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O terror que os moradores de Milagres viveram
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O terror que os moradores de Milagres viveram

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Caiu a noite na sexta-feira, 7, em Milagres e poucas pessoas começaram a ocupar as calçadas, diferente de um fim de semana comum. Lanchonetes na Praça da Igreja colocaram mesas e cadeiras para fora, mas nenhum cliente apareceu. Na frente das casas, as pessoas preferiram não colocar cadeiras.

 

O dono de uma das lanchonetes, Júnior Belém, sentado em um banco da praça, disse ter ouvido os tiros na noite anterior. Aos 51 anos, todos vividos em Milagres, conta: "Está todo mundo assombrado. Foi tanta bala que a cidade inteira ouviu. Foi o primeiro crime que vimos e foi grande demais". Júnior mora com a mãe, de 77 anos. Nenhum dos dois confirma sensação de medo. 

 

"Os bandidos que não morreram, a Polícia já pegou", resume Júnior.

 

A 400 metros dali, no cenário de parte dos crimes, outra lanchonete de mesas vazias. Bem na esquina do Banco do Brasil e Bradesco, entre as recentes manchas de sangue no chão e marcas de bala nas paredes e postes, um grupo de três rapazes relata a versão que roda a cidade sobre a matança da madrugada anterior e comenta sobre as fotos dos corpos pelo WhatsApp.

 

O barulho de tiros também os fez acordar de madrugada. Eles preferem que seus nomes não sejam divulgados no jornal. "Milagres sempre foi uma cidade muito tranquila, até porque não tem muitas saídas para fugir. Até quando tem briga a gente fica surpreso", conta um rapaz de 24 anos sobre uma moto. 

 

Outro, de 28 anos, dono de loja de roupas a poucos quarteirões dos bancos, afirma: "Fiquei meia hora com a loja aberta, de manhã o clima ainda estava muito tenso, tinha muita sirene e helicópteros sobrevoando a cidade, pelo menos dois".

 

E comentam entre si: "Imagina se fosse na madrugada de sábado, quando tem feira nessas ruas? Os feirantes começam a chegar de madrugada. Ia ser terrível, porque era tanto tiro que parecia guerra".

 

Nas imagens de WhatsApp, aparece o corpo da mulher de vestido branco ensanguentado. Edneide Santos, natural de Brejo Santo, que morava em São Paulo. Um conhecido diz que ela vinha do aeroporto de Juazeiro com familiares em um Celta, quando o carro foi abordado. Edneide estava voltando para passar o Natal com a família. A filha pequena e o marido viriam dias depois.

 

De bermuda e sem camisa, um senhor de 72 anos (identidade preservada) conversava na calçada de casa e contava sobre ter sido um dos reféns. A residência a um quarteirão dos bancos tem muro alto e portões de alumínio. 

 

Ele diz que ouviu o tiroteio e pensou ser alguém tentando abrir o portão, foi  ver quem poderia ser. Junto com a mulher, abriu o portão e viu que se tratava de um tiroteio. "Fiquei escondido atrás do portão, mas vi um carro vindo na direção dos bancos, entrando na cidade, dei a mão para o carro parar e evitar passar pelo tiroteio. O carro parou e três homens armados me puxaram para fora de casa". Segundo o relato, ainda tentaram levar a mulher dele, mas ela resistiu e um dos criminosos teria dito: "Deixa a tia aí".

 

Os homens teriam tentado colocar o idoso dentro do carro, um Celta de cor escura, mas estava lotado. "Tinha uma mulher de vestido branco, com os olhos apavorados olhando pra mim. Gritaram para eu sentar no para-brisa do carro". Conta que, como escudo humano, dos dois lados do carro os criminosos atiravam. Deram um cavalo de pau para fugir da Polícia, voltando para o acesso a Brejo Santo e Pernambuco. Segundo ele, a Polícia não os seguiu imediatamente. "Pensei em pular com o carro em movimento, mas tive medo de quebrar o fêmur. Na minha mente só escutava a voz da minha filha, que morreu há dois anos de câncer dizendo 'calma, papai'". Já na BR-116, os criminosos pararam o carro e falaram para ele descer.

 

A orientação da Prefeitura de Milagres, publicada no Facebook, pedia que todos ficassem em casa. "Havia suspeita de que um dos bandidos estava escondido em uma escola infantil. A sensação de estar ilhada na própria casa foi uma pressão muito grande. Permanecemos com a família a manhã inteira no quarto dos fundos", relata a sobrinha do idoso.

 

Um outro morador conta a história da mulher que foi feita de refém dentro da própria casa da madrugada até a manhã de sexta. Ela teria aberto o portão de casa para entender a barulheira. Nesse momento, um criminoso teria invadido a casa, armado. Ao amanhecer, andou com ela até o Banco do Brasil, exigindo saque de R$ 500. De lá, pegou topic de linha em direção a Brejo Santo. A mulher acionou a Polícia, que o capturou dentro do veículo.

 

A versão que os moradores narram é de que um primeiro grupo chegou ao Banco do Brasil e ao Bradesco, que ficam praticamente um de frente para o outro, e já foi interceptado pela Polícia. Na troca de tiros, os criminosos morreram. Outra parte da quadrilha estaria entrando na cidade com os reféns, capturados na BR-116 no trecho entre Milagres e Brejo Santo. Iria usá-los, talvez na hora da explosão ou da fuga, de escudo humano. Mas aqueles que estavam com os reféns fugiram antes mesmo de chegar aos bancos e na perseguição foram mortos. "Ninguém sabe quem matou quem, mas como a Polícia iria saber que tinha um carro cheio de reféns?", disse a advogada.

 

EM CASA

 

À Rádio O POVO CBN Cariri, o prefeito de Milagres Lielson Landim (PDT) comentou que a Polícia orientou a suspensão de atividades no município. "É para evitar que as pessoas saiam de casa e evitar qualquer tipo de incidente envolvendo a abordagem e a tentativa de capturar os bandidos".

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