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Vitórias e desafios do funk nacional
Vida & Arte

Vitórias e desafios do funk nacional

Com MC Fioti disputando ao lado de Chico Buarque o prêmio APCA de música do ano, o funk tem conseguido novos olhares e reconhecimento da crítica - ao mesmo tempo em que lida com tentativas de criminalização
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Respeitado nacionalmente, o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) indica todo ano os destaques em áreas como música, teatro e televisão. Na última semana, foram anunciados os concorrentes na categoria melhor música de 2017 e, ente os cinco listados, está o compositor Chico Buarque com sua canção As Caravanas, mas também está MC Fioti com o hit Bum Bum Tam Tam (que se aproxima das 500 milhões de visualizações no Youtube e já é o funk mais visto da história do site). A indicação é emblemática de um novo momento do gênero musical, que tem conquistado novos espaços País afora. Dos morros cariocas, o ritmo se expandiu para além dos guetos, ocupa agora o topo dos números no País e vem conquistando produtores internacionais.


“O fato de um funk estar concorrendo a um prêmio como esse é um avanço para o prêmio, não para o funk, porque ele existe e cresce independente do reconhecimento da indústria. Historicamente não houve esse apoio e isso não impediu a consolidação”, aponta Lucas Reginato, autor, ao lado de Júlia Bezerra, do livro Funk - a batida eletrônica dos bailes cariocas que contagiou o Brasil. Para o pesquisador, o batidão vem ultrapassando o status de “som marginalizado” e, assim como o samba, futuramente deve ser respeitado como um “traço importante” da nossa cultura popular. “O Brasil que a periferia vive é o mesmo que o ‘centro’ vive. A cultura é a mesma e, assim como foi com o samba, o ‘centro’ vai acolher genuinamente cedo ou tarde”.


Para MC Tha, que vem da zona leste paulistana e está conquistando o País com músicas como Bonde da Pantera, o gênero possui característica “agregadora” de sonoridades e o futuro do funk promete ser de conquista de novos artistas. “Eu sempre curti música popular brasileira e hoje misturo minha vivência funkeira com outras coisas que curto e que fui adquirindo no caminho. Acredito fielmente que, sendo assim, é outro leque de possibilidades que se abre”, aponta a artista, destaque pelo apuro estético em seus clipes. “Uma das principais missões minhas é abrir portas para o funk se misturar mais ainda e ser aceito como um ritmo brasileiro. Nós merecemos, nós nos reinventamos todo dia”.


Na contramão desse crescimento, chegou até o Senado Federal este ano uma proposta de criminalização do gênero musical com a acusação de que seria “crime de saúde pública”. O projeto de iniciativa popular teve 21.985 assinaturas de apoio (o Congresso permite que ideias de cidadãos possam virar projeto de lei se conseguirem 20 mil assinaturas em quatro meses). “As pessoas precisam julgar menos e entender as diferenças, a diversidade e os movimentos culturais. É preciso respeitar o funk mesmo sem gostar”, apontou a cantora Anitta, em entrevista ao O POVO em setembro último, repercutindo o projeto que acabou sendo rejeitado. De acordo com o relator, o senador Romário Faria (PSB-RJ), não é juridicamente defensável a criminalização do gênero musical tendo em vista o direito à livre manifestação do pensamento, garantido pela Constituição Federal.


A tentativa de criminalização repete a perseguição sofrida por outras manifestações surgidas dentro das comunidades negras, como o próprio samba, a capoeira e o rap. “Muito se cobra do funk um engajamento ou uma consciência política, mas é uma música feita por jovens que dominam a linguagem do beat eletrônico e querem tocar em festas”, contrapõe Reginato. Para ele, porém, o ritmo tem, sim, função social. “Apesar de não ser uma festa política explicitamente, é um ato de resistência, é a música feita pelos rejeitados, pelos brasileiros de verdade”, defende.


Apesar de comemorar a visibilidade, MC Tha alerta para os riscos da mercantilização em larga escala. “Fora das periferias, eu percebo as pessoas achando o funk muito lindo, muito bom, mas ainda tem o ‘longe de mim’. Você vê a galera só sugando. É raro ver os MCs e DJs que produzem diretamente o Funk em grandes festas”, aponta.


Já fora do País, cada vez mais artistas têm abraçado o ritmo. Bum Bum Tam Tam, por exemplo, ganhou uma versão remix com o cantor norte-american Jason Derulo. Até Madonna se rendeu ao ritmo e vem postando nas redes sociais vídeos ouvindo os artistas brasileiros. E se depender das filhas da cantora, que aprendem português ouvindo funk, o futuro do gênero musical será de sucesso em escala global.

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