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A vida (quase) como ela é
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João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.

João Gabriel Tréz arte e cultura

A vida (quase) como ela é

|dramas humanos|Dois filmes disponíveis na Netflix se destacam pela abordagem sutil de problemas cotidianos - ainda que de pontos de vista privilegiados

São muitas as características que aproximam os longas Gente de Bem e Mais Uma Chance um do outro: dirigidos e escritos por duas realizadoras do cinema independente, lançados no mesmo ano e obras originais Netflix.

As histórias se entrecruzam, ainda, por tratarem de maneira sutil de questões e problemas bastante humanas, cotidianas e identificáveis - mesmo que seus protagonistas sejam tipos bem sucedidos: respectivamente, um homem do mercado financeiro que largou trabalho e família para buscar a "felicidade" e um casal descolado de artistas.

Tendo estreado entre setembro e outubro do ano passado, os filmes podem se perder em meio ao vultuoso catálogo da plataforma de streaming, eles merecem atenção do espectador.

 

Gente de Bem
Gente de Bem

Gente de Bem

Dirigido e escrito por Nicole Holofcener baseado em romance de Ted Thompson, o filme é protagonizado por Anders, um homem bem sucedido que, em busca de felicidade, abandona o trabalho no mercado financeiro e a esposa. Nesse processo, se aproxima de um adolescente viciado em drogas, filho de um casal de amigos. Assim como os trabalhos anteriores da diretora - entre os quais se destacam Amigas Com Dinheiro (2006) e À Procura do Amor (2013) -, Gente de Bem se constrói em tom de comédia dramática, entregando uma trama agridoce. O título original, "a terra dos hábitos estáveis" (The Land of Steady Habits), dá conta do vazio da repetição que acomete o protagonista - preenchido pela disrupção que representa Charlie, o jovem viciado. Já o nome em português, por sua vez, consegue resumir o teor das personagens: pessoas boas, que justamente por serem humanas metem os pés pelas mãos, indo contra qualquer noção de perfeição ou imperfeição. O roteiro se interessa menos por grandes tramas e decisões narrativas do que por pequenos gestos, relações e reações. As personagens, por menores e menos contextualizadas que sejam, conseguem deixar marcas e ajudam a construir a atmosfera do filme, ao mesmo tempo tão própria e tão universal.

Mais Uma Chance
Mais Uma Chance

Mais Uma Chance

A história por trás de Mais Uma Chance é curiosa. Em 2007, Tamara Jenkins lançou o filme A Família Savage, obra independente que fez sucesso e recebeu duas indicações ao Oscar, incluindo Melhor Roteiro Original. Apesar de indicada ao maior prêmio da indústria, a cineasta só conseguiu lançar o filme seguinte neste ano, através da Netflix. Com uma trama bem pessoal, baseada em fatos da vida dela e do marido, o longa acompanha a saga de um casal de artistas já na casa dos 40 anos (interpretado por Kathryn Hahn e Paul Giamatti) no processo de tentar engravidar. Com mais de duas horas, o filme esmiúça peculiaridades e afetos bastante íntimos dessa jornada pela qual a própria Tamara passou - apesar disso, o longa não é exatamente autobiográfico. A partir do olhar para a gravidez, Mais Uma Chance diz respeito também sobre envelhecimento, família e intimidade. Assim como Gente de Bem, a obra se debruça nos detalhes das relações. Já na direção, a fuga da obviedade é bem vinda e se aposta em caminhos diferentes como pequenas experimentações e ironias visuais. O casal protagonista merece um destaque à parte: enquanto Paul Giamatti traz humanidade e honestidade a um papel que poderia cair em clichês, Kathryn Hahn comprova em Mais Uma Chance - juntamente de outros trabalhos de destaque como a série Transparent, por exemplo - o equilíbrio delicado que traz em si entre o humor
e o drama.

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