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Unir passado e presente na educação de filhos
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Unir passado e presente na educação de filhos

| EDUCAÇÃO | Para o psicólogo Rossandro Klinjey, o medo e a dificuldade de pais de impor limites aos filhos têm criado uma geração frágil que não sabe lidar com frustrações
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Com média de 22 cidades visitadas no Brasil e no exterior a cada mês, o psicólogo Rossandro Klinjey ficou famoso na internet após criar vídeos que tratam das relações interpessoais. Questionado sobre os temas de maior apelo nas redes sociais que acumulam milhares de seguidores, ele solta sem pensar: o perdão e a educação de filhos. Atualmente, no canal do youtube, são quase 70 mil inscritos e mais de um milhão de visualizações.
 

Sobre educação dos filhos, ele entende que é preciso unir o que deu certo na educação do passado - disciplina, ordem e respeito - com as evoluções do presente que, segundo ele, são diálogo e respeito à mulher. Rossandro, que também é escritor, mestre em Saúde Coletiva e doutor em Psicanálise, ressalta que a culpa têm incapacitado pais e mães de estabelecerem limites para os filhos.
 

Múltiplo como a própria essência da psicologia, ele afirma que também vem da família esse interesse por temas gerais. Natural da Paraíba e com sotaque carregado, ele conta em entrevista antes de mais uma de suas palestra, desta vez em Fortaleza, que a vivência no Nordeste o ensinou principalmente a não subestimar a capacidade de ninguém.

O POVO - A que o senhor atribui tanta adesão ao seu trabalho nas redes sociais?


Rossandro Klinjey - Na verdade, eu meio que ainda tô meio tentando entender o que aconteceu e está acontecendo, está entrando em média 3 mil pessoa por dia para me seguir nas redes sociais. Eu percebo que as pessoas sentem que esses vídeos que eu publico as ajudam de algum modo. Eu percebo que (Leandro ) Karnal, (Luiz Felipe) Pondé, Clóvis de Barros (Filho), uns seis professores que estão sendo muito vistos na internet e isso pra mim é um sinal de um País em mudança. Quando o professor vira um influenciador na internet é porque o Brasil está mudando. As pessoas estão procurando também algo que contribui com a vida delas, da visão de mundo que elas têm Acho que isso é uma coisa nova e bem vinda. Você imagina que para que eu acontecesse no passado eu precisaria morar no eixo Rio-São Paulo, e eu moro no interior da Paraíba. Eu simplesmente peguei um telefone, coloquei em uma mesa, num consultório, e comecei a falar sobre coisas que eu via que os pacientes tinham vivenciado. E achei que outras pessoas, que não têm acesso à terapia, poderiam saber daquelas coisas e do que a psicologia oferece como solução para a vida. No fundo, no fundo, é uma coisa que só é possível por causa da internet.
 

Preconceito
 

OP - Houve alguma resistência por ser do Nordeste?

Rossandro Klinjey - Eu senti preconceito no começo, houve quem propusesse que eu tinha que zerar o sotaque, tinha gente que quando ia me apresentar nos eventos evitava dizer de onde eu vinha. Esperavam que eu fosse mais baixo, que eu fosse moreno, é uma coisa bem estereotipada. Mas de um modo geral, hoje em dia, o meu sotaque é uma coisa que as pessoas gostam. Eu apenas tenho cuidado para não falar certos regionalismo que não são compreensíveis em outros estados. Um dia eu estava no programa da Fátima Bernardes e eu falei “lezeira” e ninguém entendeu. Ser nordestino tem uma vantagem, nós somos de um lugar de onde as pessoas acham que não somos capazes e nós somos muito capazes. E a vantagem de estar nesse lugar é que, como a gente sabe que é bom, a gente não subestima ninguém em lugar nenhum do mundo. Então se eu estou falando em Nova York, se eu estou falando em São Paulo, ou num município de três mil habitantes no norte do Brasil, eu falo com a mesma competência e procuro dar o meu melhor.
 

OP - Outra linha profissional que também têm chegado bastante nas redes sociais são os coachings.
 

