O POVO - Como o Cedeca acompanha questões semelhantes a da adolescente trans internada no Aldaci Barbosa?
Julianne Melo - O Cedeca Ceará, a fim de garantir o direito à proteção integral da adolescente, solicitou ao Centro de Referência LGBT Janaína Dutra, uma escuta qualificada dela para verificação sobre o local de custódia mais adequado em termos de segurança e identidade de gênero. Embora não haja normativo no âmbito do sistema socioeducativo sobre o tema nem política pública específica, a escuta qualificada é o procedimento recomendado com amparo na resolução 01/2014 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). A resolução estabelece os parâmetros de acolhimento de pessoas LGBT em privação de liberdade. A escuta qualificada da/o adolescente para decisão do local de custódia de acordo com a identidade de gênero já é uma boa prática adotada pelo sistema socioeducativo em estados como Pernambuco e Paraíba. Deveria ser também adotada no Ceará.
OP - Com que frequência há este tipo de acompanhamento?
Julianne Melo - Este é o primeiro caso que nos chega. É extremamente grave que a adolescente estivesse no acolhimento institucional masculino (instituição da Prefeitura municipal de Fortaleza onde ela estava anteriormente), em desrespeito à sua identidade de gênero.
OP - Quais são as demandas mais comuns envolvendo crianças e adolescentes LGBT?
Julianne Melo - No período 2017-2018, o Cedeca-Ceará acompanhou dois casos de violações de direitos relacionados com a temática LGBT e escolas. Um caso relacionado à discriminação em escola e outro caso ligado à violência sexual.
OP - Como o Cedeca avalia a decisão do juiz?
Julianne Melo - O histórico de violência que sofreu a adolescente aponta que o procedimento mais adequado é a medida protetiva, em vez da medida socioeducativa, que deve ser aplicada em casos excepcionais, especialmente quando envolve privação de liberdade. A internação da adolescente com outras adolescentes de variados perfis de ato infracional pode aumentar o quadro de violência em que ela se encontra. Ressalte-se ainda a ausência de políticas públicas que combatam a transfobia que atinge adolescentes. Esse vácuo torna ainda mais precárias as redes de cuidado familiares e comunitaristas e expõem a violência sexual e institucional em situações como estas.