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Morre jornalista Fernando Pedreira, ex-diretor do Estado de S. Paulo

Trabalhou no jornal Diário de São Paulo e Última Hora antes de ir para O Estado de S. Paulo
07:03 | Abr. 23, 2020
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Ex-diretor de Redação do Estado, o jornalista Fernando Pedreira, de 94 anos, morreu na última terça-feira, 21, por volta das 17h30, enquanto dormia em sua casa no Vale das Videiras, distrito de Petrópolis, na região serrana do Rio, vítima de falência múltipla dos órgãos. Pedreira deixa a viúva, Monique, com quem era casado havia 48 anos. O casal, que não teve filhos, havia se transferido temporariamente da capital fluminense em março, para fugir da epidemia de Covid-19. Ele será cremado em cerimônia marcada para esta quarta, 22, no Rio.
"Fernando estava debilitado, já não escrevia havia tempos, mas permanecia muito consciente", disse Monique. Questionada sobre a avaliação que ele fazia do Brasil atual, ela não hesitou: "Ele ficava irritadiço ao falar da situação geral (do País), tinha um misto de mau humor e pena".
Nascido no Rio em março de 1926, Pedreira ingressou na Faculdade Nacional de Direito (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro), mas não chegou a se dedicar à carreira jurídica. Integrou o Partido Comunista, com o qual rompeu em 1956, quando a Revolução Húngara foi esmagada pelas tropas da União Soviética.
Foi companheiro de militância política de Roberto Gusmão na União Nacional dos Estudantes (UNE), entre as décadas de 1940 e 1950. Foi por essa época, quando tinha 30 anos, que Pedreira se mudou do Rio para São Paulo e iniciou carreira jornalística no jornal Diário de São Paulo. Depois, transferiu-se para o Última Hora e, enfim, para O Estado de S. Paulo.
No Estado, Pedreira foi o primeiro chefe da sucursal de Brasília, a partir de 1960. Trabalhava na capital federal quando ocorreu o golpe militar de 1964. Em 1965 trabalhou como visiting scholar na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.

Diretor

 

Depois da temporada no exterior, voltou a São Paulo e ao Estado, onde, de 1971 a 1977, exerceu o cargo de diretor de Redação.
Na época, a mais fechada da ditadura, o jornal teve censores na redação. Foi nesse período, a partir de 1º de agosto de 1976, que o jornal publicou a série de reportagens "Assim vivem os nossos superfuncionários", que mobilizou 40 repórteres e marcou o fim da censura prévia na imprensa, vigente desde 1968. Em plena ditadura, as três reportagens da série mostraram a farra de gastos de dinheiro público promovida por funcionários do governo federal, popularizaram a palavra "mordomia" e renderam o Prêmio Esso (o principal prêmio jornalístico da época) à equipe do Estado. Em 1974, ele foi lembrado no prêmio Maria Moors Cabot, da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia.
"Ele se preocupava com os jornalistas presos pela ditadura, acionava advogados e dava apoio às famílias", lembrou o jornalista Roberto Godoy, que classificou o antigo colega de redação como um homem "elegante e fino", dono de um senso de humor peculiar.

Volta

Em 1977, Pedreira decidiu voltar para o Rio. "Ele queria voltar à cidade onde havia nascido e, por isso, pediu demissão do cargo (de diretor de Redação), mas continuou escrevendo para o jornal", relatou Monique. Tornou-se, então, articulista político do Estado. Já na capital fluminense, exerceu a mesma função no Jornal do Brasil.
O jornalista José Maria Mayrink se lembrou de como Pedreira trocou de vez São Paulo pelo Rio. Nos anos 1970, Pedreira vinha do Rio toda segunda-feira, ficava em São Paulo até sexta-feira e, depois, voltava para o Rio. "Num certo dia da semana, talvez uma quinta-feira, parou no meio da redação com os olhos no rio Tietê e perguntou em voz alta: ‘O que eu estou fazendo aqui?’. Pegou as coisas, foi embora para o Rio e nunca mais voltou. Abandonou o cargo", contou Mayrink.
Pedreira foi adido de imprensa da representação do Brasil na ONU em Nova York e da embaixada brasileira em Washington durante o regime militar. Em 1995, a convite do amigo e então presidente Fernando Henrique Cardoso (com quem dividiu a propriedade de um jornal em Jundiaí, no interior de São Paulo, nos anos 1960), assumiu o cargo de embaixador do Brasil junto à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em Paris. Permaneceu na França até o fim da década. Em um artigo publicado no Estado em 2016, o ex-presidente lembrou que Pedreira "fora mais ardoroso militante do que eu".

Memórias

No início dos anos 2000, de volta ao Brasil, Pedreira teve uma passagem pelo jornal O Globo. Nesse período, por sugestão da editora Vivi Nabuco, começou a escrever suas memórias, publicadas em 2016 pela editora Bem-Te-Vi sob o título Entre a Lagoa e o Mar. O livro, de 408 páginas, teve prefácio do ex-presidente FHC.
Segundo Mayrink, o livro fala de "política, infância, Rio antigo, jornalismo, amigos, quase sem parágrafos para se respirar". Também escreveu A Liberdade e a Ostra, 31 de Março - Civis e Militares no Processo da Crise, América, Mito e Violência e Summma Cum Laude, entre outras obras.

 

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