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Aborto, Parlamento e Judiciário
Opinião

Aborto, Parlamento e Judiciário

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Tipo Notícia
As audiências públicas que o Supremo Tribunal Federal promoveu sobre a questão do aborto foram pauta nos veículos de comunicação. Instigado pela controvérsia do tema e complexidade de perspectivas que o orbitam, fui à pesquisa. Em poucos cliques deparei-me com uma imagem: um bebê, branco, dormindo, sereno. A fragilidade transmitida pela foto antagonizava com o texto logo abaixo: "Não me mate. Todos contra o aborto".

 

Essa carga dramático-emocional não é saudável para um debate tão sério, em cuja sede cada vida importa. Deixa as coisas meio nebulosas, quando necessários clareza e discernimento. O assunto traz consigo dilemas de natureza ética, moral, científica e, como se bastante não fosse, é revestido de dogmas religiosos. Isso para não citar o influente e óbvio elemento de classe. Em tempos de simplificação maniqueísta, receita pronta para confusão.

 

No Brasil, tratamos do tema da pior maneira possível. Lançando mão da estúpida inflação penal, aqui, aborto é crime. Ao que parece, criminalizar não adianta muita coisa. Estima-se que algo em torno de quinhentos mil abortos clandestinos são realizados por ano no País. 

 

A maioria das gestações não é planejada. O Sistema Único de Saúde não é eficaz na distribuição de métodos contraceptivos. Some-se a isso uma tentativa de sufocamento da educação sexual e reprodutiva nas escolas, impulsionada pela onda conservadora e careta que, ardilosamente, se apresenta como sem partido.

 

Na Europa, a descriminalização do aborto correu o caminho do Parlamento. O Brasil, que possui uma das legislações mais restritivas do mundo, tem um congresso eminentemente masculino, conservador e sob influência de grupos religiosos. O mesmo congresso que arrancou a primeira mulher eleita presidente da República. Neste cenário, a via parlamentar parecia pendente para o recrudescimento.  Acionado pelos meios cabíveis, o Judiciário foi posicionado no tabuleiro. Esperamos que seja reconhecido o direito das mulheres de decidirem sobre o seu próprio corpo.

 

Yuri Holanda Cruz 

yuriholandacruz@gmail.com 

Sociólogo e Conselheiro da Rádio O POVO CBN

 

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