Rossandro Klinjey - Eu vejo, de vez em quando, que tem um modismo de panaceia, é aquela ideia de que uma coisa resolve tudo. O coaching é um instrumento muito interessante, eu fiz a formação para conhecer o coaching, mas ele não é panaceia que resolve tudo. A gente tem aí uma técnica que é muito útil, que ajuda muita gente. O que vai fazer um bom coaching não é nem a formação, é a pessoa ter uma competência técnica muito boa e ter uma disposição emocional para de fato querer ajudar, e não vender um peixe falso. Há uma questão de que muita gente não conseguiu nenhum tipo de formação acadêmica e pelo menos quer algum tipo de título. Tem alguns cursos que você faz em um fim de semana e já diz que é coaching. Eu vejo uma massificação que está fazendo perder o sentido, está ficando vulgar. Quando vai estudar o coaching, você percebe que é um conjunto de técnicas da psicologia positiva aplicadas num final de semana num curso que você se sentiu super bem e a pessoa acha que está tudo resolvido. Mas 15 dias depois daquela injeção de redbull psicológico, você vai começar a voltar para seus ritmos, seus traumas, seus processos inconscientes de sabotagem e isso não é resolvido num festival de frases positivas e imagens e músicas num grupo dançando num hotel. Eu não estou falando pessoalmente para ninguém, eu vejo que é uma coisa que muitas pessoas fazem e que nem sempre se vende uma coisa que se dá o resultado a que se propõe.
 

Terapia
 

OP - E por que o que o senhor faz é diferente?

Rossandro Klinjey - Eu não me apresento como o coaching na internet, eu me apresento como psicólogo. Uma vez que isso é instalado, a pessoa tem que procurar, da melhor maneira possível, uma forma de viver a vida melhor, seja em si mesmo, seja num processo terapêutico, seja numa busca de sua própria religião. Eu acredito que o que eu faço é muito mais provocar do que me propor a fazer algo que no fundo quem tem que fazer é você. Mesmo numa terapia, nós manejamos técnicas mas, no fundo, depois que fecha a porta do consultório, quem vai para a vida resolver é o paciente, eu não vou lá com ele e decido por ele. É uma provocação para capacidade pessoal de resolver a própria vida. 


OP
- Como aprofundar uma discussão numa plataforma rápida como a internet?
 

Rossandro Klinjey - Eu faço um vídeo de quatro minutos e tento depois fazer textos e livros para que as pessoas busquem mais. Eu não posso fazer uma discussão densa num vídeo curto, mas eu faço paodcasts longos , tenho um quadro chamado “Eita, Vida” agora em que faço umas entrevistas com pessoas interessantes que eu encontro nas viagens. Eu acho que isso é uma forma de contribuir levando o cidadão comum, anônimo, herói do cotidiano para que estimule outras pessoas.
 

OP - A educação de filhos é um dos temas muito abordado em seus vídeos. Qual a sua proposta?
 

Rossandro Klinjey - Eu chamo na verdade não é nem para uma retomada da família anterior, mas uma retomada do que na família anterior deu certo.
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OP - E o que deu certo?
 

Rossandro Klinjey - Funcionou a disciplina, a ordem e respeito. Não funcionou desrespeito à mulher, o pouco diálogo entre pais e filhos e a opressão. Isso teve que mudar. O problema é que quando mudou,mudou levando junto respeito, ordem e disciplina. Nós temos que pegar o que havia de melhor na família anterior e trazer o que tem de bom na família atual. Quando junta os dois modelos você tem o melhor para as crianças.
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OP - Qual a maior lacuna nesse atual modelo de criação?
 

Rossandro Klinjey - A permissividade, os pais tem a incapacidade de limitar e disciplinar os filhos, eles se sentem culpados em trabalhar e acham que têm de comprar o afeto dos filhos. Coisa que os pais do passado não tinham, muito pelo contrário, tinham orgulho de botar o pão em casa. Quando eu não me frustro, eu não me torno um adulto capaz de enfrentar um fim de relacionamento, conflitos, não conseguir emprego, não passar num vestibular… A gente tem que ser capaz de suportar as agressões que o mundo tem, não que elas não devam ser observadas com cuidado, mas essa fragilização tem sido um problema. Houve um caso no Brasil de um aluno que sofria bulling e disparou contra os colegas de sala. O bulling é algo muito sério mas eu não posso dizer que toda vez que uma pessoa me agride na escola eu estou autorizado a matá-la. Além disso, o índice de suicídio tem crescido no mundo todo. Então, que tipo de geração é essa que está sendo criada de forma tão frágil que diante das frustrações da vida prefere matar ou morrer?
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Internet
 

OP - Essas crianças lidam também com público maior na internet, um fluxo maior de informação. Qual é esse impacto na formação?

Rossandro Klinjey - As redes sociais de um modo geral, como qualquer coisa na vida, demandam um equilíbrio.Há desequilíbrio porque os pais muitas vezes preferem soltar um smartphone ou um tablet com a criança ou o adolescente. Mas esse menino não está brincando inocentemente, ele está interagindo com plataformas, pessoas, ideias, personagens e redes sociais que vão levar valores que às vezes vão completamente em desacordo com os que você quer levar para sua família. Se não prestar atenção nisso você está deixando essa pessoa vulnerável. Eu nem posso afastar meu filho desse mundo atual, nem posso deixar ele completamente imerso. O papel do adulto é fazer um recorte dessa realidade dizendo o que pode e o que não pode. Na medida em que as crianças e os adolescentes vão crescendo, eu vou dando para ele a capacidade de fazer escolhas, mas eu tenho que fazer primeiro.
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OP - Há receita pronta para isso? Qual o limite de tempo, por exemplo?
 

