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Canções de descobrimento - Lado A
Vida & Arte

Canções de descobrimento - Lado A

| CARREIRA | De 1974 a 2002, Belchior construiu uma discografia pautada por sucessos, álbuns irregulares e muitas regravações. Os jornalistas Marcos Sampaio e Camila Holanda analisam o que conquistou o grande público e o que ainda pode ser descoberto na obra do compositor
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FOI ELIS REGINA QUEM DEU A SENHA. No disco que lançava em 1972, a gaúcha que tinha hábito de revelar novos compositores decidiu dar crédito a um nordestino de 20 e alguns anos que chegava ao Sudeste com o sonho de ser cantor. “Meu encontro com a Elis foi absolutamente marcado pela generosidade dela”, é o que contaria o tal artista, Belchior, em entrevista posterior. O cearense lembra que estava em São Paulo, na pindaíba, quando a maior cantora do Brasil o convidou pra ir até sua casa apresentar umas músicas. “A senhora então mande o carro ir me buscar na hora do jantar”, respondeu na tentativa de não perder a viagem.

[SAIBAMAIS]
Com um violão emprestado, Belchior apresentou suas canções, entre as quais Elis pescou as que mais se encaixavam na sua procura. Apenas um Rapaz Latino Americano ficou entre as preferidas, mas ela pediu desculpas por não gravá-la já que não queria se dizer “um rapaz”. Desculpas aceitas, ela lançou Mucuripe no disco de 1972. Peça inaugural da parceria de Fagner e Belchior, a canção foi uma das quatro composições do sobralense imortalizadas por Elis.
Na mesma visita à intérprete, Belchior deixou uma fita gravada com o melhor de sua produção até ali. Dessa fita, ela tirou duas pancadas fortes demais para serem esquecidas: Como Nossos Pais e Velha Roupa Colorida, apresentadas no show/disco Falso Brilhante. Tirando Noves Fora, parceria com Fagner lançada à revelia da cantora, o pouco que Elis cantou de Belchior tornou-se clássico e ajudou para que ele se lançasse como intérprete em 1974.
 

Recentemente lançado em CD e LP, o disco Belchior – conhecido como Mote e Glosa – é uma carta de intenções que anuncia algo novo e jovem chegando. Mas só dois anos depois essa novidade foi ouvida, de verdade, no Brasil.  

 

Alucinação, produzido pelo experiente Marco Mazzola, potencializou tudo que aquele compositor cheio de personalidade trouxe do Ceará. Letras pessoais, questionamentos sociais, a voz anasalada de barítono e arranjos à la Bob Dylan que transcendiam o folk rock e a MPB.
 

Como Nossos Pais, Sujeito de sorte, A Palo Seco (com arranjo diferente do disco de estreia) e Fotografia 3x4 estão entre as faixas de um disco que segue como um dos mais influentes da MPB tendo suas faixas sido regravadas à exaustão. Abrindo uma década de grande popularidade para o ex-seminarista, Alucinação é pop e profundo numa medida que foi se perdendo nos discos seguintes. Seu sucessor, Coração Selvagem, de 1977, manteve a qualidade e o sucesso, mesmo pesando mais a mão no formato radiofônico. São sucessos deste a faixa título e Todo Sujo de Batom, também lançada no álbum de 1974 – e regravada em Melodrama (1987).
 

Revisitar a própria obra é algo comum, mas Belchior fez desse hábito uma compensação para uma produção que foi se distanciando dos anseios comerciais. De um lado as ambições sonoras e estéticas, do outro o público e as gravadoras querendo um novo Medo de Avião ou Rapaz Latino americano. As canções inéditas foram diminuindo, apresentadas em discos lançados por pequenos selos que já não chamavam mais tanta atenção. Avolumaram-se, então, discos ao vivo, regravações acústicas, antologias temáticas e um álbum como intérprete. Sem nunca ter perdido a personalidade e as referências que chamaram atenção para sua obra nos anos 1970, Belchior seguiu sua toada e deixou um trabalho complexo que ainda tem muito por ser explorado.  

 

SONS & LETRAS
 

MOTE E GLOSA
 

LP de estreia com as primeiras versões de Todo Sujo de Batom, A Palo Seco e Na Hora do Almoço. A voz crua derrama emoção.
 

ALUCINAÇÃO
 

Ponto alto da discografia de Belchior. Foi apontado como o disco mais importante da música cearense em eleição feita pelo O POVO.
 

TRÊS TONS
 

De 2016, a caixa lançada pela Universal Music reúne os discos Alucinação (1976), Melodrama (1987) e Elogio da Loucura (1988)
 

TUDO OUTRA VEZ
 

Lançado pela Warner, este novo box reúne seis discos, incluindo o conceitual Objeto direto (1980) e o raro Paraíso (1982).
 

ACÚSTICO
 

Uma das muitas releituras. Acompanhado do violão de Gilvan de Oliveira, as inéditas são Aparências e Doce Mistério da Vida.
 

DE PRIMEIRA GRANDEZA
 

Tocante tributo gravado por Amelinha. A música que dá nome ao disco é uma antiga sugestão de Bel para ela.
 

BIOGRAFIA
 

Escrita por Jotabê Medeiros, a obra foi questionada por parentes e amigos de Belchior, mas segue como o relato mais completo sobre sua vida. O advogado Jorge Cabral também um livro sobre Belchior (A história que a biografia não vai contar), relatando os meses que recebeu o compositor em sua casa. Jorge foi um dos fãs que abrigaram Belchior durante os anos
de reclusão 

 

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