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Viver sem filtro?
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Viver sem filtro?

Na contracultura da vida perfeita, famosas nacionais e influenciadoras locais desconstroem e questionam os padrões da perfeição impostos pela cultura do "instagramável"
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Criadora do perfil Nutri Desconstruída, cearense Pabyle Flauzino dá voz a posts sobre aceitação e levanta debate sobre padrões de perfeição. Seu conteúdo tem repercussão em todo o Brasil
 (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Criadora do perfil Nutri Desconstruída, cearense Pabyle Flauzino dá voz a posts sobre aceitação e levanta debate sobre padrões de perfeição. Seu conteúdo tem repercussão em todo o Brasil

Seja entre um expediente e outro, no trânsito, num bar com os amigos ou nas horas de tédio, as redes sociais servem de companhia. Durante as 24 horas do dia, os usuários estão compartilhando e absorvendo experiências. São idas matinais à academia, dia de shopping, viagens incríveis, jantares. Por lá, a vida está sempre bem, certo? Errado!

O Instagram foi apontado, no último mês, como o aplicativo mais prejudicial à saúde mental e responsável por aumentar o índice de distúrbios de autoimagem, ocasionados pela busca da vida perfeita idealizada nas redes. O dado é fruto de levantamento da instituição de saúde pública do Reino Unido, a Royal Society for Public Health, publicada no Brasil pela Super Interessante.

A prática de vender uma vida perfeita e de ser influenciada pela mesma vem se aprofundando desde o início das redes, ainda no Orkut. E encontra seu apogeu agora no Instagram. O formato plástico impositivo, que parecia ser um cenário sem alternativas, de uns tempos para cá vem sendo posto em questão. Um exemplo disso é a publicação feita pela apresentadora Rafa Brites nas últimas semanas. A gaúcha sempre mostrou sua forma física em posts. Inclusive, após o nascimento do seu filho Rocco, hoje com cerca de três anos. A primeira capa de revista que ela estampou foi a Boa Forma, onde apresentava a barriga definida pouco tempo após o parto. Rafa agora desabafou: "Queria pedir desculpas se em algum momento alguma postagem minha fez você questionar a sua relação com o seu corpo de uma maneira ruim. Terei mais responsabilidade sobre esse tipo de postagem", escreveu em legenda de uma publicação onde surgia com 10kg a menos, em 2011. Ela também explica que sua forma física é resultado da genética e não das poucas vezes que vai à academia e compartilha com os seguidores. Em outros vídeos, a apresentadora pede perdão aos fãs pela imagem que chegou a passar nos últimos anos. Seu foco agora é falar da maternidade real, dos desafios de se dividir entre o filho, o trabalho, o casamento e outras áreas da vida.

Há poucos dias, Samara Felippo escolheu uma sequência de fotos em preto e branco (que ilustra nossa capa), na beira da piscina, de biquíni, para passar a seguinte mensagem: "Enquanto vocês se odiarem e se importarem com os olhares e opiniões alheios, nunca irão saber como é gostoso ir à praia feliz de biquíni". A atriz tem apresentado uma postura diferente da Samara que surgia nas telas da Globo há dez anos. Seu discurso hoje é claro: lutar pela causa feminista e viver sem filtros.

Os exemplos, ainda que relacionados à forma física, mostram um cenário no mundo digital onde o real começa a ser valorizado - sem maquiagem. E não só no mundo das celebridades. Em Fortaleza, perfis de apoio à quebra da vida perfeita vem conquistando admiradores.

Pabyle Flauzino, responsável pelo Instagram Nutri Desconstruída, tem uma única missão: falar sobre a vida como ela é. A ideia é incentivar a eliminar tudo aquilo que afasta a essência real de cada pessoa. "A parte mais difícil de mostrar uma vida de verdade é sair da caixinha. Porque, quando você está nela, é tudo mais fácil, as pessoas te aceitam melhor. Quando decide sair, vem um bombardeio de críticas. Mas vale a pena", explica a cearense.

Pabyle também acredita que o caminho que a rede social está tomando faz parte de um movimento. "As pessoas não aguentam mais essa coisa de vida perfeita. Porque essa vida não existe e cansa. E as pessoas estão cansando. Por isso é que perfis que caminham contra isso estão fazendo sucesso", conta. Ainda que as expectativas sejam boas, a influenciadora ainda sente o peso de muitas pessoas resistentes a essa mudança nas redes. "Eu recebo críticas no meu Instagram quando falo sobre o que é de verdade, são poucas, mas recebo. Tenho muita esperança que isso vá mudar", conclui.

Abraçando o mesmo discurso, Mariana Marques vem de um caminho longo na produção de conteúdo para Internet, somando 17 anos. Ela já teve blog de beleza, de literatura e de dicas para uma vida saudável. Fazendo uma leitura dessa trajetória, ela explica estar cansada da "lacração" exposta por perfis diariamente.

"Isso de lacrar é uma coisa que tem feito eu me questionar muito. Na vida real não tem lacre. Tem ônibus, a gasolina é cara. Então eu olho e penso: minha semana acabou, eu não lacrei e todas as pessoas que eu olho lacraram. Só que, na verdade, essa pessoa é como você e se esforça para ser feliz. Mas o que ela escolhe mostrar são outras coisas. Então todo mundo mostra o lado bom. Isso está adoecendo a gente cada vez mais", explica a idealizadora da feira Auê.

Mariana também comenta sobre o avanço do Instagram em criar meios para que pessoas com depressão e ansiedade possam pedir ajuda para a o aplicativo. "As pessoas usam a hashtag suicídio, por exemplo, e o Instagram manda mensagem para ele perguntando se está tudo bem. Também agora dá para controlar o tempo que se passa na rede social. Isso é porque eles entendem que isso precisa de mudança porque as pessoas estão ficando doentes", pontua.

O despertar das influenciadoras para uma vida sem perfeição no mundo digital não é unanimidade, mas aponta um novo horizonte de mais leveza e liberdade. E você, topa sair da caixinha?

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