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Universidades entre o medo e as incertezas
Reportagem

Universidades entre o medo e as incertezas

| FUTURO | Comunidade universitária está apreensiva e a expectativa é de dias difíceis com o governo de Jair Bolsonaro, a partir de janeiro de 2019
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Entre turbulências relacionadas ao processo eleitoral e incertezas sobre futuro com Jair Bolsonaro (PSL) na presidência, universidades públicas brasileiras vivem clima de tensão. Professores, alunos e representantes de instituições de ensino superior no Ceará relatam preocupação com cerceamento da autonomia das universidades públicas e da liberdade de cátedra. Propostas do presidente eleito para a educação também geram ansiedade.

 

"A gente nota um clima de apreensão, tanto por parte dos professores quanto por parte dos alunos," observa a professora do departamento de Psicologia da UFC, Andrea Carla Filgueiras, explicando que a sensação de insegurança tem entre os motivos "os atos que aconteceram na última semana de eleição, com a invasão de universidades para a retirada de faixas, de uma forma muito arbitrária".

 [SAIBAMAIS]

Nos dias 25 e 26 de outubro, a justiça eleitoral realizou ações em 17 universidades públicas, de nove estados, para coibir suposta prática de propaganda eleitoral. As operações incluíram a suspensão de eventos, apreensão de cartazes, faixas e de outros materiais e a fiscalização de aulas. No Ceará, além de dois campus da Uece, um da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) foi alvo das intervenções.

 

As decisões judiciais que determinaram intervenções nas universidades foram suspensas no dia seguinte, 27, pela ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF). Entretanto, "o clima de tensão" se manteve, afirma a primeira tesoureira do Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior (Andes), Raquel Dias Araújo, também professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE).

 

Raquel Araújo explica que acontecimentos posteriores acentuaram o problema. Entre "uma série de ataques contra professores", ela destaca o caso da deputada estadual eleita pelo PSL em Santa Catarina Ana Carolina Campagnolo (PSL), que criou um "canal de denúncias" contra professores na internet e pediu que estudantes enviassem vídeos de discursos "político-partidários ou ideológicos" de docentes em sala de aula, após o resultado do segundo turno.

 

A iniciativa está sob investigação Ministério Público Federal (MPF) e, no dia 31, uma liminar da Justiça de Santa Catarina determinou que Campagnolo retire das redes sociais publicações incentivando alunos a delatarem professores.

Segundo relatos de Raquel Araújo e de Sâmbara Paula Ribeiro, presidente do Sindicato de Docentes da Universidade Estadual do Ceará (SindUECE), na esteira desses eventos os dois sindicatos têm tomado conhecimento de ações promovendo "um controle da comunidade acadêmica, ameaçando inclusive professores".

 

A preocupação é intensificada porque algumas das recentes interferências nas instituições de ensino visavam manifestações contra o fascismo e a favor da democracia. "Nós já temos um passado autoritário, que naquele momento atacou muito as universidades e que obviamente gera apreensão, pela história e pelas sinalizações que estão sendo dadas", diz Helena Martins, professora do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal do Ceará (UFC), referindo-se ao período ditatorial.

 

Entretanto, Martins explica que é difícil definir a situação dentro das universidades devido à autonomia universitária e a composição diversa das instituições. Na contramão dos relatos apreensivos, Glauco Barreira, professor da faculdade de Direito da UFC, afirma que no ambiente universitário onde está inserido não há "exasperação".

 

"Eu vejo as discussões de ideias, alguns (professores) prognosticando melhorias para o governo, outros prognosticando uma má gestão, mas sem qualquer situação mais tensa.", relata, acrescentando que talvez a tranquilidade se deva à percepção, entre acadêmicos de Direito, de que há mecanismos da Justiça para refrear autoritarismos e abusos de poder.

O pleno do STF determinou por unanimidade a suspensão das decisões que autorizaram a entrada de policiais em universidades, confirmando a liminar concedida pela ministra Cármen Lúcia no dia 27.

 

Alguns dos professores com os quais O POVO conversou na semana passada sobre as tensões nas universidades não quiseram dar entrevista temendo represálias. "Nós estamos na mira", justificou um deles. O Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (ADUFC) comunicou que a diretoria da entidade deverá se reunir e divulgar posicionamento em breve. Procurado para informar sobre a situação dos alunos da UFC, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade informou que o assunto ainda será discutido.

 

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