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Ceará e Rio se aproximam em resposta federal

2018-03-17 01:30:00


Rio de Janeiro e Ceará assumem papel central diante do debate político que se estabelece sobre a segurança pública no País. Este ano, os dois estados foram cenários dos mais representativos casos de violência registrados no Brasil. Mas, ainda que guardem semelhanças nos números e na atenção do Governo Federal na resolução dos casos, os estados guardam mais diferenças do que aproximações. É isso que indicam os especialistas ouvidos pelo O POVO.

 

Ambos os estados têm recebido atenção do Governo Federal na área. Na última quinta-feira, 15, o ministro Raul Jungmann esteve em Fortaleza para oficializar a implantação do primeiro Centro Integrado de Inteligência de combate ao crime organizado do País. No mesmo dia, esteve no Rio para acompanhar as investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol) no Rio, onde o Planalto autorizou intervenção federal inédita na área da segurança, sob o comando de militares.

Num momento em que o presidente Michel Temer (MDB) decidiu investir na resposta à violência como estratégia para tirar do fracasso sua popularidade, os estados dividem atenções em Brasília, mas guardam diferenças. Geografia, abrangência das ações e comportamento do crime organizado são alguns dos pontos que revelam as distâncias, na visão de Lênin Pires, coordenador do Departamento de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF).

 

“Tem aspectos particulares no Rio. Dos grupos que atuam no varejo e na distribuição das drogas e armas, principalmente. O polo de disputa é muito forte. Essa disputa no Ceará ainda não é tão grande. O PCC se estabeleceu de forma diferenciada”, entende o pesquisador. Para ele, são essas especificidades que devem ser identificadas para garantir uma resposta específica para cada cenário.

 

Na avaliação de Pires, o País passa por um período de federalização do enfrentamento da violência, o que é prejudicial para a resposta ao crime. “Eu vejo um Governo Federal extremamente fragilizado tentando governar através desses instrumentos”, diz citando o caso da intervenção no Rio.

 

No caso fluminense, o pesquisador percebe que o agravemento da violência se dá também por questões políticas. “A gente tem uma Prefeitura precarizada, assim como um Governo incapaz de administrar o problema”. Com a solução política cada vez mais desacreditada, principalmente por conta dos atores, soluções como a intervenção federal passam a ser consideradas. É o erro, na avaliação do pesquisador. “A solução tem que ser política”.

 

Encarar o problema como uma questão social e, não, pelo viés do aumento da repressão simplesmente é caminho visualizado pelo sociólogo Marcos Silva, pesquisador do Laboratório do Estudo da Violência (LEV-UFC). “O Governo não compreendeu que só colocar polícia na rua não resolve a criminalidade. Eles têm de estar na rua, claro, mas têm que ter todo um conjunto de atividades, políticas sociais, para uma interligação mais orgânica”, comenta.

 

O especialista concorda com Pires, quando diz que os ambientes dos dois estados são diferentes, e, por isso, exigem respostas específicas. No entanto, sugere que o Governo pode ter falhado na resposta à presença do crime organizado no Ceará. “O Estado, ao negar a existência das facções, sedimentou terreno para que as lideranças desses grupos se estabelecessem aqui. Fortaleza virou terreno fértil. Quando você nega, não cria formas de combate”, argumenta.

 

A situação não é recente, porém. O professor diz que “historicamente” a Cidade serve ao tráfico internacional, considerando principalmente o volume de droga apreendida nos limites do Estado e também no aeroporto.
Marcos, entretanto, acredita que investir em inteligência e na integração dos órgãos, como promete o centro integrado, pode ser o caminho. Ele, assim como Pires, rechaça a presença federal como interventora. “A intervenção, na verdade, é passível de muitas críticas. Em nada diminui os níveis de criminalidade. A intervenção, no plano da segurnaça, exige mudanças estruturais”, defende. “Da forma como ocorre, ela demonstra que há uma ascensão do fracasso nas duas esferas, tanto estadual quanto federal”, completa.

 

LINHA DO TEMPO


27/1 - Chacina das Cajazeiras. Homens armados atiram a esmo em rua nas Cajazeiras, em Fortaleza, e matam 14 pessoas próximo a uma casa de festas.

15/2 - Execução de líderes do PCC. Rogério Jeremias de Simone (Gegê do Mangue) e Fabiano Alves de Souza (Paca) são executados em área indígena de Aquiraz. Os dois eram líderes da facção criminosa PCC.

16/2 - Intervenção no Rio. Michel Temer (MDB) assinou decreto que estabelece intervenção federal no Rio de Janeiro. Ação ocorre após o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (MDB), pedir apoio federal para controlar a segurança do Estado. Foi a primeira vez que a prerrogativa foi usada no País.

26/2 - Ministério da Segurança. O Governo Federal cria o Ministério Extraordinário da Segurança Pública, sob comando de Raul Jungmann.

9/3 - Chacina do Benfica. Homens armados atiram em duas áreas do Benfica, em Fortaleza, e sete pessoas são mortas. Os crimes ocorreram na praça da Gentilândia e na Vila Demétrio, sede da TUF.

14/3 - Execução de Marielle. No Rio, bandidos executam a vereadora Marielle Franco (Psol). Crime foi premeditado. A parlamentar era a quinta vereadora mais bem votada do Rio e denunciava abusos policiais e milícias.

15/3 - Centro de Inteligência. Após pressão do Governo do Estado, Ceará recebe 1º centro integrado de inteligência do País, para combate ao crime organizado. Outras cinco unidades serão implantadas pelo País.

 

Rômulo Costa

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