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Prevejo dias sombrios
Opinião

Prevejo dias sombrios

Edição Impressa
Tipo Notícia

Prevejo dias sombrios até o final das eleições e nos meses seguintes; pergunto-me o que nos trouxe até semelhante impasse político. Uma resposta pelo menos verossímil somente pode ser buscada, em uma sociedade politicamente organizada, no escrutar das instituições que moldam o agir político. É que indivíduos não agem uns sobre os outros diretamente, mas por meio de instituições que orientam e cercam suas ações; boas instituições produzem boa política; instituições inadequadas resultam em tensões, desmandos, desespero e extremismos fundamentalistas e fascistas. Antecipo o acirramento dos extremismos com a chegada ao segundo turno de Jair Bolsonaro e Fernando Haddad, amarrado o eleitor numa verdadeira sinuca de bico apta a desencadear vultosos processos de cólera nos defensores de cada candidato.

 

Nossas instituições democráticas deixaram de produzir os frutos que de uma democracia sã se espera, a saber, uma diminuição progressiva das desigualdades sociais de todas as espécies, econômicas, sociais e culturais, provocando, em vez, o acirramento dos interesses de classes. Com efeito, de uma democracia embalada por instituições certeiras, espera-se uma constate melhora da condição social de seus membros, nas palavras de Tocqueville; espera-se progressos sociais, nas de Bernstein.

 

Ocorre que nosso possível avanço republicano é bloqueado por quatro institutos principais: o presidencialismo de coalizão ou de cooptação, a multiplicação de partidos políticos ocos, o baixíssimo grau de renovação da classe política e uma difusa, mas consistente, cultura política popular personalista, clientelista e messiânica. O presidencialismo de coalização obriga a alianças oportunistas, de balcão, sempre frágeis e não raramente corruptas, impedindo uma boa governança; esse presidencialismo manco foi substituído nos governos petistas por um presidencialismo de cooptação, que levou ao aparelhamento do estado e ao silêncio de movimentos sociais reivindicatórios e das análises acadêmicas críticas, tornando dispensáveis e até indesejáveis reformas profundas.

 

Nossos partidos são ocos, vazios de representação dos interesses da sociedade civil e de correligionários realmente engajados, bastando ver a solidão dos candidatos à Presidência, à exceção do petista. Sem consistência programática, enlameados na corrupção, nossos partidos se desmancham após as eleições constituindo bancadas de interesses corporativos. A falta de renovação tanto no Poder Executivo quanto no Legislativo leva à repetição da mesmice política. Lula seria candidato pela 6ª vez; Ciro e Marina; pela 3ª; Alckmin, pela segunda vez, vindo de longos mandatos estaduais, como o Haddad, que foi prefeito. Os partidos são movidos a personalismos familiares, cujos membros pulam de galho em galho nas árvores dos cargos e dos poderes.

 

Somando a isso tudo uma cultura política messiânica generalizada num eleitorado voltado para interesses individuais, familísticos e corporativos, não surpreende essa onda de terror eleitoral, esse choque de classe e os extremismos da direita (Bolsonaro) e do PT. Prevejo dias sombrios, a classe média alta exalando ódios incontroláveis e os petistas fanatizados. Um choque está por vir e não sei o que dele poderá resultar de positivo para o bem comum.

 

André Haguette

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