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Do tempo da estupidez
Opinião

Do tempo da estupidez

Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Rosemberg Cariry 
Cineasta e escritor
 (Foto: Evilázio Bezerra)
Foto: Evilázio Bezerra Rosemberg Cariry Cineasta e escritor

Sim, temos uma sombra que comanda o destino da nação com severa inclinação necrófila. Mas isso não seria possível sem o apoio de uma classe dominante atrasada e mentalmente doente (em sua desmedida estupidez), sem a ambição de importantes setores da classe média e a submissão de um povo castigado por séculos de escravidão. Nos ares sombrios de hoje, surgem os heróis de pés de barro, urdidos nas teias frágeis dos simulacros, acendendo no inconsciente das massas as incontroláveis pulsões de morte.

Conta-se que, na Universidade de Salamanca, em outubro de 1936, o general fascista Millán-Astray, um mutilado de guerra, apoiou os gritos da plateia que gritava "Viva la muerte". Indignado, o pensador Miguel de Unamuno respondeu: "Acabo de ouvir o necrófilo e insensato grito de "Viva la muerte!". Isto me parece o mesmo que "Muerte a la Vida". Dizem os registros que, nesse momento, o general Millán-Astray exclamou cheio de ira: ¡Muera la intelectualidad traidora! ¡Muera la inteligencia! Viva la muerte!.

O mesmo clima se repete no Brasil de agora com neofascistas e neopentecostais fazendo ataques violentos aos maiores e mais consagrados artistas e intelectuais. Irrompem em fúria contra as universidades e centros culturais. É preciso lembrar: um aleijado moral sempre quer reduzir o mundo à sua imagem e semelhança, feito um deus psicótico. Incapaz de criar e construir, a tudo passa a destruir. Onde há uma réstia de luz, ele tampa com a sombra, o ressentimento e o ódio da sua alma.

A intolerância posta em prática hoje no Brasil desafia leis constitucionais e vernizes civilizatórios. Querem o aniquilamento completo do Estado e que todos os bens da nação sejam repassados para a "iniciativa privada" e para os bancos. Pode haver corrupção maior do que essa? Entregar os bens e os serviços essenciais de uma nação à iniciativa privada é dar um atestado de barbárie, cujo melhor exemplo é a Vale do Rio Doce e seu descaso pela vida.

Nesse tempo sombrio, o medo tornou-se moeda forte. E a morte, sem nenhum futuro, estende as suas asas sombrias sobre a nação que se desfaz. n

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