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A presunção de virtude
Opinião

A presunção de virtude

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A presunção de virtude se associa à intolerância. É agressiva e totalitária. Prega o bem, defende grandes causas. Confunde indignação com certidão de mérito, denúncias e perseguições com “ira santa”. Hoje não se queimam bruxas, mas a execração pública substitui as chamas satisfatoriamente.


Hoje pessoas são submetidas ao ritual de autocrítica, como nos expurgos stalinistas, confessando culpas como os réus da “Santa Inquisição”. Tomás de Torquemada (1420 – 1498), o campeão de condenações à fogueira, sentia-se virtuoso. Fariseus, inquisidores e jacobinos de toda espécie, nos tribunais revolucionários, apontam o mal e castigam. Tudo por “um mundo melhor”.


Diferente é a conduta de quem faz o bem: procura necessitados para ajudá-los; arca com o ônus da boa ação. Os defensores do “mundo melhor” propõem um tipo de bem, mas transferem o custo disso para terceiros, fazendo cortesia com o chapéu alheio. O caminho adequado a esta conduta é o da política. O chapéu alheio é o Estado, com o seu poder para queimar na fogueira e legitimar a violência.


A velha tradição dos fariseus, revista e ampliada pelos discípulos de Torquemada e pelos jacobinos de toda espécie está em alta. Hoje tememos entrar em elevador com uma criança, pronunciar uma palavra do index dos vocábulos proibidos, expressar uma opinião reprovada pelos novos censores da moral. O medo domina as sociedades sob a influência de quem se julga “do bem”. Mas os novos gestores da moral, sem nenhum rubor na face, agridem a moral do outro acoimando-a de preconceito, pregam a intolerância em nome da tolerância, são lenientes com os seus gurus, por mais evidentes que sejam os seus crimes.


Estamos reféns de uma onda poderosa e agressiva. O Judiciário apagará o incêndio? Falta à toga isenção, contaminada com a nova ortodoxia; sobram casuísmos. Bois de piranha são punidos, não peixes maiores.

Rui Martinho Rodrigues

rui.martinho@terra.com.br

Historiador

 

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