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A obscenidade de ser livre
Opinião

A obscenidade de ser livre

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Juliana Diniz
Doutora em Direito e professora da UFC participa do evento (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Juliana Diniz Doutora em Direito e professora da UFC participa do evento

Começo este sábado participando de um evento promovido pelo O POVO na programação do Bazar dos Livros da Editora Dummar. Quando recebi o convite para ministrar um curso sobre feminismo e literatura, imaginei que seria mais uma ótima oportunidade para conversar com algumas pessoas sobre letras e questões que tocam as mulheres. A resposta do público foi um lampejo de otimismo: uma procura surpreendente mostrou que não só dezenas, mas centenas se motivaram a ouvir sobre Virginia Woolf, Simone de Beauvoir e Hilda Hilst. O que essa procura entusiasmada pela palavra pode significar em tempos de ataques governamentais à cultura, à educação e à liberdade de pensamento?

Gostaria de traçar uma resposta na companhia das autoras cuja escrita escolhi explorar no curso. Virgínia Woolf, uma inglesa nascida em 1882, cresceu nos círculos da aristocracia intelectual da sociedade vitoriana. Filha de escritor, Woolf amargou por toda vida a frustração por não ter podido acessar o ensino superior - o pai optou por formar seus irmãos homens, como era esperado para a época. Coube à jovem Virgínia, moça de intelecto potente e humores frágeis, dedicar-se à arte reservada pela história à mulher, uma arte "barata", boa de ser produzida na sala de estar: a literatura.

Seu ressentimento com o patriarcalismo vitoriano transformou-se em militância feminista: além de ficção, Woolf também publicou ensaios literários sobre a condição feminina. "Um teto todo seu" e "Três guinéus" são livros onde a escritora delineia o quão terrível pode ser para as mulheres a clausura no espaço doméstico, a restrição do acesso à educação, a impossibilidade de dedicar-se às atividades produtivas que lhes permitirão um sustento e, assim, autonomia.

Os passos de Woolf serão transformados em projeto filosófico com a contribuição de Beauvoir, que incendiou a consciência das mulheres, transformando-a em força política. Para Woolf, a mulher só poderá expressar os dilemas de sua condição se for capaz de inaugurar, por uma escrita subversiva, uma língua obscena. É o que nos oferece Hilda Hilst, cuja obra expressa o desejo flamejante de questionar os limites, pondo fim às expectativas estabelecidas. É, afinal, esse desejo apaixonado pela subversão de um destino social pré-estabelecido que motiva uma mulher livre a se engajar na busca pela obscena e libertadora palavra. 

 

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