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Cantar uma luta
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Cantar uma luta

| V&A VIU | Show-tributo Rainha Quelé - 30 anos sem Clementina de Jesus é homenagem com emoção, ginga e sucessos
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Ginga. Quelé. Rainha. Clementina de Jesus é dona de uma história única e, ao mesmo tempo, universal. Nascida em 1901, teve vida de pobreza, dificuldades, numa casa comandada por uma mulher, sua mãe, Amélia de Jesus. Era ela, também, que ensinava à filha cantos, rezas e crenças advindos da ancestralidade negra da família. Foi na difusão dessa cultura que Clementina marcou seu nome na cultura brasileira: trabalhando como empregada doméstica, foi "descoberta" por Hermínio Bello de Carvalho e teve a voz forte e gutural alçada às gravadoras, palcos e rádios do País. Sua morte completou 30 anos em 2017, e, pela efeméride, foi idealizado o show Rainha Quelé, em tributo à icônica artista. A apresentação chegou a Fortaleza no último domingo, 11, compondo a programação do projeto Sessão Sonora do Cineteatro São Luiz, que reúne cinema e música. Na ocasião, foi exibido o documentário homônimo, dirigido por Werinton Kermes.

 

No palco do show, dividem-se entre as canções as cantoras Karla da Silva, Nega Duda, Paula Lima e Nãnãna da Mangueira. Um ponto importante, basilar, de coesão em Rainha Quelé é a assertiva banda formada por Rodrigo Campos (guitarra, cavaco e direção musical), Maria Beraldo (clarinete e clarone), Maurício Badé (percussão), Gian Correa (violão 7 cordas) e Bruno Marques (bateria). Com os sopros e cordas trazendo a ginga e a percussão chamando o axé, as cantoras têm base forte para interpretar Quelé.

 

O público é recebido, de início, pela banda completa e um jogo de luzes que abrem espaço para Paula, Karla, Nêga e Nãnãna entrarem no palco, de branco como era comum a Clementina, cantando Marinheiro Só. A junção das vozes e personalidades das quatro artistas faz da apresentação uma mistura de sensações, referências e emoções, sendo ela sempre ligada e guiada pela mãe Clementina.

 

Karla abre os segmentos solo dando o tom subjetivo daquele show: o da luta. "É importante falar nos dias de hoje dessa mulher. É uma força para todas as grandes mulheres presentes", dedicou. Paula traz familiaridade ao público, criando conexões e pedindo "ajuda" para cantar. Já Nãnãna conquista pelo jeito - e samba - extrovertido e elétrico. É com Nega Duda, porém, que o espetáculo alcança caráter quase espiritual: a voz rouca e profunda arrepia pela irmandade com a voz de Clementina; para além, sua presença tímida, com discreto charme, evoca mistério e encanto.

 

Abrir o repertório com aquela que talvez seja a música mais conhecida de Clementina não deixa, de maneira alguma, o público parado no decorrer do espetáculo: Na Hora da Sede, Esta Melodia, Cocorocó, Fui Pedir Às Almas Santas, Moro na Roça e Não Vadeia são algumas das canções que mexem com os sentimentos e quadris do público. Assim, Rainha Quelé - 30 anos sem Clementina de Jesus reúne as características essenciais da artista, figura popular, sincrética, ancestral, enfim, testemunha-personagem de uma vida singular como tantas outras.

 

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