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Por que é tão difícil combater o crime organizado
Reportagem

Por que é tão difícil combater o crime organizado

| VIOLÊNCIA | Política sobre drogas, sistema prisional e corrupção de agentes são apontados como alguns dos gargalos no combate ao crime organizado, na avaliação de especialistas
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Entender o contexto de violência que culminou na maior guerra entre facções criminosas já vista no Ceará passa, obrigatoriamente, pela compreensão da dinâmica de atuação desses grupos. Embora disputem territórios para o tráfico de drogas nas comunidades da periferia, foi longe delas, no interior das penitenciárias, que essas organizações se estabeleceram e se articulam no Estado, cuja localização é considerada estratégica.

[SAIBAMAIS]
Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho (CV), Guardiões do Estado (GDE) e Família do Norte (FDN) são as quatro maiores da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Cada uma delas possuiu uma penitenciária - ou mais - para chamar de sua. De dentro dos muros, se organizam. Do lado de fora, atuam à sua maneira.
 

Enquanto PCC e FDN adotam o modelo “empresarial e discreto”, visando ao lucro, CV e GDE são “descentralizadas” e travam uma “guerra” pelo domínio de territórios. Conflito que ocasionou grande parte das 5.134 mortes registradas no Ceará, em 2017, o ano mais violento da nossa história. Motivou ainda a Chacina das Cajazeiras, com suas 14 vítimas, maior matança do Estado. [FOTO2]
 

E embora as facções exerçam seu controle de dentro dos presídios, prender tem sido a principal reação adotada pelas autoridades, ante o avanço da violência, na tentativa de frear os danos que o embate tem provocado. Diante deste cenário, especialistas ouvidos pelo O POVO alertam que a repressão simplória somente agravará o ciclo vicioso de prisões e aumento da criminalidade.
 

Na avaliação da socióloga Camila Nunes Dias, professora da Universidade Federal do ABC (UFABC), o problema está sendo abordado da maneira errada, em âmbito nacional. Pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP), ela destaca que as políticas do encarceramento desenfreado e do combate ao tráfico devem ser repensadas.
“Na verdade, essa guerra às drogas funciona nas cidades como uma guerra contra a pobreza. A gente não costuma ver traficante rico sendo preso. Ela aumenta o encarceramento, sobrecarrega as prisões e, portanto, a reprodução dos problemas”, afirma. Exemplo da avaliação foi a prisão de uma mulher de 24 anos, no dia 10 de fevereiro, em São Paulo.
 

Jéssica Monteiro foi autuada por tráfico após ser flagrada com cerca de 90 gramas de maconha. Foi encarcerada na véspera de dar à luz e ficou presa, juntamente com o filho, recém-nascido, por dois dias na cadeia. Após a repercussão do caso, a Justiça determinou que a jovem cumprisse prisão domiciliar.
 

Fonte da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), que atua no combate às facções, também defende uma reconfiguração do sistema penitenciário e dos conceitos vigentes. “Precisamos desmistificar a ideia de que a facção se combate nas comunidades”, alerta. O foco, sugere, devem  ser os presídios. 


“A mudança tem que começar nas penitenciárias. As principais lideranças das facções estão todas lá, presas. E podem prender o mandante e os envolvidos na Chacina das Cajazeiras. Não adianta. Aparecerão outros dez para comandar e fazer a mesma coisa. Prender não resolve. Se resolvesse, não estaríamos onde estamos. Precisamos parar de delirar”, alerta.

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