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De 26 mananciais de Fortaleza, apenas um não é poluído
Reportagem

De 26 mananciais de Fortaleza, apenas um não é poluído

| LAGOAS E AÇUDES | Processos de despoluição são caros, levam décadas para mostrarem efeito e necessitam de projeto político de continuidade
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Somente uma das 26 lagoas e mananciais de Fortaleza é considerada balneável. O dado leva em consideração os corpos hídricos monitorados pela Secretaria Municipal do Urbanismo e Meio Ambiente e o relatório mais recente que data de outubro do ano passado. O problema é grave. Para ser considerada balneável, uma lagoa precisa ter no máximo 1.000 coliformes termotolerantes a cada amostra de 100 ml, ao passo que mananciais como o açude Uirapuru, por exemplo, chegam a ter quase 700 mil coliformes termotolerantes a cada 100 ml.

 

A problemática, que assola o Brasil todo, se dá principalmente pela histórica baixa cobertura de saneamento básico e tratamento de esgoto. De acordo com dados do Atlas Esgoto, de 2017, da Agência Nacional das Águas, mais de 110 mil quilômetros de trechos de rio estão com a qualidade comprometida devido ao excesso de carga orgânica no Brasil. Desses, 83 mil quilômetros não é mais permitida a captação para abastecimento público por causa da poluição e em somente 27 mil quilômetros a captação pode ser feita, mas requer tratamento avançado.

 

Diante do excesso de sujeira e da escassez hídrica no País e no Mundo, as ações de limpeza se mostram cada vez mais urgentes. No entanto, processos que envolvem a despoluição de um rio ou lagoa são bastante complexos, exigem tempo (décadas) e bastante investimento financeiro. No mundo todo pouquíssimas experiências chegaram a ser exitosas.

 

"Demora muito porque é preciso antes de mais nada identificar as fontes de poluição. A prevenção é a alternativa mais eficiente para que haja uma limpeza. Uma prevenção eficiente deve identificar as fontes de ligações clandestinas, de esgoto, lançamentos diretos", explica Michael Barbosa Viana, coordenador do Laboratório de Efluentes e Qualidade de Água do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará (UFC).

 

Conforme ele, para esse primeiro e importante passo é necessário realizar o tratamento eficiente do esgoto para identificar essas fontes clandestinas. "Antes de mais nada, é preciso uma fiscalização, a gente no Ceará não tem um quantitativo de fiscalização alto, e além dessa prevenção tem também a remediação que consiste em aplicar técnicas de remoção desses poluentes", explica.

 

O rio Tâmisa, na Inglaterra, já chegou a ser considerado um rio morto e hoje é um exemplo de despoluição de rios. Com projeto de limpeza iniciado em 1895, só na década de 1970 conseguiu obter resultados e manter os níveis de limpeza. No Brasil, dois grandes projetos como o Tietê, em São Paulo, e a lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, têm projetos de limpeza mas ainda não conseguiram efetivá-la. O Programa de Despoluição da Bacia do Alto do Tietê se iniciou em 1992 e prometia a limpeza do rio até 2005. Mais de 12 anos do fim do prazo, a meta ainda está longe de ser cumprida. No Rio de Janeiro, a previsão era ter a lagoa limpa para receber as provas de canoagem nas Olimpíadas de 2016.

 

Ainda conforme o Atlas do Esgoto, no Ceará são produzidas diariamente 355 toneladas de carga de esgoto diariamente. Dessa quantidade, 197 toneladas são consideradas cargas remanescentes, que chegam aos corpos hídricos. Nem a Prefeitura, por meio da Agência de Fiscalização, nem a Companhia de água e Esgoto do Ceará, a Cagece, estimaram a quantidade de ligações irregulares em Lagoas de Fortaleza.

 

"O esgoto tem cinco principais poluentes: matéria orgânica, nitrogênio, fósforo e microorganismos patogênico sólidos. Essa matéria orgânica quando é lançada no esgoto sem tratamento adequado faz com que as bactérias decompositoras precisem consumir o oxigênio para degradar essa matéria orgânica, consequentemente, vai faltar oxigênio para seres superiores como o peixe, causando a mortandade", explica Michael, conforme ele, muitas vezes, essa matéria orgânica é tão elevada que a necessidade de decompô-la zera a concentração de oxigênio, iniciando assim um processo chamado anaeróbio.

 

Os processos de despoluição dependem do tipo de dejetos que precisam ser retirados de cada manancial. Jeovah Meireles, professor do Departamento de Geografia da UFC, concorda que aumentar a cobertura de saneamento básico e fiscalização de ligações irregulares estão entre as primeiras medidas. Além disso, há a possibilidade de retirada de sedimentos com técnica de dragagem. 

 

Ele ressalta também a importância da preservação da mata ciliar, que impede a chegada de partículas aos leitos.

 

Ambos os especialistas ressaltam que além de serem caros, todos esses processos levam bastante tempo principalmente para a renovação da água e pouco adiantam se não houver cobertura e tratamento eficiente da rede de esgoto. "Tudo isso precisa partir de tomada de decisões políticas, com recursos, com políticas públicas, com a presença de pesquisadores, da comunidade, acho que é por aí", conclui Jeovah.

 

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