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Recomeço no Benfica: entre silêncios e reações
Reportagem

Recomeço no Benfica: entre silêncios e reações

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O barulho da juventude que frequenta os bares do Benfica deu espaço para uma quietude incômoda depois da chacina da última sexta-feira. “É triste ver o bairro vazio. Nesse fim de semana, o silêncio imperou no Benfica. As pessoas não estão nas ruas, as barracas de comida da pracinha (da Gentilândia) não abriram”, lamenta o professor Lucineudo Machado, 31, que escolheu morar na região por “afeto ao bairro”. Docente do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (Uece), ele tenta recobrar a esperança. “Logo mais o Benfica se enche de novos amores, militâncias, liberdades”. 

[SAIBAMAIS] 

Pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV), Marcos Silva,  porém, destaca o luto ainda latente. “O que aconteceu vai de encontro ao discurso de ocupar as praças e ruas, que é tão trabalhado, inclusive em campanhas políticas. Como a gente ocupa o espaço público se não tem uma presença efetiva da segurança pública?”, questiona o professor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab). “Uma chacina como essa provoca um nível de desconfiança sobre o combate à criminalidade. A praça, que deveria ser uma área de lazer, se torna um espaço de violência, o que acaba reforçando o discurso de que só o espaço privado é seguro”, aponta, destacando que, com medo, a Cidade se torna ainda mais perigosa.


Proprietário de bar na região, Jean Silva, 34, defende que a Cidade lute pelo bairro. “No Benfica, os jovens se sentem livres, se expressam com seu jeito de ser, muitas universidades encontram-se ali perto, é um local conhecido como encontro da diversidade”. Ele, entretanto, não fecha os olhos para o perigo que se revela constante: “Mas tudo acaba sendo afetado por causa desta insegurança. A tendência é a perda de mais um local de lazer e diversão”.


Militante da causa LGBT e frequentador do bairro, o ator Ari Areia, 26, pondera ser difícil projetar o impacto da chacina. “Não é uma situação fácil de processar, é um trauma, demora. Mas acredito que cabe a nós, em nossas resistências, não deixar que o medo vença”, aponta ele, que teve a região como casa por três anos.


Moradora do Benfica, a mestranda em Sociologia Luana Carolina, 25, faz coro ao destacar que o bairro acabou refletindo um contexto macro da Capital. “O Benfica não está desligado do que vive Fortaleza, o bairro faz parte de um contexto de insegurança alimentado por uma desigualdade social gritante. É difícil não sentir medo e querer se recolher após tantas barbáries, mas o discurso de medo gera ainda mais desmobilização e apatia”, aponta a pesquisadora da Universidade Federal do Ceará (UFC).

 

Os alunos e servidores da UFC estão organizando ato para a manhã de hoje. A ideia é que os departamentos se reúnam às 11h30min para prestar luto na praça da Gentilândia “na forma de um abraço coletivo”. A proposta é que se leve velas, flores e cartazes para o espaço que viveu noite de terror. O Sindicato dos Servidores do Instituto Federal do Ceará (IFCE) lançou nota manifestando pesar pelo ocorrido. “São sete pessoas que deixam de existir. Sete famílias desestabilizadas para sempre. Sete marcas indeléveis nos corações de todos que sonham e lutam pela educação, pelo direito à cidade, pela liberdade de ir e vir, pela construção de uma sociedade mais humanizada e menos desigual”, destaca o material.

 

RETORNO DOS HÁBITOS


Apesar do movimento menor, restaurantes e bares da região voltaram a abrir as portas nos dias seguintes à chacina. Os estabelecimentos não pretendem

encurtar o atendimento

 

RENATO ABÊ

renatoabe@opovo.com.br

 

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