Logo O POVO+
Um ano após chacina, julgamento segue sem data para ocorrer
Reportagem

Um ano após chacina, julgamento segue sem data para ocorrer

| CHACINA DAS CAJAZEIRAS | Apesar de decretada prisão preventiva, acusados pelo assassinato de 14 pessoas em 27 de dezembro do ano passado ainda aguardam julgamento
Edição Impressa
Tipo Notícia Por

Ainda demora para que os responsáveis pelo assassinato de 14 pessoas no Forró do Gago, em 27 de janeiro de 2018, possam ser condenados. O caso da Chacina das Cajazeiras, que completa um ano amanhã, ainda aguarda decorrer o prazo que os réus têm para responder à denúncia do Ministério Público Estadual (MPCE). A acusação só foi recebida pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJCE) em dezembro, após quase 11 meses do crime.

Em nota, o TJCE explica que, somente com as respostas nos autos serão designadas as audiências de instrução. Só então ocorre o tribunal do júri, em que "sete pessoas do povo" fazem o julgamento, com o prevê a lei para casos de homicídio.

Quinze pessoas foram denunciadas pelo MPCE e tiveram prisão preventiva decretada. Quatro, apontadas como lideranças da facção criminosa Guardiões do Estado (GDE), foram enviadas a presídios federais, diz o TJCE. Zaqueu Oliveira da Silva foi o último a ser transferido, pela série de ataques no Estado iniciada em 2 de janeiro último. Esses homens são apontados como membros do "conselho superior" da GDE. Oito pessoas, ao todo, constam na denúncia do MPCE como tendo autorizado a matança — sete participariam da cúpula da facção.

Onze haviam sido indiciadas pela Polícia Civil, que ainda apontou dois adolescentes como participantes. Ao receber o inquérito, o MPCE entendeu haver elementos para denunciar ainda outras quatro pessoas. O POVO buscou contato com o promotor responsável pelo caso, mas foi informado, através da assessoria do MPCE, que ele não estava concedendo entrevistas sobre o tema.

Uma célula responsável pelas missões mais importantes da facção executou o crime, apontou o relatório do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), ao qual O POVO teve acesso. A motivação veio da rivalidade entre as facções: o bairro seria dominado pelo Comando Vermelho (CV).

No entanto, os disparos foram efetuados de maneira aleatória. Antecedentes criminais apenas três vítimas tinham. Mais de uma centena de estojos de munição foram encontrados pela perícia. Uma granada chegou a ser arremessada, mas não explodiu. Os próprios criminosos reconheceriam isso. Em discussão após o crime, havia a queixa que muitos inocentes tinham sido mortos, sobretudo, mulheres, apurou o inquérito policial. Em depoimento, um dos presos disse que o principal alvo era o dono do local. No entanto, em áudio encontrado em celular apreendido, um reclama que "a pegada era para ter sido mais tarde para morrer mais gente".

Na consulta processual no sistema virtual do TJCE, aparece apenas um pedido de relaxamento de prisão relacionado ao caso. O beneficiado é Deijair de Souza Silva, o "De Deus", apontado no inquérito como o "01" da GDE. No pedido, a defesa nega a participação no crime. A acusação não teria "suporte em base real". "Neste processo o requerente foi alvo de diversos métodos de investigação ilegais,que sempre deixaram evidente o castelo teórico construído visando condená-lo sem provas". Em 11 de dezembro, o pedido foi negado pela Justiça: "Restam evidenciados indícios suficientes de autoria em relação ao acusado (...)".

 

AS VÍTIMAS

Um mês após a matança, O POVO contou um pouco sobre quem eram as vítimas. Veja:

Maria Tatiana da Costa Ferreira, 17, era estudante de ensino médio e dizia que queria ser defensora pública. Estava grávida de dois meses.

Brenda Oliveira de Menezes, 19, foi baleada no coração. Estava comprando um lanche quando, do lado de fora do Forró, foi atingida.