Rossandro Klinjey - O bom senso é uma coisa que as pessoas precisam usar mais, quando não existe receita não quer dizer que eu não tenho nada a fazer, quer dizer que não tem um padrão para aplicar em todas as famílias. Cada família tem que perceber as reações de um filho e perceber o que está precisando naquele momento. Antes de chegar em um diagnóstico precoce de déficit de atenção, hiperatividade, é perceber o que está acontecendo. Se tem um celular que fica cinco horas na frente dele, antes de dizer que tem pânico, angústia ou hiperatividade, é perceber que tem um elemento atrapalhando.
 

OP - O contra-argumento dessa dificuldade de impor o não diretamente é a relação de diálogo e respeito às ideias das crianças.
 

Rossandro Klinjey - Escutar filho não é obedecer filho, escutar filho é perceber o que ele pensa e sente em relação à vida, e, quando ele diz isso, eu não tenho que aceitar imediatamente. Como adulto, eu preciso fazer um filtro. Quando ele diz algo, o ideal é avaliar as evidências, que às vezes são um monte de elementos que não têm sentido, que é uma visão distorcida infantil. Aí você vai lá a esclarece. Agora, ficar com medo, temendo, cedendo, querendo que o menino ame, isso é uma coisa que compromete profundamente. Tem que ter cuidado para ele não te convencer sempre que você está errado, porque a escolha e o corte da realidade tem que ser feito pelo adulto. E a criança ou o adolescente, depois que amadurece, é que pode fazer o próprio recorte.
 

OP - Nesse sentido, o papel da escola está mais desafiador?
 

Rossandro Klinjey - Os professores estão em desespero, eles têm por um lado um currículo extenso demais no Brasil, que exige muito mais decorar que aprender o conhecimento - e é uma decisão de cima para baixo. Por outro lado, têm pais que não colaboram, e quando o professor tenta dar o limite que a mãe e o pai não colocam, em vez de agradecerem, eles vão lá humilhar o professor. Hoje, você vê que uma das profissões que mais geram doenças no trabalho é professor, educador. Se eu não sou um pai que me faz respeitar, se meus filhos não me respeitam, como processo natural de transferência psicológica disso, eu não vou respeitar quem vem depois. E se eu não respeito meus professores, eu não vou respeitar o que eles oferecem para mim, que é a educação. Temos aí então a receita do caos e da catástrofe para qualquer família.


OP - O senhor também tem mestrado em saúde coletiva. Atualmente, há um aumento das psicopatologias de forma mais generalizada, depressão, ansiedade... E a gente vê pouquíssimas políticas públicas preventivas dessas doenças. Há um caminho?
 

Rossandro Klinjey - Temos muito a avançar. As iniciativas são pontuais. Mais por ONGs que fazem terapia comunitária, que é uma terapia muito fantástica. Ou instituições que fazem isso de forma informal mas muito funcional, como o AA (Alcoólicos Anônimos) ou o CVV (Centro de Valorização da Vida). Existe um conjunto de instituições que têm usado elementos da psicologia para ajudar as pessoas e, obviamente, que a gente poderia ter isso de forma mais maciça. A gente poderia ter terapia de grupo nos bairros junto aos PSFs (Programa Saúde da Família), acolhimento de mães que têm filhos dependentes, mulheres grávidas... A gente poderia trabalhar por grupo do mesmo jeito que tem o dia do diabético e do hipertenso, a gente também deveria ter um dia para as pessoas que vivem um drama emocional específico, isso seria muito rico.

 

Palestra


ROSSANDRO KLINJEY
ministrou palestra, última sexta-feira, 6, no evento Vidas Preservadas - O MP e a sociedade pela prevenção do suicídio, no Ministério Público do Ceará. Em novembro, ele participou do Congresso Estadual dos Fazendários do Ceará.   

 

Perfil


ELE É PSICÓLOGO
clínico e autor de quatro livros: Temas complexos: uma abordagem didática, As 5 Faces do Perdão, O Tempo do Autoencontro e Autoperdão - O Aprendizado Necessário e o mais recente Help! Me eduque. Ele está presente nas redes sociais: facebook.com/rossandro.klinjey; instagram.com/rossandroklinjey/
e youtube.com/rossandroklinjey   

 

 

YouTube


ENTRE SEUS VÍDEOS
mais vistos no YouTube, destaque para o que fala sobre “quando os filhos precisam entender que a casa não é deles” (Seu filho e os monstros), com mais de 180 mil visualizações. São quase sete minutos de vídeo sobre respeito e educação dos filhos gravado durante uma palestra.  

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