Logo O POVO+
Rolezim
Opinião

Rolezim

Edição Impressa
Tipo Notícia

A linguagem é a mais potente forma de comunicação social. Quando numa mesma sociedade surge nova linguagem de um segmento social, é preciso lembrar do verso de Fernando Pessoa: “Viver não é necessário; o que é necessário é criar”. Oprime-se um grupo social e ele responde. Ao ler o conto de Geovani Martins, O Sol na Cabeça, impressionou a presença de uma sociedade dividida de tal sorte a criar nova linguagem.  

Uma narrativa cercada de novos termos, não como Guimarães Rosa, mas como resultado da exclusão. Uma vivência segregada, como um apartheid social onde acordar num sábado e ir à praia como qualquer cidadão carioca, é um diferencial para as pessoas negras, pobres, moradores do Vidigal, ainda que no Leblon.
 

Do olhar amedrontado de quem segura sua bolsa ou ergue os braços em sinal de defesa pela mera presença no ponto de ônibus de um jovem, nos faz perguntar que País estamos construindo, apartando um contingente de pessoas do acesso a direitos fundamentais, criando nova classe social com linguagem própria e valores curtidos no ódio da segregação secular.
 

A presença de droga, armas, crime, ‘autoridades’ do morro são um soco no estômago e ao mesmo tempo um alerta a orientar nossas reflexões. Não estamos atuando nas causas e tão somente nas consequências, de modo paliativo, uma forma cruel para com os excluídos e a Nação.
 

Mudar é atuar nas estruturas do Estado, essa engrenagem que não está a favorecer o excluído, abandonando a sua própria sorte aqueles que sempre tiveram poucas chances. Cadê o Estado para as pessoas negras, pobres e moradoras da favela; criadas em famílias desestruturadas pela exclusão social.
 

Sem âncora a lhes garantir segurança no caminho futuro, lhes restam viver do que o apartheid social oferece: desprezo, humilhação, desvalia, ausências que levam a drogas e crimes. Temos que acordar para os riscos de uma Nação dividida e acuada pela pobreza para muitos e pelo medo de tantos outros. Quanto mais se segrega, mais se erguem os muros da divisão social. 

 

É preciso transformar os objetivos da República em metas de erradicação da pobreza como obrigação política e social.

 

Odorico Monteiro
dep.odoricomonteiro@camara.leg.br
Médico, deputado federal e presidente do PSB Ceará

O que você achou desse conteúdo?