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Um ano depois da greve, custo maior e muitas incertezas
Reportagem

Um ano depois da greve, custo maior e muitas incertezas

| Caminhoneiros | Combustível e frete pressionam os custos de produção no Brasil. Risco de uma nova greve assombra
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Foto no Ceará, na BR-116, da greve dos caminhoneiros que aconteceu em 2018 (Foto: Fábio Lima)
Foto: Fábio Lima Foto no Ceará, na BR-116, da greve dos caminhoneiros que aconteceu em 2018

Em 2018, por 11 dias de maio, o Brasil praticamente parou. A alta dos preços dos combustíveis levou os caminhoneiros a paralisarem as atividades, bloquear rodovias, gerando repercussão em diversos setores e no crescimento da economia. Somente no Ceará mais de 17 trechos chegaram a ser fechados. O impacto não foi apenas naquele mês, mas o ano inteiro. O Produto Interno Bruto (PIB), que vinha crescendo a uma média de 1,8% de janeiro a abril, caiu para 0,8% de maio a dezembro de 2018, segundo dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Hoje, um ano após a greve, embora o abastecimento já esteja normalizado, o custo de produção no Brasil está mais alto e as fragilidades que levaram àquela situação persistem.

O preço do diesel no Ceará, por exemplo, está, em média, R$ 0,07 maior do que se tinha há um ano. Tampouco já se tem um acordo consolidado entre governo e os caminhoneiros, o que contribui para o clima de incerteza entre as empresas, em um contexto macroeconômico muito difícil.

"Não é o único fator. Hoje, o que está sendo substancial para esta demora na retomada da economia é falta de perspectivas em relação às reformas estruturantes, como a Previdência e tributária, mas, sem dúvida, é mais um complicador", avalia o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Ceará (Ibef-CE), Raul Santos.

Ele diz que se teve uma lição deixada pela greve do ano passado foi justamente a força dos caminhoneiros. "Antes, ninguém achava que o País iria parar como parou".

A dependência logística histórica do modal rodoviário brasileiro cobrou um preço alto da economia. Um estudo divulgado em junho pela Federação das Indústrias do Ceará (Fiec) mostrou que, durante a greve, 94,6% das empresas cearenses relataram dificuldades para adquirir insumos e mais da metade teve redução do faturamento e da produção acima de 25%. E, em agosto do mesmo ano, embora os indicadores industriais tenham apresentado melhora de 18% em relação ao cenário que se tinha em maio, a utilização da capacidade instalada, do emprego e das horas trabalhadas ainda se situavam em valores bem abaixo do que se tinha em abril, antes da greve.

O professor de Teorias Econômicas da Universidade Federal do Ceará (UFC), Joseph Vasconcelos, explica que embora tenha tido impacto significativo sobre os resultados da economia em 2018, com repercussões de ponta a ponta, é difícil estimar o tamanho desse prejuízo de forma isolada, até porque depois veio a Copa do Mundo e a instabilidade das eleições.

Ele reforça, por outro lado, que a criação de uma tabela mínima de frete, uma das soluções apresentadas pelo governo Temer (MDB) à época para resolver o impasse com os caminhoneiros, segue pressionando o custo de produção no Brasil e os preços finais. "O frete ficou mais caro e quando se mexe nisso, acaba afetando o preço de tudo, porque em algum momento da produção há necessidade do transporte da mercadoria. E como as margens das empresas estão pequenas, isso acaba chegando também ao consumidor".

O mercado também está de olho em eventuais tentativas do Governo Federal de interferir na política de preços da Petrobras. "Quando o presidente Bolsonaro (PSL) tentou fazer isso recentemente, o mercado reagiu. As ações da Petrobras caíram, porque esta interferência não é bem vista. Traz de volta o fantasma de erros passados".

Desde a greve, outra mudança foi o aumento da procura por serviços de cabotagem (modal marítimo entre os portos do mesmo País) no Ceará, explica o presidente da Câmara Temática de Logística do Ceará e do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Heitor Studart. Principalmente, em grandes setores como metalmecânico, têxtil, calçadistas e frutas. "Aumentou 30% no Pecém".

Mas os números ainda são insuficientes para inverter a lógica de transporte brasileira. Tampouco houve grandes avanços em termos de infraestrutura rodoviária que pudessem aliviar os custos de transporte. "As grandes obras estão estagnadas".

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