As pessoas cheias de certezas me apavoram. O que define o humano é a razão, e o que define a razão é a dúvida. Cogito ergo sum poderia ser traduzido por duvido, logo me torno humano. Sem a dúvida, não há pensamento. A angústia, esse sentimento absurdamente humano, vem da dúvida. E, paradoxalmente, é a aceitação da dúvida que nos permite suportar e superar a angústia. Sendo assim, viva a dúvida! Vivam aqueles que são sábios o suficiente para duvidarem de suas próprias convicções!
Cerca de 40% dos brasileiros, aqueles cujo voto se diz cristalizado nos candidatos que lideram a corrida presidencial, segundo as últimas pesquisas, estão absolutamente certos de suas próprias convicções. Apoiam, até o sacrifício, os dois candidatos que têm maior probabilidade de ir ao segundo turno. Estão imbuídos da missão sagrada de impedir que o mal vença. Fazem uma cruzada moral. Acusam-se reciprocamente de golpistas, fascistas, veem-se reciprocamente como a destruição da democracia. Nem desconfiam que são, eles mesmos e seu modo de arrogante de pensar, a grande ameaça.
Vivam os restantes 60% dos brasileiros! Que felicidade que ainda são maioria! Vivam os que duvidam! Eles sustentam a democracia, foram eles os responsáveis pelo fortalecimento das instituições nos últimos 30 anos. Governos vão e vêm. Passam. Os brasileiros que duvidam constroem instituições fortes.
Nagibe Melo
nagibemj@gmail.com
Juiz Federal, professor da UniChristus e autor do livro Abrindo a Caixa-Preta: por que a Justiça não funciona no Brasil?