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Fragmentos de muitas histórias
Vida & Arte

Fragmentos de muitas histórias

| AUDIOVISUAL | Com o tema "Serviluz do nosso querer!", evento reflete sobre memória e identidade no bairro
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O Serviluz carrega em si um dos símbolos do Estado, o Farol do Mucuripe, que é estampado na bandeira do Ceará. Tamanha importância simbólica e histórica, por vezes, não se reflete no tratamento destinado ao bairro - seja por parte do governo, da mídia ou da sociedade. Nesse contexto, a movimentação promovida por coletivos da região se revela, diariamente, como essencial para os processos de identidade e memória da localidade. 

 

Como exemplo, o Serviluz receberá amanhã e depois a VII Mostra AudioVisual do Titanzinho, promovida pelo Coletivo AudioVisual do Titanzinho, a Associação de Moradores e o Laboratório Arte e Micropolítica Urbana (LAMUR/UFC).

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"A gente está fazendo (o evento) com vários colaboradores, com música, teatro, exposição fotográfica, poesia", elenca Fabíola Gomes, membro do Coletivo AudioVisual do Titanzinho e pesquisadora. Nesta edição, a mostra acontecerá em dois locais. "Decidimos fazer próximo à Associação e na rua Titan, que vive ameaçada de remoção", afirma. "(Estamos) sempre tentando a valorização, o fortalecimento dessa identidade. Na programação de filmes, procuramos trazer obras que remetam à realidade do lugar: filmes que têm mar, com personalidades do bairro, que foram gravados na região. Trazemos coisas que ajudem a construir a narrativa de que cada lugar daqui é importante. Sem aquela rua, o Serviluz é menos", defende Fabíola, referindo-se à via que receberá o evento.

 

Na programação, será lançada a publicação Encontro em Contratempo, fruto de uma residência artística no bairro articulada por Filipe Acácio e Samuel Tomé. A partir da pesquisa de mestrado em Artes na UFC, Filipe se inquietava em "como permanecer" na Capital, numa reflexão a partir dos espigões. "Eles não ficam nem dentro do mar, nem na terra, mas no entre. Parecia a situação que era estar em Fortaleza", explica. Nesse processo acadêmico, o artista se aproximou de figuras-chave do Serviluz, em especial Priscilla Sousa, membro do coletivo Servilost.

 

Em paralelo, Samuel encaminhava no Porto Iracema das Artes a pesquisa em artes visuais Grande Circular, a partir da linha de ônibus, com a ajuda de Filipe. A junção dos processos e relações culminou no projeto da residência artística, que se realizou entre agosto e outubro de 2017. "Lá já é muito mobilizado, tem uma movimentação cultural forte. A gente entrou mais para somar. Conversando com a Priscilla e outros artistas, havia uma vontade de pensar a circulação de outra forma", avança o artista.

 

A partir das redes de contatos, juntaram-se à proposta os artistas Alice Cadena, Bruno Rib Spoteink, Ceci Shiki, Fabíola Gomes, Felipe González, Jorge Silvestre, Jonas Van Holanda, Pedro Fernandes, Priscilla Sousa, Thales Luz, Simone Barreto, Valéria Leon e Wryel Carlos. "O acesso aos coletivos de juventude no mestrado me abriu para a questão da coletividade. Comecei a entender que conhecimentos já estavam operando no bairro e tive o entendimento de que, para compreender a permanência, é preciso escutar quem já está permanecendo, insistindo na Cidade", considera.

 

Nas páginas da obra, alternam-se fotografias, ilustrações e textos feitos pelos 15 artistas. Entre os que são moradores do Serviluz, alguns cederam fotos de família que registram momentos das histórias pessoais e, ao mesmo tempo, revelam percursos do bairro. Em uma delas, aparece o avô do grafiteiro e artista urbano Wryel Carlos. "Essa parada foi mágica. Vi a minha história, a minha memória, com outra perspectiva. A foto que abre a publicação é do primeiro reggae do Serviluz e nela está o meu avô. Fui muito ligado a ele, sou artista graças a ele, e é muito forte porque ele está lá, vivo, se divertindo no reggae, na memória registrada na foto. Cada fotografia é um fragmento de extrema importância para a memória do Serviluz", ressalta. "Fico muito feliz com o resultado da publicação, o resgate e a criação dessa memória afetiva. Faz ver o quanto é forte e evidente a beleza dos bairros. Tem tanta coisa linda no Serviluz, no Castelo Encantado, no Bom Jardim, no Centro, e é tudo esquecido. Até hoje se sofre violência, discriminação, a mídia marginalizando o bairro", aponta o artista.

 

Fabíola, envolvida tanto na publicação quanto na organização da mostra que acontece amanhã e sábado, reflete sobre a intimidade dos trabalhos. "Muito do meu envolvimento com arte é ligado à vivência no bairro. Sempre morei aqui e tenho essa ligação com a memória", contextualiza. Em Encontro em Contratempo, as páginas de Fabíola trazem fotos e textos que referenciam figuras femininas do Serviluz: "Maricotas, Francisquinhas, Liretes, Dorinas / são tantas as meninas que criaram os filhos fazendo manzuá", escreve. 

 

"Maricota e Dorina são as minhas avós. A Lirete mora nessa rua que a gente vai fazer o lançamento e foi uma pessoa muito importante quando eu comecei a escrever sobre minha vivência aqui", explica Fabíola. "Nosso bairro tem essa coisa de família. Se você pegar outros artistas, vai ver a história local sempre presente, vai ver com muita força a história do Serviluz", relaciona Fabíola.

 

VII Mostra AudioVisual do Titanzinho

Quando: dia 14, a partir de 17 horas, e dia 15, a partir de 17h30min

Onde: no dia 14, na Praça Tiago Dias (av. Leite Barbosa, em frente à Associação de Moradores do Serviluz); no dia 15, na rua Titan, 398

Informações: www.facebook.com/cineclubeserverluz/

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