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O enigma da Política
Opinião

O enigma da Política

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Tipo Notícia Por
Valmir Lopes 
Cientista político e professor da UFC
 (Foto: Valmir Lopes )
Foto: Valmir Lopes Valmir Lopes Cientista político e professor da UFC

As dimensões socioculturais, econômicas, políticas e comportamentais da sociedade brasileira nunca formaram uma unidade lógica coerente. Vem daí as dificuldades de construir uma imagem única sobre quem somos nós - como povo.

Sem tematizar as causas da ausência de unidade lógica, lembro apenas que os autores intérpretes do Brasil sempre foram parciais em suas análises porque tomaram aspectos, transformando-os em totalidades. Assim, entendeu-se a oposição "Casa Grande & Senzala" como uma metáfora da ordem pública e ordem privada; ordem dominante e dominados. Gilberto Freyre não está isolado e nunca cogitou uma teoria sobre a organização política brasileira, deixando que seus leitores a deduzissem das derivações socioculturais. O mesmo encontramos em Sérgio Buarque de Holanda do "Raízes do Brasil" quando em algumas passagens fala de patrimonialista e os impasses para a criação de uma ordem nacional moderna. Deixo de lado Caio Prado Jr. com seu determinismo econômico - a política é reflexo inconsciente de cegas lutas entre forças econômicas -, porque quanto à ordem política pouco acrescentou ao fato de sermos dominados por uma pequena elite de poder.

Certo é a inexistência de uma teoria política da formação do Estado brasileiro que levasse em consideração nossa singularidade sociocultural. Talvez porque se teria que aceitar as consequências lógicas do pensamento de Oliveira Vianna: nossa formação sociopolítica não criou as condições para instituições democráticas. Entre os agentes políticos ativos na sociedade brasileira, somente o Estado - dirigido de forma técnica - tem as condições objetivas para realizar a modernização e democratização da sociedade.

Se no passado (?) predominou a cultural política patrimonialista, patriarcal, contudo criadora de uma nação mestiça e marcada pela cordialidade, o sistema político foi visto como adaptado a essa ordem sociocultural. A leitura liberal de nossa formação histórica nunca aceitou bem essa derivação adaptativa. A política deveria ser travada no campo das ideias para construir instituições modernas distantes de nossas raízes atrasadas. Os engenheiros de instituições propuseram mil projetos de transformação e recriação de um País novo, quase sempre desconhecendo o modo próprio do agir do brasileiro.

Inspirado na distinção feita pelo cientista político Arend Lijphart entre democracia majoritária e democracia consensual, Sérgio Abranches retomou o debate sobre a natureza das instituições políticas brasileira e criou o termo presidencialismo de coalizão. A democracia majoritária existe nos países de baixo pluralismo, enquanto a segunda predomina em nações heterogêneas e forte pluralismo sociocultural. No caso brasileiro, a herança política plasmou as instituições: presidencialismo, federalismo, bicameralismo, multipartidarismo e representação proporcional. De maneira singular, somos o único país que conjuga: presidencialismo, eleição proporcional e multipartidarismo. Enfim, somos uma sociedade de predominância política da gramática consensual e heterogênea. Quais consequências dessa ideia para o destino do atual governo? 

 

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