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O berço dos conservadores
Opinião

O berço dos conservadores

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Juliana Diniz
Doutora em Direito e professora da UFC participa do evento (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Juliana Diniz Doutora em Direito e professora da UFC participa do evento

Tornou-se um lugar comum afirmar que Olavo de Carvalho é o pensador do conservadorismo brasileiro da atualidade. Suas ideias teriam sido eloquentes o suficiente para eleger um presidente. Dedicados professores vêm demonstrando, com a paciência dos santos, as imposturas intelectuais do guru: pouco sobra de rigor teórico no discurso do ideólogo do bolsonarismo.

A popularidade de Olavo de Carvalho pode ter sido útil para uma estratégia de marketing eleitoral, mas não é potente o bastante para orientar transformações profundas no pensamento dominante na sociedade. As instituições, assim como os agentes e as práticas que as compõem, são orientadas por um ideário complexo, fundado numa concepção sobre o poder que leva muito tempo para maturação e disseminação. Por isso, se a sociedade brasileira mostrou-se tão conservadora, isso se deve a outras causas que não a performance extravagante do famigerado Olavo. Uma das razões para o nosso conservadorismo está assentada secularmente em outro espaço, de indiscutível prestígio e poder simbólico: as escolas de Direito.

No livro 'A construção da ordem', o historiador José Murilo de Carvalho investigou a formação colonial do Brasil, a fim de descobrir como uma imensidão de território manteve sua unidade administrativa e construiu um governo civil estável. Segundo o autor, o Brasil vem sendo dirigido há séculos por uma elite jurídica formada por escolas que garantem homogeneidade de práticas de poder e grande capacidade de preservação de uma visão de mundo tradicionalista. Foi o caso da Faculdade de Coimbra até meados do século XIX, e, a partir de 1827, dos cursos superiores de Direito implantados em São Paulo e em Olinda.

As mentes com capacidade de influenciar os rumos da política nacional são educadas em disputados (e exclusivos) bancos como os da escola paulista de Direito. Serão os juízes, os deputados, os procuradores de amanhã. Durante os anos de faculdade, aprendem uma técnica jurídica muitas vezes indiferente à realidade, alheia às assimetrias e perversidades de um País desigual desde a sua origem: essa técnica, não raro, legitima a exclusão sob o argumento do respeito à legalidade. Esses conservadores não se inspiram no discurso alucinado dos agitadores de ocasião, mas em secular cultura jurídica, que somente uma educação crítica e renovada será capaz de transformar. n

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