumentos contraditórios, além de contrariar depoimentos de sobreviventes e testemunhas. Na sustentação, chegou a ser argumentado que Macedo, que foi prestar socorro a Evaldo e à família, teria sido responsável pela morte do músico. O advogado também afirmou, durante as quatro horas de sua manifestação, que Evaldo teria morrido em dois momentos distintos.

Caso Evaldo: ordem dos acontecimentos

Durante o julgamento, depoimentos de testemunhas, sobreviventes e dos próprios militares geraram uma compreensão do que levou às duas mortes. Apesar do grande número de disparos feito pelos militares, mais de 250 tiros, o episódio aconteceu durante uma ação de rotina.

Na tarde de 7 de abril de 2019, dia do crime, a composição fazia um patrulhamento na região de Guadalupe, zona oeste do Rio de Janeiro. Eles flagraram um grupo roubando um veículo. Os militares dispararam tiros de fuzil contra os criminosos, que fugiram em dois carros: o roubado e outro, do qual já estavam de posse antes da ação, um Ford Ka branco.

Cerca de 250 metros à frente, Evaldo, a esposa, o filho de sete anos, o sogro e uma amiga da família, dirigiam outro Ford Ka branco. Eles estavam indo para um chá de bebê. Dois dos disparos dos militares atingiram o veículo, com um dos tiros ferindo Evaldo.

O sogro do músico, que também havia sido baleado, chegou a dirigir, sentado no banco do carona, por alguns metros, mas em seguida parou. A esposa e o filho de Evaldo, além da amiga da família, desceram do carro e gritaram por socorro. Luciano, que estava próximo ao local, foi atender ao pedido de ajuda.

Neste momento, os militares, que haviam perdido de vista os assaltantes, viram o carro de Evaldo parado e com as portas abertas. Sem conferir se era o mesmo veículo, eles voltaram a abrir fogo. Neste segundo momento, teriam sido pelo menos 82 disparos, dos quais 62 atingiram o carro - oito destes em Evaldo. Luciano correu dos tiros, mas foi atingido no braço e nas costas, e morreu 11 dias depois.

Defesa dos militares apresentou argumentos contraditórios

Paulo Henrique Pinto Mello, advogado dos militares, tentou quatro versões diferentes para o episódio. Nenhum dos argumentos da defesa foi embasado por provas.

Na primeira versão, ele tentou pontuar que Evaldo teria morrido já no primeiro tiro, quando os militares estavam disparando contra os carros em fuga. A versão foi derrubada pelo depoimento das testemunhas, que afirmaram que o músico estava vivo até ser alvejado pela segunda vez.

Ele afirmou, em outro momento, que não era possível determinar a origem dos tiros que matou Evaldo, que Luciano seria "olheiro" do tráfico na região, e responsável pela morte do músico. Em seguida, afirmou que "traficantes da região" teriam assassinado Evaldo, e que a guarnição atirou em resposta a criminosos.

A perícia do corpo de Evaldo e do local do crime também derrubou as duas teses, pois não foram disparados tiros próximos ao carro, tampouco foram encontradas a suposta arma que Luciano estaria carregando, estojos de bala usados ou indícios de disparos contra a viatura dos militares.

Mello chegou a argumentar, por fim, que os militares agiram em "legítima defesa putativa", caso em que reage-se a um perigo imaginado, e acredita-se estar agindo adequadamente, para a segunda leva de disparos. Neste momento, porém, a esposa e o filho de Evaldo, além da amiga da família, estavam fora do carro pedindo ajuda, e não havia perigo que justificasse os disparos.

Decisão e condenados no caso Evaldo

Inicialmente, o Ministério Público Militar havia indiciado os 12 membros da guarnição por homicídio qualificado (Evaldo e Luciano), tentativa de homicídio (contra o sogro de Evaldo) e omissão de socorro. A denúncia de omissão de socorro foi retirada, e quatro dos militares, que não efetuaram disparos, também foram excluídos da acusação final.

A defesa dos militares irá recorrer da decisão ao Superior Tribunal Militar (STM). Os acusados respondem em liberdade e seguem trabalhando - chegaram a ser presos preventivamente em abril de 2019, mas foram soltos no mês seguinte. Eles só serão detidos após o esgotamento dos recursos à Justiça Militar. Veja abaixo a lista de acusados e penas.

  1. Tenente Ítalo da Silva Nunes: 31 anos de prisão -  oficial responsável pelo destacamento; primeiro a atirar, sem confirmar se havia ameaça aos militares; e efetuou maior número de disparos;
  2. Sargento Fábio Henrique Souza Braz da Silva: 28 anos;
  3. Cabo Leonardo Oliveira de Souza: 28 anos;
  4. Soldado Gabriel Christian Honorato: 28 anos;
  5. Soldado Matheus Sant’Anna: 28 anos;
  6. Soldado Marlon Conceição da Silva: 28 anos;
  7. Soldado João Lucas da Costa Gonçalo: 28 anos;
  8. Soldado Gabriel da Silva de Barros Lins: 28 anos.

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