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Múltiplo e espetacular
Vida & Arte

Múltiplo e espetacular

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Há uma frase atribuída ao ator, dramaturgo e pesquisador Ricardo Guilherme: "o mundo é grande, mas o Ceará é maior". Pois eu me aventuro a dizer que o Cariri é maior ainda. Afinal, como pode uma mesma região ser morada dos Irmãos Aniceto, da escritora Jarid Arraes e da Mestre Margarida Guerreiro? Para além do triângulo formado por Juazeiro do Norte, Crato e Barbalha - cidades que concentram o comércio e as produções industriais - a região é composta por cidades que se tornam gigantes em hospitalidade, em cuidado com as tradições populares, em rotas de fuga.

 

Durante cinco dias, partindo da sexta-feira, 16, até chegar a terça-feira, 20, esses territórios viram todas as suas potencialidades serem lançadas ao infinito com a Mostra Sesc Cariri de Culturas. A região é um espaço tão intenso e múltiplo que não se pode definir em descrições. É o lugar onde as crianças podem invadir as apresentações, mudando passos e dançando suas baladas infantis, sem serem incomodadas. Pois é assim que elas aprendem, desde muito cedo, o valor da cultura popular. É também o espaço onde Mestra Marinez pode ralhar com Daysiane: "Você cante alto nesse microfone que é pro povo do Japão ouvir, porque o povo do Sesc mesmo não tá ouvindo não". E Daysiane tenta direcionar a voz para o outro lado do mundo. É o lugar onde uma artista chora abraçada a uma mulher não identificada, pouco depois uma cansativa apresentação de uma hora, agradecendo por aquela presença.

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Pelos comércios,alguns moradores podem até não saber definir a importância e a multiplicidade da Mostra - que em 2018 reuniu mais de 300 atrações -, mas elas sabem que haverá teatro, que a noite de sexta-feira foi badalada com O Grande Encontro, que um grupo qualquer de Fortaleza estará mais tarde fazendo uma música diferente e que no Centro Cultural Banco do Nordeste há exibição de filmes. As pessoas, material mais importante das cidades, são atravessadas e têm seus cotidianos modificados pelo evento.

 

Mais do que as atrações dos shows noturnos - que lotam as praças principais das cidades - a Mostra Sesc e o Cariri são feitos pelos pequenos públicos que se aglutinam em espaços pulverizados. Foi assim que no domingo, às 10 horas da manhã, no Teatro Sesc Adalberto Vamozi, no Crato, todas as poltronas ficaram lotadas por adultos e crianças para assistir um espetáculo chamado A Caixa. O público - que ri, chora e se espanta - faz questão de abraçar os artistas que atravessaram o país, partindo de Santa Catarina, para comungar aquele momento com aquelas pessoas.

 

A atriz Deborah Finocchiaro, participante da Mostra Sesc Cariri de Culturas pela quinta vez, fez uma observação ao fim de seu espetáculo: "aqui é um dos poucos lugares do mundo onde as pessoas dizem que querem ficar, têm orgulho de estar e não dizem querer ir para outro lugar". Moradores de outras cidades, ela diz, parecem sempre estar querendo ir embora - da violência urbana, do caos, dos preços dos aluguéis, da vizinhança triste. Mas no Cariri todos estão sempre querendo ficar e desejando voltar. Dizem que a terra é mística, que a água é encantada, que as pedras são mágicas. E as pessoas ficam. Seja para participar de uma terreirada com os mestres da cultura ou para abrir a janela e encontrar uma estátua branca - que pode até não estar de braços abertos, mas abençoa um povo (e uma mostra de cultura) com seu chapéu e sua bengala.

 

*A repórter viajou a convite do evento

 

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