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Livro de Rodrigo Marques questiona "cearensidade" da nossa literatura
Vida & Arte

Livro de Rodrigo Marques questiona "cearensidade" da nossa literatura

| FESTIVAL VIDA&ARTE | Pesquisador lança, durante o evento, livro que questiona a hegemonia da historiografia sobre a cearensidade de nossa literatura
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O professor e pesquisador da Universidade Estadual do Ceará (Uece) Rodrigo Marques escolheu mexer em um vespeiro. A investigação que conduziu para formular sua tese de doutorado tocava uma discussão inédita sobre a construção da história da literatura cearense e sobre o modo como fomos levados a compreender esse conceito. Sua pesquisa foi transformada no ensaio Literatura cearense: outra história, que será lançado no próximo dia 22, como parte da programação do Festival Vida&Arte, no Centro de Eventos do Ceará.


A proposta de Rodrigo é destrinchar os sentidos dessa construção histórica dentro de um contexto político e social, refletindo sobre os conceitos que estabelecem a cearensidade de um autor e de uma obra. Afinal, o que é literatura cearense? “Há muitas questões que pairam sobre esse campo de estudo. Foi uma história inventada no final do século XIX, por Antônio Sales, que criou essa tradição em torno de uma literatura cearense”, explica Rodrigo.


O autor de Aves de arribação publicou em 1897 o artigo Pelo Ceará Intelectual, que contava a história das letras cearenses até o momento de criação da Padaria Espiritual, fundada pelo próprio Antônio Sales. Editado por José Veríssimo para a Revista Brasileira, o texto foi ampliado pelo autor cearense e tornou-se elemento basilar para a historiografia da produção literária do Estado, sendo revisitada ao longo do século seguinte por pesquisadores como Sânzio de Azevedo, em Aspectos da literatura cearense, e Dolor Barreira, em História da literatura cearense.

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A pesquisa de Rodrigo que é agora lançada em livro vem questionar a hegemonia desse discurso. “A literatura cearense ganhou um corpo maior que sua história, se constituindo de uma tradição, com suas inclusões e exclusões. Foi sendo criado em torno de instituições como a Academia Cearense de Letras (ACL), a Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Casa de Juvenal Galeno um grupo de escritores, sobretudo de uma sociabilidade masculina”, explica o autor, apontando uma carência estrutural que deixou de fora mulheres e escritores da periferia.


Sua proposta em Literatura cearense: outra história é elucidar os problemas dessa construção hegemônica e, ao mesmo tempo, lançar luz sobre as esfera da produção literária que vinham sendo sistematicamente ignoradas pela historiografia oficial. “Essa historiografia morreu, como morreu a historiografia brasileira aos moldes românticos de Sílvio Romero (crítico e historiador da literatura brasileira), com base no nacionalismo. Aqui não estamos falando da história de uma nação, mas com a do Estado é a mesma coisa - é só trocar o nacionalismo pela cearensidade”.


O pesquisador ainda questiona a ausência dos poetas populares na constituição desse cânone cearense. “Se a busca é pela cearensidade numa perspectiva romântica, não seria razoável buscá-la no povo? É só lembrar de qual é o poeta cearense mais lido e referenciado”, provoca Rodrigo, referindo-se a Patativa do Assaré e apontando que essa história borrou de seu escopo os pobres - “o poeta popular é o poeta pobre, o excluído”.


Mas o que queremos indicar quando falamos, com um orgulho raro para nosso feitio de desprezo pela memória, de “cearensidade”? “As identidades entram em cheque. O que é ser cearense hoje? A história dos índios está contada nessa história do Ceará? E as mulheres? Quais os cânones femininos da literatura cearense? E as autoras negras? Por sorte, as pesquisas que estão ampliando esse cânone em um nível nacional também estão chegando ao debate local”, pontua Rodrigo.


O surgimento de pesquisas acadêmicas que procuram inverter - ou pelo menos ampliar - esse quadro em diversas universidades do País tem animado Rodrigo. “A tradição literária faz sentido quando se atualiza por esse caminho, e não quando aparece como uma celebração, como se a literatura cearense fosse um totem, algo em que não se pode mexer. As vozes do passado que foram abafadas e injustiçadas ainda querem falar, e enquanto não falarem, a injustiça vai permanecer”, conclui


Lançamento do livro Literatura cearense: outra história no FVA


Quando: dia 22 de junho, às 17h30min

Onde: Centro de Eventos do Ceará (av. Washington Soares, 999)

Quanto: R$20 (inteira) R$10 (meia) - válido para toda a programação do dia no evento (o acesso às atrações está sujeito à lotação dos espaços onde elas se apresentarão)

Ingressos à venda no site: www.festivalvidaearte.com.br e na portaria do Jornal O POVO (Av. Aguanambi, 282 - José Bonifácio)

Programação completa: www.festivalvidaearte.com.br


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