Logo O POVO+
Saravá, Chico Buarque
Vida & Arte

Saravá, Chico Buarque

| SHOW | Cantor e compositor carioca Chico Buarque encerrou em Fortaleza sua turnê do trabalho Caravanas, único brasileiro indicado ao Grammy Latino na categoria Álbum do Ano
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
NULL (Foto: )
Foto: NULL
[FOTO1]

Não lembro como comecei a escutar Chico Buarque. Não sei se minha primeira memória é a voz - até muito bem afinada - de minha avó cantando as "coisas de amor" proferidas no refrão de A Banda enquanto cozinhava ou mesmo se é o espanto com os versos "a certidão pra nascer e a concessão pra sorrir/ por me deixar respirar, por me deixar existir/ Deus lhe pague" tocados em uma aula de história sobre a ditadura militar na sexta ou sétima série escolar. Parece-me, cá puxando a lembrança, que Francisco Buarque de Hollanda sempre esteve presente.

 

Foi assim que o cantor e compositor carioca surgiu no palco do Centro de Eventos do Ceará, nas noites de sexta-feira, 21, e sábado, 22, com sua turnê do trabalho Caravanas: sem muitos preâmbulos, grandes anunciações ou costumeiros atrasos em shows. Era como se estivesse sempre ali, atrás das cortinas, voltando a cantar por sentir saudade. Seis anos após a última apresentação na Capital, Chico Buarque e sua banda retornaram a Fortaleza para encerrar a excursão pelo País iniciada em dezembro do ano passado. Além da despedida da turnê, a Cidade também recebeu o primeiro show de Chico após o significativo anúncio de que ele é o único brasileiro indicado ao Grammy Latino na categoria Álbum do Ano. Caravanas, lançado pela gravadora Biscoito Fino em 2017, concorre ao prêmio ao lado obras primorosas como Salvavidas de Hielo, do uruguaio Jorge Drexler.

 

Caravanas é uma turnê bem roteirizada e sem surpresas. Chico segue o script e executa com perfeição seu farto repertório de 30 músicas, oscilando harmonicamente entre as personagens que compõem seus mais de 50 anos de carreira: o romântico em Futuros Amantes e As Vitrines; o socialmente engajado em Partido Alto; o boêmio carioca em Homenagem ao Malandro; o sambista que homenageia Wilson das Neves, seu parceiro falecido ano passado. Mas a certa previsibilidade do show não diminuiu o encanto da diversa plateia que lotou o Centro de Eventos para acompanhar em coro o cantor.

 

Talvez o charme de Chico em palco seja esse show bem pensado, tão aguardado. Enquanto canta, ele abaixa a cabeça em uma intimidade com o violão e, por vezes, solta os dedos das cordas teatralmente. Suas mãos repousam sobre o coração e, sorrindo mansamente para a plateia, marca compassadamente com a perna esquerda o ritmo da música. Em Caravanas, o público estabelece uma contrato não dito com o artista e parece reconhecer os momentos de silêncio, cantando baixinho como se não ousasse falar mais alto que os sussurros de Tua Cantiga.

 

É o Chico Buarque amigo, pai e avô, entretanto, que torna Caravanas um trabalho tão aconchegante. Na elogiada Massarandupió, Chico comentou sobre a parceria musical com seu neto Chico Brown na composição. A narrativa envolve a filha e, logo, a neta Clara também é citada. Foi ela que deu à bela Duetos uma versão mais moderna. A família, acrescentou, estava por perto acompanhando o show e a viagem.

 

Chico é Rio de Janeiro no corpo, na malemolência. Na minha frente, um casal apaixonado se revezava entre danças e beijos, embalados pela voz do cantor e até alheios ao redor. No auge dos seus 74 anos, Chico continua sendo trilha sonora de inúmeros cotidianos. Saravá, chefia!

 

O que você achou desse conteúdo?