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Memórias de uma viagem iniciática
Vida & Arte

Memórias de uma viagem iniciática

| autoficção | Em seu romance de estreia, o cearense Antonio Bezerra Carioca apresenta um texto bilíngue sobre as lembranças da infância e adolescência vivida em Fortaleza
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FORTALEZA, CE, BRASIL, 11.03.2019: Entrevista com Antonio Bezerra Carioca, escritor que está lançando o livro
Foto: FABIO LIMA FORTALEZA, CE, BRASIL, 11.03.2019: Entrevista com Antonio Bezerra Carioca, escritor que está lançando o livro "Impressões em viagens". (Fotos: Fábio Lima/O POVO)

O olhar de uma criança sobre suas lembranças em impressões vividas ou imaginadas. É isso que caracteriza todas as "viagens" que o escritor cearense Antonio Carioca carrega na memória acerca de sua infância vivida na Fortaleza anos 1950. Retornando, décadas depois, ao imaginário da "casa de janelas verdes", onde viveu os primeiros anos de sua vida, o escritor mergulha nas memórias, nas sensações e na musicalidade da língua para tecer a trama de seu primeiro romance, a autoficção Impressões em Viagens. O livro, em edição bilíngue, será lançado nesta quinta, 21, na Aliança Francesa de Fortaleza.

A publicação da obra faz parte de um "sonho antigo" de Antonio, que é natural de Fortaleza e há muito tempo radicado na França. "As velas do Mucuripe me trouxeram de volta ao meu lugar de origem por meio desse narrador-menino", recorda. O escritor enxerga a infância como um mundo recriado na narrativa de seu livro, uma vez que a obra é escrita em formato de autoficção, isto é, de uma autobiografia ficcional. "Essa criança nunca fui eu, de fato, e este narrador que assume o meu lugar é capaz de conduzir o leitor através dessas lembranças que partem de uma reestruturação das coisas que vivi na infância", explica.

Em Impressões de Viagens, estreia de Antonio Carioca na literatura, o escritor demonstra sua intimidade com a língua francesa, seu idioma por adoção, para contar a história de uma infância vivida entre mulheres fortes na nostálgica casa das janelas verdes. Sua primeira autoficção, publicada pela casa editorial da Livraria Francesa, a LF Publicações, foi inicialmente escrita em francês. "Existe uma musicalidade muito particular quando se fala francês. Meu desafio foi aproximá-lo da língua portuguesa, que é como outra música, uma outra partitura", compara.

O autor, que tem doutorado em Linguística pela Universidade de Paris IV e lecionou o francês em boa parte de sua carreira, acredita que o livro será um material importante para os alunos brasileiros de língua francesa. "Eles vão poder ter em mãos um exemplo de como o próprio escritor pode reescrever sua própria obra". Assim, ele considera que os leitores poderão ter em mãos um mesmo texto, essencialmente, mas que podem ser compreendidos como duas histórias distintas. "Sem dúvidas é uma nova escrita do livro, afinal são dois textos diferentes, é uma outra língua, outra musicalidade", analisa.

O livro abraça 16 anos da vida do autor - desde a infância, passando pela adolescência até o momento que deixa Fortaleza para estudar na universidade em Recife. "É um tempo reescrito, reinventado. Todos os personagens aparecem com outra identidade a partir do olhar dessa criança", descreve. Ao longo das páginas, o romance traz algumas referências musicais, a exemplo de Panis et Circensis (1968), de Gilberto Gil e Caetano Veloso, e Não existe pecado ao Sul do Equador (1973), de Chico Buarque. "Foi uma criação muito livre, e cada música me fez despertar para a ideia do livro", conta.

"Quando eu cito 'Mas as pessoas na sala de jantar/ São ocupadas em nascer e morrer', de Panis et Circensis, lembro da minha casa de infância e imediatamente todos os outros personagens do livro vem à tona para compor a narrativa", recorda o escritor. Para ele, ouvir a música foi como um "leitmotiv", isto é, um motivo musical condutor para construir sua autoficção. "Foram muitas camadas de sentido que se impuseram a mim e eu me deixei fluir pela música. Tudo foi muito espontâneo", pondera.

Todas essas imagens por vezes inconscientes nasceram como uma realidade onírica na mente de Antônio. Escrito ao longo de quatro anos em que o autor passou na Alemanha, o livro também se relaciona com um momento no qual o escritor deixou a família e a carreira para entrar em contato com uma nova língua e cultura. "Eu sempre buscava um jardim que ficava no apartamento em que vivia e foi lá, ouvindo músicas do cancioneiro do Brasil e revisitando minha infância, inicialmente sem grandes propósitos, que encontrei muita liberdade para fazer surgir um romance sem imposições. Os leitores vão sentir isso", conclui.

O trabalho faz parte de uma trilogia cuja continuidade já começou a ser escrita pelo autor. De acordo com ele, a ideia é que os próximos dois volumes mantenham o mesmo título do primeiro. "Impressões em Viagens porque os textos são um registro dessas viagens em direção ao meu imaginário, feitas nem antes nem depois, mas durante a viagem. Nesse primeiro livro, trago minha viagem iniciática", descreve. Para ilustrar a capa, o escritor escolheu uma reprodução do quadro A casa de um lavrador (plantador de cana de açúcar) no Brasil, quadro de Frans Post que data de 1668. Atualmente, a tela está localizada no Museu do Louvre, em Paris.

O livro será lançado nesta quinta, 21, na Aliança Francesa de Fortaleza, na semana em que se comemora o dia da Francofonia. Na Aliança, Antônio trabalhou e foi estudante na época da graduação. "Fico muito feliz que tenham acolhido a mim e o livro, porque essa instituição é uma vivência e uma lembrança muito importante pra minha vida", conta. Além disso, o escritor escolheu Fortaleza para sediar o primeiro evento de lançamento de sua autoficção. "Me sinto muito honrado e feliz em estar aqui novamente, tenho uma ligação muito forte com minha terra natal", finaliza.

Impressões em viagens - Lançamento

Quando: Quinta, 21, às 18h30

Onde: Aliança Francesa. Rua Catão Mamede, 900, Aldeota, Fortaleza

Informações: 98887 3464

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