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Bailarinas cearenses refletem sobre o envelhecer
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Bailarinas cearenses refletem sobre o envelhecer

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Provocadas pelo tema abordado em Fio a Fio, espetáculo que cumpre temporada neste fim de semana em Fortaleza, convidamos três bailarinas/coreógrafas cearenses para refletir sobre a poética da dança na maturidade e, consequentemente, sua relação com o envelhecer. De acordo com Giselle Rodrigues (intérprete e co-criadora do espetáculo), o título da montagem faz alusão a “laços que unem e laços que se rompem entre casais, vida, morte, fios de cabelos que vão ficando brancos, rastros da memória”.


No solo Anatomia das Coisas Encalhadas (2012), Sílvia Moura, 53, também divide com o espectador seus questionamentos pessoais. “Nesse espetáculo eu falo justamente sobre isso de envelhecer. Entrego ao público cartas que comecei a escrever quando estava envelhecendo. Parece que, depois de um tempo, fica normal (envelhecer). Mas existe a aceitação diante desse corpo que muda. E todo dia muda, todo dia tem uma diferença. Porque não estamos numa cultura que permita envelhecer, não é?”, afirma.


Wilemara Barros, 54, analisa o tema sob um outro viés. “Nunca tive grandes preocupações com envelhecer. Tenho uma vida tranquila, porém intensa, e sempre vivi cercada de pessoas jovens, a começar pelo meu companheiro Fauller, que é 14 anos mais jovem. Isso serve-me como antídoto. Sempre me vi como uma mulher atleta, vigorosa e envelhecer, para uma mulher vaidosa como eu, é sempre um aprendizado”, destaca ela, já em fase de elaboração de um novo espetáculo da Cia. Dita.


Coreógrafa e sapateadora, Valéria Pinheiro retornou aos palcos com 233-A, 720 Kahlos, solo que estreita seus laços com a pintora mexicana Frida Kahlo. “Entre sofrimento e cura de dores - e exatamente por lidar com elas -, nasceu o solo. Temos ambas um corpo mutilado, uma paixão por nossa cultura, nossas obras como um livro aberto de nossas vidas, paixões viscerais”, explicou. “Acho que o envelhecer exige calma, tranquilidade e certeza do que é, do que foi e do que será doravante”, destacou.


“Tenho vivido isso: um corpo com quase 60 e que insiste em dançar. Essa sou eu. Faz alguns anos que venho pensando em como dançar, continuar na cena, pois isso é a minha produção de alegria. Mas de forma ‘desacelerada’. Tenho sentido necessidade de cada vez mais ‘levar’, lidar com o menos. É como se eu agora entendesse que não preciso de muito, mas o necessário”, reforçou Valéria.


Para todas, um consenso: não existe um fim. “Minha dança se torna poética, potente quando eu, mulher, negra, bailarina aos 54 anos assumo meu tempo, coloco minha arte num lugar de investigação política, com generosidade. Acordo todos os dias e digo sim para minha dança. Enquanto houver questões, estarei em cena de corpo e alma”, afirmou Wilemara. Para Valéria, “acho que nunca pararei de dançar. Talvez minha dança tenha apenas mudado de lugar”, resumiu. “Não passa pela minha cabeça porque realmente acho que não vou parar. Vou achar uma forma de dançar até o fim. Eu entendo que vou dançar até morrer. Ou morrer até dançar”, diz Sílvia.

TM

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