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Em entrevista ao O POVO, João Falcão fala sobre teatro musical
Vida & Arte

Em entrevista ao O POVO, João Falcão fala sobre teatro musical

| JOÃO FALCÃO | Correndo por fora do modelo Broadway, o diretor pernambucano realiza teatro musical tipicamente brasileiro. Após "lançar" Wagner Moura e Lázaro Ramos, diz estar atento a novos nomes
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Em passagem por Fortaleza para ministrar oficina na escola Porto Iracema das Artes, o diretor, dramaturgo e roteirista João Falcão conversou com O POVO sobre o cenário do teatro musical, no qual é destaque, apesar de correr por fora do padrão Broadway. Entre os trabalhos mais recentes do pernambucano estão as montagens Gabriela – um musical, Ópera do Malandro e Gonzagão – a lenda, espetáculos com forte apelo público e sucesso de crítica. João também dirigiu os shows Histórias e Canções, de Bibi Ferreira, e Monomania, da filha Clarice Falcão.


Com atuação ampla nos palcos e nas telas, João é conhecido também por dar protagonismo a artistas não tão conhecidos do grande público. Foi assim com a peça A Máquina (2000), cujo elenco inclui Lázaro Ramos, Wagner Moura e Vladimir Brichta, hoje nomes da linha de frente do audiovisual nacional. A obra cênica, baseada no livro homônimo de Adriana Falcão, foi um fenômeno nacional, tornando-se filme em 2004.

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O POVO – Como a sua dramaturgia nasce a partir das músicas?

João Falcão – Tem dois caminhos: canções que me sugerem cenas ou situações em que fico pensando canções que servissem. A história do Luiz Gonzaga, por exemplo, tem relação com muitas músicas. Com a Gabriela isso foi aprimorado um pouco mais, é uma ficção e a gente resolveu por a disposição (da montagem) muitas das canções do repertório brasileiro, o que trouxe milhares de possibilidades. O difícil foi selecionar entre tantas oportunidades músicas fazendo parte da dramaturgia e não simplesmente ilustrativas.

 

OP – Qual o seu principal desafio ao pensar a encenação de projetos com traço autoral tão marcante?

João - Não me ligo muito na formatação de musical que é encenada na Brodway, que cantam e dançam de uma maneira já definida. Eu dou uma liberdade maior e vou na contramão do que é considerado um musical americano. É claro que entra a dança, a encenação, mas penso nas melhores maneiras de cantar dramaturgicamente, a partir de propostas teatrais. A cada vez que eu faço um espetáculo, que tenha musica ou não, essa encenação vem da própria ideia do texto. Pode ter cenário ou não, não há nenhum compromisso com o que normalmente se espera de um musical americano.

 

OP - No mercado das artes cênicas, os grandes musicais são conhecidos como “primos ricos”. O seu trabalho está fora dessa lógica?

João - Totalmente. Esses musicais que têm grandes verbas são baseados numa questão de mercado. Esse mercado é o objetivo principal e isso já diferencia bastante do que eu faço, porque os que pagam por esses grandes musicais apostam no que já fez sucesso, focam no que já foi testado como a Brodway ou de outros lugares que seguem esse modelo de franquia. Tudo é copiado, comprado do original, até as marcações, o jeito de interpretar, é basicamente uma cópia do que vem de fora. No meu caso, o mercado não é o objetivo, vamos descobrindo uma linguagem a partir de termos artísticos.

 

OP - Isso facilita na hora de apostar em novos nomes, novas histórias...

João - Existe um interesse por experimentar coisas novas. O que já é dado com certo não é tão interessante quanto fazer uma coisa que não se sabe exatamente o que vai dar. É muito mais atraente. Trabalho com atores que acho que são talentosos. Eu arrisco, quando eu acredito, eu vou fundo. Tenho tido sorte nessa busca.

 

OP - Mas esse “correr por fora” dificulta a circulação do seu trabalho Brasil afora?

João - Tenho tido diversas experiências, com algumas eu consigo circular mais, com outras menos. O teatro, principalmente no eixo Rio-São Paulo, virou uma coisa muito de produtores. O artista perdeu muito do protagonismo para a produção. Os produtores conhecem o mercado e têm contato com os diretores de marketing das empresas. O protagonismo agora é de quem tem um contato financeiro. E essas pessoas querem investir no que tem garantia de sucesso. Isso dificulta achar quem patrocine simplesmente pela qualidade artística. É uma empreitada em que a gente já sai com certa desvantagem.

 

OP - O jeito de olhar o Nordeste mudou nas produções artísticas no eixo Sul-Sudeste?

João - O Brasil é muito grande e acho que hoje, com a internet e todas as facilidades de contato, estamos percebendo melhor as diferenças entre as regiões. Acho que essa diferença tem sido valorizada. Claro que podia ser ainda mais, é muito ruim ver coisas pasteurizadas. Atualmente o Nordeste influencia muito mais do que é influenciado. Tem uma evolução muito própria, apesar de ainda haver discriminação com a região. O Nordeste ainda precisa ter um crescimento econômico real para a gente poder estar um pouco mais de igual para igual (com Sul-Sudeste).

 

OP - O que você quer montar que ainda não realizou?

João - Eu nunca sei exatamente o que eu vou montar. Alguma coisa me inspira. Aí eu sempre busco o contato com as pessoas e, por isso, estou gostando desse trabalho de formação como esse (realizado pelo artista no Porto Iracema). Estou descobrindo outras experiências, nunca tinha dado aula, e está sendo bom descobrir grupos de artistas de diferentes partes do Brasil.

 

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