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"A África estava a anos-luz"
Vida & Arte

"A África estava a anos-luz"

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Tipo Notícia

Conhecedor da trajetória e leitor de alguns livros de Pierre Verger, Leno Farias chamou a atenção para certos registros captados pelo francês em Orixás, a exemplo da parte dedicada aos ritos de iniciação ao candomblé Nagô-Ketu (foto 1). "Essas palhas são muito significativas! Tem um cântico nosso que diz: 'Quem não passou pela iniciação, não tem direito de ver através do mariô'. Verger viu isso porque passou, mas ele foi muito branco (nesse caso) porque isso não poderia ter sido registrado. Serviu? Serviu porque tem a fotografia, mas não se sabe o que passou-se lá dentro", explicou.

Quanto ao ifá, (foto 2): "Essa é a forma de você falar com um ancestral. O orixá só fala através dos búzios. Ele vem à terra, mas não dá consulta. Não é um caboclo como um ancestral brasileiro, que chega, aperta sua mão e fala com você. Ele fala através do oráculo - e só através dele". Outro registro forte é o que Leno denomina de "bolar de santo" (foto 3). "É quando a força do seu ancestral é tão grande dentro de você, que você não consegue ficar em pé e desfalece. Não perde o sentido, perde as forças". E segue: "O ancestral, ele está dentro de você, só precisa ser canalizado e o condutor, o start é o tambor, a dança, a comida, o louvar... O que hoje chamam de DNA, o africano já chamava de ancestral, sua partícula. A partícula primeira do ser humano, do universo, a bola de fogo que criou o universo. O que eles chamam de Big Bang, a gente chama de iná, iná mojubá. A África estava a anos-luz, só faltava entendimento!"

Estudiosos como Pierre Verger, para Leno, foram importantes para a própria sobrevivência dessas religiões. "Eles nos ajudaram porque isso nos leva a uma perspectiva de povo, de construção cultural, de uma lei feita pelo Lula que diz que nós somos povos de comunidades tradicionais de matriz africana. E aí a gente constitui, a partir disso tudo, um plano de desenvolvimento econômico para os povos de terreiro, projetos de tombamento dessas casas, de espaços físicos que são os nossos territórios ancestrais, etc. O problema não é porque a gente é diferente, mas essa diferença incomoda a partir do momento que a gente deixa de ser um degrau pro cunho comercial de igrejas midiáticas", concluiu.

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