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Mergulho cósmico no Orum
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Mergulho cósmico no Orum

| livro | Mestre baiano Bule Bule lança Orixás em Cordel, publicação que debruça o olhar em versos para seis divindades do panteão africano
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Reconhecido por sua trajetória que enaltece o repente, o samba rural da Bahia (de chulas e agalopados) e a literatura de cordel, Bule Bule nasceu Antônio Ribeiro da Conceição, há 70 anos, na cidade de Antônio Cardoso. Um dos mestres da cultura popular da região Nordeste, são de sua autoria mais de 100 títulos no formato de cordel, levando-o a ser agraciado com prêmios como a Ordem do Mérito Cultural do Ministério da Cultura (MinC), em 2008, e, mais recentemente, o Culturas Populares Leandro Gomes de Barros, em 2017. Em discos, possui oito lançados e dois DVDs.

 

Bule Bule, que já discorreu em rimas sobre personalidades da Bahia e do País como a ialorixá Mãe Menininha do Gantois (Adeus a Mãe Menininha - a nossa Ialorixá Maria Escolástica da Conceição Nazareth), Irmã Dulce (Irmã Dulce da Bahia: Santa Mãe de Todos Nós) e Tancredo Neves (Tancredo Neves foi prestar contas no tribunal de Jesus), dentre outras, chega às livrarias agora com Orixás em Cordel (Pinaúma Editora, 2018, 112 pág.). Com ilustrações do cearense Klévisson Viana, a publicação debruça-se sobre a história e os ensinamentos de seis divindades dentre tantas que compõem o panteão africano.

 

"Minha parceria com o Bule Bule é antiga. Já faz muitos anos que a gente trabalha juntos, que eu publico o material dele, sem falar que ele é meu compadre, padrinho do meu filho. Temos vários trabalhos em parceria, inclusive um que foi um sucesso estupendo: A Chegada de Ariano Suassuna no Céu. Nesse Orixás em Cordel, não restam dúvidas de que foi um desafio, sempre é um desafio quando você quer realmente fazer uma coisa boa e substancial. Tenho uma admiração muito grande por ele, enquanto ser humano e artista, e é uma honra participar de um projeto seu sempre, da mesma forma que ele sempre está nos meus", afirmou Klévisson Viana.

 

Para o autor, Orixás em Cordel é uma forma de preencher uma lacuna sobre o tema em meio ao próprio estilo literário adotado. "Vi que grandes mestres da literatura de cordel não se preocuparam em deixar esse legado para nós. Em meio a mil coisas interessantes, acabaram talvez se esquecendo da mitologia de origem africana. 

 

Estou aproveitando a oportunidade que tantos tiveram de preencher e não fizeram. Aí dei a cara à tapa para saber como é esse segredo", explicou Bule Bule. "De certa forma, o livro também combate o preconceito que diz que é coisa de bruxaria, coisa do diabo... Mas é mais por não ter conhecimento do assunto", completou.

 

"Bule Bule em seu mergulho cósmico no Orum ("mundo dos espíritos" em iorubá), descomprometido com os dogmas reguladores que regem todas as religiões; mas, comprometido seriamente em provocar o saudável atrito de ideias que nos conduz à luz, idealizou e concebeu um relato descritivo em cordel sobre o panteão africano trazido para o Brasil pela expressão humana Congo/Angola x Keto/Gêge Nagô oriunda D'África. (...) Bule Bule é daquelas pessoas que chegou aqui na terra sabendo e sem saber que sabia", enfatizou o cantor e compositor Mateus Aleluia no prefácio do livro.

 

A leitura, assim, dá início pela figura do orixá Xangô: "Oraniã era o pai/ De Xangô, nosso guerreiro/ Que foi aclamado rei/ De Oió, grande celeiro/ De tudo quanto era bom,/ Por ter um rei justiceiro". Na sequência, surgem outros cinco: Iemanjá, Ogum, Oxum, Exu e Iansã. "Iansã nasceu para ter/ Beleza e encantamento/ Ter os homens aos seus pés./ Por isso, a cada momento,/ Dominando o coração,/ Tirava o maior proveito./ Não para levar vantagem,/ Mas para se proteger,/ Dar segurança aos seus filhos;/ Como mãe, tinha o dever/ De dar proteção extrema/ Para ninguém padecer", descreve Bule Bule sobre a senhora dos ventos e das tempestades.

 

Poeta, cordelista, professor e pesquisador da literatura de cordel, Marco Haurélio (responsável pelas orelhas do livro) ratifica o ineditismo da obra. "É difícil imaginar outro autor, não familiarizado com a vida nos terreiros, esmiuçando, com profundidade e graça, as lendas e mitos de origem diversa, narrados de forma tão coesa e atraente. (...) Pelas mãos e estro de Bule Bule, entramos em contato com os pontos fulcrais da gesta Iorubá. A figura de Iemanjá, divindade cosmogônica, neste particular, tem grande importância, pois ela é a fonte da qual brotam não apenas as outras divindades, mas também as nuvens e as estrelas", escreveu.

 

Orixás em Cordel integra um projeto, tão atraente quanto, que vai além da leitura do livro. Apoiado por meio da 1ª Chamada do Edital Calendário das Artes 2017, da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb), entidade vinculada à Secretaria de Cultura do Estado (SecultBA), Bule Bule está à frente também de Orixás em Cordel - Contação de Histórias em Terreiros. A iniciativa promove rodas de conversa em alguns terreiros de candomblé de Salvador, Lauro de Freitas e Cachoeira. Já em relação aos projetos musicais... "Esse ano a gente está fechando um ciclo. Temos um projeto para um show que começa a partir de agosto", adiantou o mestre.

 

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