José Jefferson de Souza Ferreira, 21, trabalhava em um supermercado e morava no bairro Serrinha.

Raquel Martins Neves, 22, morreu ao entrar no forró, tentando escapar do massacre que começou na rua.

Luana Ramos Silva, 22, era mãe de dois filhos.

Wesley Brendo Santos Nascimento, 24, era servente de pedreiro. Foi alvejado fora do Forró. Deixou mulher e filho, que mudaram de bairro.

Natanael Abreu da Silva, 25, era motorista do aplicativo Uber. Havia ido deixar um passageiro na rua e foi alvejado. Deixou esposa e um filho.

Antônio Gilson Ribeiro Xavier, 31, trabalhava em empresa de extintores.

Renata Nunes de Sousa, 32, mãe de dois filhos.

Mariza Mara Nascimento da Silva, 37, comerciante e mãe de quatro filhos. Estava de passagem pela rua quando foi baleada. A família autorizou a doação das córneas.

Edneusa Pereira de Albuquerque, 38, dona de casa, mãe de nove filhos.

Raimundo da Cunha Dias, 48, era pedreiro. No dia do massacre, bebia cerveja em uma das vendinhas na rua. Era casado e deixou três filhos.

Antônio José Dias de Oliveira, 55, marceneiro e vendedor ambulante, era conhecido por Marron. Pai de seis filhos. Estava na porta do Forró vendendo cachorro-quente. Antes de morrer, salvou filho, atingido na perna, e a esposa.

Dezoito pessoas ainda ficaram feridas.

FORRÓ

O Forró do Gago recebia festas patrocinadas por integrantes do CV, conforme a Polícia. Conforme relatos de testemunhas, cerca de dez homens participaram da execução.

OS RÉUS*

Deijair de Souza Silva

"Conselheiro" da GDE, autorizou a chacina.

Noé de Paula Moreira

"Conselheiro" da GDE e "sintonia" no Siqueira. Idealizou e deu o aval para a chacina.

Misael de Paula Moreira

Irmão de Noé. Também "conselheiro" da GDE e "sintonia" no Siqueira. Seria líder da OQC, célula da GDE para ações especiais. Responsável por selecionar executores e organizar a logística.

Auricélio Sousa Freitas

"Conselheiro" da GDE, líder do tráfico nas comunidades Babilônia e Barroso II. Teria fornecido parte das armas usadas.

Zaqueu Oliveira da Silva

"Conselheiro" da GDE. Lidera o tráfico na comunidade da Rosalina. Teria fornecido parte das armas e disponibilizado a casa em que os executores se reuniram. Teria indicado quatro pessoas para o crime.

Francisco de Assis Fernandes da Silva

"Conselheiro" da GDE, autorizou a chacina

João Paulo Félix Nogueira

"Conselheiro" da GDE, lidera o tráfico na Cidade Jardim. Também autorizou a chacina.

Ednardo do Santos Lima

Membro da GDE, apontado como um dos mandantes.

Fernando Alves de Santtana

Assumiu participação no crime, como motorista de um dos carros. Apontado como membro do OQC.

Ruan Dantas da Silva

Afirmou ter incendiado um dos carros usados na chacina. Tem no braço tatuagem com a sigla OQC.

Rennan Gabriel da Silva

Um dos executores, membro do OQC.

Francisco Kelson Ferreira do Nascimento

Um dos executores, membro do OQC.

Victor Matos de Freitas

Um dos executores.

Ayalla Duarte Cavalcante

Incendiou um dos carros usados no crime.

Joel Anastácio de Freitas

Um dos executores. Avisou com antecedência à namorada sobre a chacina.

*Acusações se baseiam em denúncia do MPCE.

 

Matança

Era início da madrugada quando homens chegaram atirando já na rua do Forró do Gago, invadindo o local. O inquérito relata que algumas vítimas chegaram a levantar as mãos implorando para não serem mortas.

O que você achou desse conteúdo?