Você conhece alguma criança com alguma habilidade que salta aos olhos? Ou que faz perguntas a toda hora, querendo saber tudo bem explicadinho? Ou ainda, que prefere conversar mais com adultos sobre assuntos e preocupações que não são típicas da sua idade? Ou que na escola aprende mais rápido, entrega as tarefas antes de todos e pode até ser indisciplinado, pois fica sem ter o que fazer? Conhece alguma criança ou adolescente que manifesta indiferença com exercícios de fixação e se cansa com explicações repetitivas?
Esses são alguns indicadores comportamentais que podem apontar para um fenômeno complexo e com diversas características contrastantes conhecido como Altas Habilidades ou Superdotação (AH/SD). É claro que não chegamos nem perto de enumerar todos os aspectos comportamentais e para termos uma análise correta e completa se uma criança é ou não superdotada, é preciso fazer uma avaliação psicológica e/ou psicopedagógica. Entretanto, podemos aqui, apresentar algumas informações que podem fazer com que pais e educadores em geral tenham um olhar qualitativamente diferenciado sobre esse público.
Modernamente, a teoria que melhor discute essa questão foi apresentada pelo psicólogo norteamericano Joseph Renzulli e é intitulada de Modelo dos Três Anéis da Superdotação. Nessa concepção as AH/SD são entendidas como a combinação de três grandes características: 1) Elevado desempenho em algum área do conhecimento ou habilidade humana; 2) elevado nível de pensamento divergente ou criatividade; e 3) elevado nível de dedicação a tarefa (que seja de seu interesse). É importante observar que nessa concepção, o aspecto de um QI (quociente de inteligência) não é considerado como fator determinante, como muitos pensam ser. Normalmente as pessoas associam o superdotado com aquela pessoa com um QI elevadíssimo, o que não é sempre verdade. Um indivíduo pode ser superdotado na Música, nos Esportes ou em habilidades sociais e possuir um QI médio, por exemplo.
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Ao encontro desse entendimento, temos que em documentos legais os indivíduos AH/SD são entendidos como aqueles que “apresentarem notável desempenho e elevada potencialidade em qualquer dos seguintes aspectos, isolados ou combinados: capacidade intelectual geral; aptidão acadêmica específica; pensamento criativo ou produtivo; capacidade de liderança; talento especial para artes e capacidade psicomotora”. Portanto, reconhece-se que existem tipos distintos de AH/SD, o que é muito importante para que possamos melhor identificar, valorar e acompanhar essas crianças e adolescentes.
Infelizmente, existe muita confusão no imaginário popular quando tratamos desse tema, o que prejudica bastante a qualidade da educação prestada.
Alguns pensam que os superdotados não precisam de apoio, que andam com as próprias pernas e que sempre tiram boas notas, ou seja, o paradigma de aluno ideal. Contudo, isso é um mito. Por exemplo, em minha tese doutoral eu tive um achado bem interessante, um dos alunos com um dos QIs mais altos era justamente o mais “trabalhoso” da escola e “vivia sendo suspenso”, nas palavras da diretora ao saber dos resultados dele no teste de inteligência WISV IV.
É muito importante que as escolas e pais identifiquem e acompanhem crianças e adolescentes de maneira diferenciada, pois isso não se trata de um privilégio, mas de um direto humano, isto é, receber a educação qualificada conforme suas necessidades e potenciais. Ninguém questiona que uma pessoa que detenha alguma deficiência precise de adequação curricular ou acompanhamento especial, então devemos levar essa mesma lógica para os AH/SD, para os mesmo alcancem o pleno desenvolvimento cognitivo, emocional e social. Afinal, esse é o papel do educador: ajudar as pessoas a se tornarem a melhor versão delas mesmas.
IGOR DE MORAES PAIM
Doutor em Educação
(UNESP – Marília)
Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará – Campus Umirim