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Editorial. Migração: marcha à ré e desumanização
Opinião

Editorial. Migração: marcha à ré e desumanização

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Tipo Notícia
A decisão tomada pelo governo Jair Bolsonaro de retirar a assinatura do Brasil do Pacto Global da ONU para Migração Segura, Ordenada e Regular - que havia sido firmado pelo governo Michel Temer, em 10 de dezembro passado, foi criticada nos meios diplomáticos internacionais, atingindo em cheio a imagem do Brasil, nação de histórico invejável em favor das causas humanitárias e do multilateralismo. O argumento de que a recusa atende à necessidade de defender a soberania nacional é negado pelo próprio documento aprovado, ao ressaltar seu caráter não-vinculativo.

 

Aliás, os primeiros passos e gestões da chancelaria brasileira contradizem esse argumento: basta lembrar da ideia, já refutada, de instalar uma base militar norte-americana no Brasil; ou o contrato polêmico da venda da Embraer para a Boeing (como reconheceu o próprio presidente Bolsonaro); ou a privatização da Eletrobrás e outras iniciativas de vendas de estatais.

 

O Pacto da Migração ou Pacto de Marrakesh foi aprovado por 160 nações que fazem parte da ONU, e tem o objetivo de dar racionalidade e equidade a um dos problemas mais agudos da realidade contemporânea: a migração. Vai beneficiar, inclusive, os brasileiros que foram buscar uma oportunidade de vida no Exterior (eles são mais numerosos do que os migrantes importados pelo Brasil). A migração envolve cerca de 258 milhões de pessoas, ou 3,4% da população mundial. Muitos fogem do impacto climático ou do caos econômico. Há também os refugiados que fogem das guerras. Incontáveis são os que perdem a vida nesse afã, a ponto de levar o papa Francisco a apelar para à consciência das nações em busca de uma resposta humana para esse drama.

 

Nenhum Estado tem condições de resolver, sozinho, o problema, daí a necessidade de uma articulação mundial. O Pacto de Migração atende a isso, detalhando 23 objetivos. Dentre eles, "minimizar os fatores adversos e estruturais que obrigam as pessoas a abandonar seu país de origem", "salvar vidas", "reforçar a resposta transnacional ao tráfico ilícito de migrantes", "utilizar a detenção de migrantes só como último recurso", e "proporcionar aos migrantes acesso a serviços básicos".

 

Na assinatura do acordo, ainda no governo anterior, o comitê brasileiro justificou seu voto favorável: "O Brasil foi formado por migrantes. 

 

Congratulamo-nos com milhões de pessoas da Europa, Oriente Médio, Ásia e América Latina. Nós recebemos hoje sírios, haitianos, venezuelanos, congoleses e imigrantes de tantos outros países e regiões". Recuar, agora, dando dito por não dito, como fez a atual chancelaria brasileira, é um retrocesso que mancha a imagem histórica do Brasil. n

 

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