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A tragédia dos homicídios no Ceará
Opinião

A tragédia dos homicídios no Ceará

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Luiz Fábio Paiva
Sociólogo, professor e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da UFC.  (Foto: Luiz Fábio Paiva)
Foto: Luiz Fábio Paiva Luiz Fábio Paiva Sociólogo, professor e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da UFC.

A cada relatório sobre a violência e o crime, no Brasil, a sociedade cearense é confrontada com seus indicadores de homicídio. Os resultados ferem a sensibilidade de uma população que, talvez, só pense no assunto quando o número de mortos é somado e retratado em relatórios de pesquisa.

O mais novo capítulo dessa história é o Atlas da Violência de 2019. O relatório trabalha com os dados consolidados de 2017 e apresenta o Ceará com uma taxa de 60,2 homicídios por cem mil habitantes.

Quando essa taxa considera apenas a população de faixa etária entre 15 a 29 anos há o incrível número de 140,2 homicídios por cem mil habitantes. Em sua grande maioria, são meninos e meninas pobres e pretas que compõem esses números.

A diferença racial existente no Brasil, tratada como inexistente por grupos reacionários, é evidente em números que são enfáticos em revelar o racismo que constitui a sociedade brasileira e, também, o Ceará.

Mulheres negras morrem mais, homens negros morrem mais. Isto não é resultado do acaso, mas de ações e políticas racistas que matam e deixam morrer sempre as mesmas pessoas. São pobres, pretos e pretas que, ao serem encontrados mortos, precisam primeiro passar pelo crivo do racismo, do preconceito e da suspeita de serem criminosos.

Qualquer suspeita de envolvimento em práticas desviantes é suficiente para desmobilizar investigações e procedimentos para busca do autor do crime. Isto significa que alguém que matou permanecerá impune, acreditando que pode resolver seus conflitos por meio de ações violentas.

Pessoas que matam, também, se tornam vítimas e a não interferência do Estado provoca a reprodução de ciclos intermináveis de vingança. Desta maneira, pessoas pobres e pretas seguem morrendo sem que as suas mortes causem qualquer comoção e sensibilizem a sociedade para mudanças estruturais.

Infelizmente, o atual governo do estado do Ceará adotou a violência como meio de controle social, deixando morrer centenas de pessoas em confrontos que poderiam ser evitados se o trabalho das forças de segurança tivesse foco na proteção social da população pobre e negra.

Mudar essa realidade começa por tratar as pessoas que estão morrendo com dignidade e respeito, negando a normalidade de suas mortes e lutando contra o racismo instituído nas políticas e ações de segurança pública. 

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