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Morre Airton Queiroz, incentivador das artes
Vida & Arte

Morre Airton Queiroz, incentivador das artes

Dono de uma das maiores e mais importantes coleções da América Latina, o chanceler Airton Queiroz atuou como um mecenas das artes plásticas
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Nas entrevistas concedidas ao longo de 50 anos de vida pública, o chanceler Airton Queiroz ilustrava seu amor pela arte contando a história de uma decisão tomada ainda na adolescência. Aos 16 anos, ele recusou um carro Karmann-Ghia, pedindo no lugar um quadro do pintor cearense Antônio Bandeira. O pai dele, Edson Queiroz, atendeu ao pedido e, desde aquele momento, o então jovem iniciou coleção que se tornou uma das maiores e mais importantes da América Latina. Presidente da Fundação Edson Queiroz, Airton morreu na madrugada de ontem, 3, aos 70 anos.


“O papel dele não se restringia só a Fortaleza, mas as artes do País no geral. O chanceler foi um incentivador muito importante para a arte brasileira”, aponta Ana Lenice Dias, presidente do Projeto Leonilson e irmã do artista que acaba de ganhar um catálogo raisonné patrocinado pela Universidade de Fortaleza (Unifor). “A presença do chanceler em todo esse projeto (do Leonilson) foi uma dádiva”, afirma, destacando o legado deixado. “Acredito que ele tenha dado todas as condições para que sua equipe consiga manter esse trabalho tão cuidadoso de promover os artistas cearenses”, completa.


Em meio século de colecionismo, o cearense construiu um acervo raro e valioso que engloba praticamente todos os movimentos e escolas, tanto nacionais como internacionais. Em sua coleção privada, com mais de 700 obras, o empresário reuniu quadros impressionistas, como um retrato de Gabrielle feito por Renoir, avaliado em mais de US$ 4 milhões.

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Amigo de Airton há 35 anos, o galerista e curador Max Perlingeiro destaca a relevância da trajetória do chanceler. “Ele conseguiu concentrar num único lugar o que existia de melhor na arte. É uma perda irreparável. Ele está no grupo de homens como Assis Chateaubriand. O Airton era à frente do seu tempo”, diz. Dono da galeria Multiarte, Max celebra o reconhecimento nacional que o trabalho do amigo alcançou. “A coleção dele vem sendo estudada há alguns anos pelos maiores curadores do País e vem sendo mostrada em vários recortes. Atualmente uma parte está na Casa França Brasil, no Rio”, afirma.


“Ele expor a coleção particular foi uma contribuição imensa, porque a arte é vivência, a nossa sociedade precisa viver a arte. Visitando o Espaço Cultural Airton Queiroz, nós podemos conviver com a boa arte. Ele dá à sociedade cearense essa oportunidade e essa lição”, avalia a curadora Dodora Guimarães. “Ele foi admirável, generoso, se tivéssemos mais pessoas como ele, seríamos mais compreendidos na nossa sensibilidade”.


Pesquisadora em artes plásticas, Dodora evidencia ainda a busca de Airton Queiroz de unir arte e educação. “Mais do que da vida cultural e artística, mas educacional também, pelo bom rumo que deu a Unifor, ele compreendeu a importância da educação”. pondera.


O escritor e empresário João Soares Neto faz coro à Dorora e também põe em foco a relação entre o ambiente universitário e as artes plásticas. “Airton Queiroz cuidou da Unifor como se ela fosse uma obra de arte”, elogia. A universidade expõe atualmente duas centenas de obras dessa coleção, que, ao lado do acervo particular do chanceler, chega a 2.300 peças. Entre as 1.600 da fundação estão trabalhos de cobrem toda a história da arte brasileira, da era colonial à contemporânea.


“A coleção de Airton Queiroz demonstra a capacidade de um empresário brasileiro de construir um patrimônio cultural com obras que abrangem cinco séculos”, avança a historiadora da arte Carolina Ruoso, doutora pela Universidade Paris 1 Panthéon-Sorbonne. “E para além da arte brasileira, há uma importante representação das artes europeias e latino americanas”, detalha ela, que é autora de artigo ainda inédito sobre o colecionador.


Outros incentivos

Além de abrir sua coleção particular, Airton se destacou pela generosidade, comprando obras para doar a instituições e museus públicos, especialmente de São Paulo. Todos os anos ele adquiria uma obra na feira SP-Arte para doar a um museu.

 

Para Ubiratan Aguiar, presidente da Academia Cearense de Letras (ACL), o amor pela cultura nutrido por Airton ia além das artes plásticas. “Ele vem de um clã, de uma família, que se confunde com a história do nosso Estado. A educação e a arte foram as grandes paixões de Airton. Ele teve uma vida dedicada à cultura e mesmo quando já estava adoentado fazia questão de continuar dando seu contributo naquela área que é tão essencial nos dias atuais em que o País vive uma crise de cidadania sem precedentes”, engrandece, apontando que o chanceler era um benemérito da ACL.

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