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MIS uma construção coletiva
Vida & Arte

MIS uma construção coletiva

|MUSEU DA IMAGEM E DO SOM| Sob o comando do fotógrafo e professor Silas de Paula, MIS deve reabrir em 2020 com o desafio de dialogar com a Cidade, oferecer formação e se efetivar no cenário cultural
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Silas de Paula assume direção do Museu da Imagem e do Som  (Foto: Evilázio Bezerra)
Foto: Evilázio Bezerra Silas de Paula assume direção do Museu da Imagem e do Som

Do grego mouseion, "morada das musas", o vocábulo museu refere-se às instituições que conservam, investigam, interpretam e expõem conjuntos e coleções de valor histórico e cultural. Para além das paredes repletas de obras - tantas vezes resgatadas do esquecimento e restauradas cuidadosamente -, para que serve um museu? Com o desafio de construir coletivamente o equipamento público e fortalecer relações entre o museu e da Cidade, o fotógrafo, professor e pesquisador Silas de Paula assume agora a direção do Museu da Imagem e do Som (MIS) do Ceará. Fechado desde o início de 2018 para reformas, o MIS tem reabertura prevista para o primeiro semestre de 2020.

Abrigo de um vasto acervo composto por 160 mil peças, em média, o MIS foi criado no ano de 1980 - completando 40 anos em 2020. Apesar do sólido tempo de existência, o histórico prédio, atualmente localizado na Av. Barão de Studart, ainda não se estabeleceu como equipamento cultural em pleno funcionamento. As dificuldades estruturais e também de recuperação das obras, fator apontado pelo antigo gestor Xico Aragão ao Vida&Arte em dezembro de 2018 como "desafio que não foi solucionado", foram responsáveis pelo fechamento das portas do MIS ao longo dos anos. Na gestão do secretário de Cultura Fabiano Piúba, o restauro pretende simbolizar uma nova fase para o centro de preservação e difusão audiovisual.

Com quase metade da obra concluída atualmente, o chamado "Novo MIS" constrói-se como um equipamento em consonância ao Palácio da Abolição, entorno imediato. O projeto, com o custo estimado em R$ 13.371.359,15, é constituído por um prédio de cinco andares - dois deles subterrâneos: a estrutura prevê uma biblioteca audiovisual; um centro de restauro e recuperação; espaços expositivos; estúdios de som e imagem; salas de projeções e uma ampla galeria multiuso. Além disso, a residência tombada que abrigou o antigo MIS deverá ser utilizada como Casa Museu e escritório administrativo. O uso efetivo do equipamento, deseja Silas de Paula, será costurado com a sociedade.

"A chegada do Silas ao MIS traz, primeiro, uma abordagem muito social e coletiva em torno da política cultural. Ele está propondo uma série de encontros para pensar o equipamento, desde o conceito… O MIS não está dado", justifica Fabiano Piúba. "O perfil do Silas como pensador, acadêmico, fotógrafo e ativista cultural confere dinâmica ao museu como um ambiente de criação, formação e produção de conhecimento. Museu não é algo distante, é um grande centro cultural. MIS, ao contrário, é SIM. O Novo MIS é um sim", complementa.

Em entrevista ao O POVO, Silas de Paula partilhou desejos e desafios previstos na gestão do museu audiovisual.

O POVO: Silas, o senhor já foi gestor do Instituto Dragão do Mar e professor da Universidade Federal do Ceará. Quais suas expectativas ao assumir a gestão do Novo MIS?

Silas de Paula: A gestão pública é muito complexa, mas estou muito empolgado porque começar um projeto do zero é muito bom. A gente tem um acervo do passado que é preciso olhar, avaliar e trabalhar, mas é um projeto junto a um grupo gestor que já está cuidando disso. Propor e criar um Museu da Imagem e do Som no Ceará é um trabalho coletivo: todo museu público pertence à comunidade, ele não é do governo. Construir juntos é a questão fundamental do projeto desse modelo de museu. Quando falo em construir juntos, aliás, não é só sobre os artistas; é toda a sociedade, toda a comunidade. O ponto de partida desse museu é o conceito de sympoiesis (da filósofa estadunidense Donna Haraway). Construir com, fazer juntos; essa é a grande questão.

O POVO: Como efetivar essa construção coletiva não apenas durante a reforma do museu, mas também na programação do MIS quando o equipamento voltar a receber público?

Silas: Nós vamos chamar segmentos para pensar o MIS e abrir uma discussão para todo mundo que se interessa na construção de um museu. Quando concluído, o museu em sua forma física, essa coletividade tem que ser continuada. Você não pode mais pensar em um museu sem espaço social: um museu público não pode fugir dessa questão, ele não pode fugir de pensar o entorno dele dentro da cidade e em todos os grupos que fazem esse processo.

O POVO: Atualmente, o acervo do MIS encontra-se em processo de catalogação em uma casa na rua Silva Paulet. Como pensar a preservação?

Silas: Pensar o acervo do MIS é a grande questão. Veja bem, nós não temos uma política de acervo no Estado. A gente já entrou em contato com um especialista em São Paulo, a Patrícia de Filippi, para fazer um levantamento do acervo - o Xico Aragão é o guardião que está cuidando. Tem coisas que nem deveriam estar no Acervo do MIS, tem coisas que estão deterioradas demais, então vamos criar um grupo formado para trabalhar em fundamentalmente construir uma política de Estado. Os acervos do Ceará precisam ser discutidos de uma forma mais consistente e isso vai ser feito.

O POVO: Além da estrutura física, entretanto, é necessário que o cearense se veja nesse museu. Quais dispositivos geram desejo de construir espaços públicos?

Silas: É para isso que a comunidade é fundamental. O museu é um misto de turismo e educação, mas eu não posso pensar os museus só como lazer. Os frequentadores do museus estão esperando também apreensão e aprendizado cognitivo. Eu posso trabalhar no que eu chamo, nessas construções de narrativas, de a arte de encantar. Nós temos é que quem vai ao museu é o pessoal de fora. Trazer a comunidade para dentro do museu é o nosso primeiro desafio. Assim, ela se torna parceira e cúmplice.

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