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A proteção de dados no trabalho
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A proteção de dados no trabalho

A necessidade de aplicar nas relações de trabalho um sistema de proteção de dados pessoais dos empregados é o tema da tese do advogado Emmanuel Furtado Filho
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Fiscalizar um empregado, até certo ponto, não causa nenhum estranhamento. Em tempos de redes sociais, controlar informações no meio virtual é muito mais valioso do que exercer um controle físico. Diante disso, o professor universitário Emmanuel Furtado Filho defendeu, em sua tese de doutorado em Direito, a proteção de dados pessoais do empregado no ambiente de trabalho. (Amanda Araújo)

 

OP - Como no Brasil a gente pode ter um sistema de proteção de dados pessoais dos empregados?

 

Emmanuel Furtado Filho - As novas tecnologias trouxeram esses fenômenos de transição em que um direito à privacidade como a gente via já não é mais suficiente para proteger essa liberdade individual da pessoa. O próprio direito da privacidade surgiu em decorrência do avanço tecnológico, foi justamente em função da difusão da imprensa na Europa, que esse novo meio de comunicação permitiu, vamos dizer assim, que a esfera familiar de algumas pessoas, principalmente as pessoas famosas e depois as não tão famosas pudesse ser defasada pela comunidade. Isso gerou nos tribunais, na Europa e nos EUA, uma necessidade de formular novas teses de proteção a essa liberdade individual que foi tida através desse direito da privacidade, que é consagrado aqui no Brasil. Mas, hoje, esse direito não é mais suficiente para comportar todas as formas de atentado a essa esfera de proteção individual. 

 

Essas novas tecnologias da comunicação e da informação, elas permitem a difusão, armazenamento, processamento, compartilhamento de dados, de forma que a gente está sujeita a novas formas de risco, que esse direito clássico à privacidade não protegia. Por isso, a gente reclama um direito a proteção de dados pessoais como um desdobramento do direito à privacidade, e isso também nas relações de trabalho.

 

OP- Essas novas tecnologias também mudaram as relações de trabalho.

 

Emmanuel - Antigamente nas relações de trabalho, o direito à privacidade existia principalmente sob a forma do direito à intimidade, digamos assim, até que ponto um empregador pode mexer na bolsa de um empregado para fiscalizar, até que ponto ele pode abrir a gaveta de um empregado e ver seus objetos pessoais, isso se discutia, mas era um assunto paralelo. Hoje não, a gente trabalha e o nosso próprio objeto de trabalho, que muitas vezes é o computador, ele é ambivalente, no sentido de que nós estamos o utilizando, controlando, mas ele também está controlando a gente. A gente deixa rastros de tudo que a gente faz, o empregador pode ter noção, por exemplo, de quanto tempo eu demorei para fazer uma atividade, quanto tempo eu costumo produzir, até que ponto, enfim, ele pode decodificar essas informações e tratá-las de uma forma que sequer o empregado sabe ou tem conhecimento da dimensão daquele poder, que ele está a todo instante sendo vigiado, é um controle total.

 

OP- O empregador pode mexer na bolsa em que circunstâncias?

 

Emmanuel - A jurisprudência só permite que você possa fiscalizar um empregado em alguns casos, por exemplo, alguém que trabalha em uma joalheria e que há uma certa suspeita que essa pessoa pode estar levando alguma coisa. Aí o empregador pode de uma maneira reservada, de uma maneira sóbria, averiguar, pedir que o empregado abra a bolsa. Em situações excepcionais isso é possível, por isso que aqui ainda se pensa que é melhor você ter um meio eletrônico como uma câmera, a jurisprudência brasileira entende como menos lesiva que um controle físico, mas a câmera tem uma capacidade, digamos assim, muito maior de lesar o empregado, porque ela armazena dados. É um olho que tudo vê, o direito do trabalho foi concebido para legitimar esse controle do empregador sobre o empregado, mas um controle do homem pelo homem, mas hoje a gente está vendo um controle da máquina pelo homem. A máquina é infalível no controle, capta aquilo ali e acabou-se, ainda pode constituir-se como meio de prova, e isso o Direito brasileiro do trabalho tem ainda que avançar.

 

OP- Quais os mecanismos do empregador para se proteger?

 

Emmanuel - Primeiro, é necessário que haja uma transparência no sentido de que o empregador tem que dizer de forma clara para o empregado quais são os mecanismos que ele utiliza para controlar a atividade dele. O segundo passo é a finalidade dos dados, essa coleta desses dados tem que ter uma finalidade específica, o empregado tem que saber de que forma o empregador cruza esses dados. Hoje, as grandes empresas tomam decisões com base em números, que elas veem desse processamento de dados, nem sempre essas decisões são corretas, do ponto de vista que às vezes o empregado é um bom empregado, mas esse cruzamento de dados acaba trazendo uma situação desfavorável para ele, ou mesmo ele não sabe como está sendo avaliado, quais dados importam ou não. O empregador não pode coletar dado que não tenha relação direta com a eficiência do trabalho, relação com o contrato de trabalho especificamente. Existem dados também que o empregador sob hipótese nenhuma pode coletar, dados sensíveis, como jurisprudência de outros países chama e a própria lei também trouxe, dados ligados a sua orientação política, a sua carga genética, a sua saúde, esses dados não podem ser de forma alguma armazenados, processados pelo empregador.

 

TESE

 

Os poderes do empregador face às tecnologias da informação e da comunicação: perspectivas de uma proteção aos dados pessoais dos empregados no Direito do Trabalho brasileiro a partir de uma análise de Direito Comparado. A pesquisa foi orientada pelo professor Eric Canal-Forgues e professora Tarin Cristino Frota Mont'Alverne

 

CURRÍCULO

 

Emmanuel Furtado Filho é bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mestre em Direito Privado pela Universidade de Le Havre e doutor em Direito Internacional e Direito do Trabalho pela Universidade Paris V Descartes.

 

Direito do Trabalho

 

1. Consagra poderes ao empregador pelo contrato de trabalho: de um lado você tem um empregado que se subordina ao comando do empregador, e por outro você tem um empregador que vai exercer esses poderes.

 

2. Poder de dirigir a atividade do empregado

 

3. Poder de fiscalizar essa atividade

 

4. Poder de emitir comandos através de regulamentos internos

 

5. Poder de punição, o poder disciplinar, seria o poder de aplicar sanções caso haja um descumprimento contratual.

 

 

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