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Os impactos da migração venezuelana nas cidades

2018-03-05 01:30:00
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Na tentativa de aliviar a situação de Boa Vista (RR), o Governo Federal criou medida provisória que prevê a interiorização de migrantes venezuelanos. Para especialistas ouvidos pelo O POVO, este movimento deve ser feito de forma coordenada, de modo que essas pessoas sejam enviadas para cidades que careçam de mão de obra e possam recebê-las.

 

“O governo brasileiro retardou muito essa situação. Especialistas vêm falando sobre isso há dois anos. Em São Paulo, não chegaram muitos, nem no Rio de Janeiro. O governo não sentiu, porque eles não chegaram nos grandes polos em que o Conare (Comitê Nacional para os Refugiados) atua”, explica a pesquisadora Patrícia Gorisch. Maior foco de migrantes haitianos e sírios, a Prefeitura de São Paulo informou que o Centro de Referência e Atendimento para o Imigrante ( Crai) recebeu somente 16 venezuelanos de outubro de 2017 a fevereiro de 2018.

 

Coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Roraima, o professor João Carlos Jarochinski explica que o perfil dos venezuelanos é diferente de outros povos. Eles não têm cultura de migração. Pelo contrário, na década de 1980, o país tinha cerca de 7% da população de migrantes. Eles também tendem a ficar mais perto de casa. “Estar próximo à fronteira é positivo para essas pessoas pela remessa de dinheiro, que não conseguem fazer por vias formais, também remessa de alimentos e remédios”, afirma o especialista.

 

Na última terça-feira (27/2), o Governo convocou cátedras e especialistas a Brasília para buscar soluções para melhor acolher e integrar a nova leva de migrantes. Jarochinski avalia que o debate vai além do caráter humanitário e deverá ter consequências políticas e econômicas. Segundo ele, a chegada dos venezuelanos tem servido para construir discurso xenófobo e reforçar programa da centro-direita, que faz crítica severa à esquerda latino-americana.

 

“A falência do estado venezuelano pode ser usada do ponto de vista eleitoral. Pode consolidar um lado nacionalista e xenofóbico. Do ponto de vista da esquerda, causa silêncio, porque é difícil admitir que uma migração forçada vem de um governo que não funcionou”, diz. Na economia, Jarochinski argumenta que a chegada dos migrantes deve ser um impulsor de desenvolvimento. Ele lembra que, mesmo com a situação difícil de Roraima, o PIB do Estado cresceu em 2016.

 

“Os últimos ciclos migratórios confirmam que cidades com maior fluxo de migrantes são as mais dinâmicas ao redor do mundo. O Brasil podia aproveitar boa parte da população que tem ensino superior”, engenheiros, médicos e outras profissões, principalmente na região Norte. Outro ponto da interiorização é justamente a revalidação desses títulos mais rapidamente”, pontua.

 

Para Patrícia e Jarochinski, o Brasil tem total condição de absorver os venezuelanos. Pelos dados da Polícia Federal, hoje, menos de 1% da população do Brasil é de estrangeiros. O percentual é bem mais alto em países como Estados Unidos (14,5%), Alemanha (14,9%) e Rússia (8,1%), segundo relatório do Departamento das Nações Unidas para Assuntos Econômicos e Sociais. A ONU estima que 1 milhão de venezuelanos tenham deixado o país desde o início da crise. A maioria deles está na Colômbia (550 mil até o fim de 2017). O Brasil recebeu menos de 10% desse volume.

Isabel Filgueiras

 

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