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Paridade na política levará séculos

2017-03-08 01:30:00
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Oitenta e cinco anos depois da conquista do voto feminino no Brasil, a participação das mulheres na política cresce em ritmo tão lento que levará séculos para que se alcance a paridade de gênero em todas as esferas de poder. Embora representem 53% do eleitorado, as mulheres ocupam menos de 15% dos cargos eletivos do País. De acordo com o doutor em demografia da Escola Nacional de Ciências Estatísticas, José Eustáquio Diniz, serão necessários 687 anos para que o número de vereadoras seja igual ao de homens nas Câmaras Municipais, considerando o ritmo de 0,21% de crescimento nas últimas quatro eleições.


Na Câmara dos Deputados, dado o aumento de 0,4% de participação feminina a cada eleição, serão precisos 365 anos para que elas ocupem 50% dos assentos. No Senado, a projeção é de 146 anos se a taxa de crescimento se mantiver em 0,9% por eleição. No caso das prefeituras, seriam 143 anos. Há projetos de reforma política que poderiam reduzir esse tempo. Em um deles, as cotas não seriam de candidaturas, hoje determinadas em 30%, mas em percentual de vagas. Por exemplo, caso a legislação passasse, 20% dos assentos seriam reservados para as mulheres mais votadas e o número progrediria nas eleições seguintes, pouco a pouco. Com esse tipo de medida, já adotada em outros países, a paridade poderia ser atingida em duas décadas.


“Sem igualdade de gênero, não há sociedade justa. Por isso, defendo que o caminho para superar esse desequilíbrio passe por uma reforma política”, defende a deputada federal Luizianne Lins (PT).


Para a diretora-executiva do Instituto Patrícia Galvão, Jacira Melo, uma das maiores causas da desigualdade de gênero na política ocorre por culpa dos partidos. “O grande obstáculo para as mulheres da política são os partidos. Eles funcionam muito voltados para a lógica masculina. Ainda hoje o pensamento dominante é que politica não é lugar de mulher”, afirma.


Jacira explica que muitas mulheres são chamadas de última hora para se candidatar e recebem bem menos incentivo e financiamento em suas campanhas. Os partidos se limitam a cumprir a lei eleitoral de cotas, mas não investem nas candidatas.


Das 16 mil candidaturas fantasmas no Brasil em 2016, 14 mil eram de mulheres. Em eleições passadas, afirma, candidatas sequer eram informadas de que estavam participando do pleito. “Isso é fraude. As mulheres estão muito sem espaço. Não conseguem por conta própria construir a liderança dentro dos partidos. É um Clube do Bolinha onde eles não largam o osso e não vão mudar de postura”, diz.


De acordo com levantamento da “Folha de S. Paulo”, os recursos para candidatos homens foram 30% maiores que para mulheres nas últimas eleições municipais. Como resultado, apenas 12% das candidatas a vereadora se elegeram, apresentando queda na participação feminina em comparação a 2012.


Outro ponto que atrapalha a carreira das mulheres na política, segundo Jacira, é a dupla jornada de trabalho (dentro e fora de casa). “Conversamos com sete candidatas que disseram que o tempo de campanha foi uma loucura. Marido e filhos cobrando a presença delas em casa. Mesmo as que são eleitas contam que sofrem muita pressão da família”, destaca. O Brasil é o terceiro pior país da América Latina em termos de representação feminina na Câmara dos Deputados, de acordo com dados de 2016 da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe.


Dívida histórica

A socióloga e historiadora Dulce Pandolfi afirma que vivemos tempos de retrocesso, após fechamento de secretaria especial para mulheres e sem ministras no governo federal. “O Brasil, durante muito tempo, teve um descuido com essa questão das mulheres da politica.


É fundamental que os movimentos sociais se revigorem cada vez mais e pressionem e que isso produza impacto nas esferas governamentais. Ter um governo como agora completamente machista, não temos ministras, isso vai ter consequências futuras. A história paga um preço por isso”, lamenta. No entanto, Dulce está otimista com as mobilizações deste 8 de março no Brasil e no Exterior e avalia que esses movimentos poderão trazer benefícios políticos.


LINHA DO TEMPO

 

Da conquista do direito ao voto até os dias atuais, mulheres estiveram à frente de grandes mudanças, seja no parlamento brasileiro, seja na luta cotidiana por igualdade


1934

Primeira mulher parlamentar brasileira, Carlota Queiroz, participa da Assembleia Nacional Constituinte. Ela fica no parlamento até 1937, quando ele foi fechado. Era médica e ativista.

1985

Em Fortaleza, elegeu-se Maria Luiza Fontenele primeira prefeita de uma capital. Um ano depois, a primeira deputada federal cearense, Moema São Thiago, contribuiu para Constituição de 1988.

 

1994

No Maranhão, a filha de José Sarney, Roseana Sarney, foi a primeira mulher a governar um Estado e teve quatro mandatos. Ela anunciou que abandonaria a vida pública em 2014.

 

2000

A ex-ministra do Supremo Tribunal Federal Ellen Gracie, nomeada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foi a primeira a ocupar vaga na Corte, em 2000, e a presidi-la em 2006.

 

2010

A petista Dilma Vana Rousseff foi eleita primeira presidente do Brasil, com 56% dos votos válidos, e reeleita em 2014. Ela teve de deixar o cargo após processo de impeachment em agosto de 2016.

 

Isabel Filgueiras

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